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Não posso freqüentar buffets – como tenho o olho maior que a barriga (o que é, acredito piamente, um problema neurológico fora do controle da vontade humana), sempre saio da fila com um prato que parece uma pirâmide de pedreiro, alguém que acabou de trocar à marreta as calçadas de Curitiba e está com fome. O prato ecumênico que vai crescendo na minha mão contempla desde a feijoada até um sushi colorido, passando por batatas sauté, um pouquinho de lasanha, aquela sobrecoxa de frango com boa aparência, o arroz à grega, três azeitonas pretas, o tomate, que é bom para a saúde, uma farofinha, uma lasca de peixe à milanesa, e quem sabe, se couber, uma ripinha de costela para arrematar. Ah, vou levar também um rondelli ao sugo, aqui no cantinho do prato.

Se é no sistema a quilo, a balança vai lá em cima – e sempre dá aquela sensação de vergonha ao olhar para o lado, todo mundo tão esguio, aqui o bifinho grelhado com uma batata e duas folhas de alface, ali uma pasta discreta, adiante a senhora pálida com uma equilibrada escolha vegetariana. Só eu ostentando meu exagero, de que me arrependo no mesmo instante em que sento à mesa, empunho os talheres e contemplo minha obra. Agora é tarde. Por mais refinado que seja o buffet, fico sempre com a sensação de que participei não de um almoço, mas de uma degustação de restaurante a quilo, avaliando o espectro de ofertas.

Assim, prefiro cardápio – ou os restaurantes de Santa Felicidade que fazem a escolha por mim, desde que os pratos tenham, digamos, alguma unidade temática, que é qualidade preciosa tanto na literatura quanto na comida. A coisa anda tão multicultural que até as churrascarias – o lugar em que historicamente encontrava-se carne de vaca com a mesma certeza com que se encontra dinheiro numa agência bancária – aderiram a essa mania de servir de tudo. Sem falar no delírio do atendimento cada vez mais corrido, você que se arranque que tem gente na fila – a cada 30 segundos, um espeto com coxinhas, outro com peixe, um pratinho de mexilhão ao lado de um quadrado de lasanha seguido por uma lingüiça toscana pingando. Não dá para conversar – que desde Epicuro é o sabor fundamental de qualquer refeição. Você é literalmente esmagado de barulho e ofertas. E, é claro, o filé especial que vale a visita fica sempre por último, quando já nos empanturramos de lingüiça e farofa. Bem, se estiver com um estrangeiro, leve-o a um espeto corrido. Todo o imaginário do Ocidente sobre o paraíso tropical vai se realizar com aquele desfile rabelaisiano de comidas.

Volto ao cardápio. Aí sim, o prazer do restaurante – depois da seleção criteriosa da coluna da direita, a clássica relação do custo com o benefício, você escolhe um item cujos ingredientes nasceram, na medida, um para o outro. É uma arte e um prazer.

Engraçado – essa crônica me deu fome.

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