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O período entre os anos 70 e 90 pode ser considerado uma espécie de Iluminismo de Curitiba. Foi uma época fértil em inovações urbanísticas e ambientais que tiveram como resultado a formação de uma identidade e do orgulho de ser curitibano. Poucos ícones da cidade traduzem de forma tão perfeita o otimismo daquele tempo quanto o Jardim Botânico, que completou 23 anos no último domingo. E isso não se resume à sua beleza cênica. Quem tem olhos para ver pode encontrar, entre suas trilhas, simbolismos que remetem à cidade, a sua gente e àquele sonho de uma capital inovadora e surpreendente.

A alameda de cerejeiras do Japão que leva à entrada do Jardim Botânico pode ser vista como uma homenagem aos imigrantes orientais que ajudaram a construir Curitiba. Na cultura japonesa, suas flores rosadas que desabrocham e murcham rapidamente são a lembrança para se aproveitar cada momento de forma intensa. Afinal, significam a efemeridade da vida. Quem sabe não alertem também para o declínio após o apogeu das cidades e países.

Passadas as cerejeiras, há o jardim francês – com sua geometria perfeita de arbustos e flores. Esse tipo de paisagismo é uma invenção da Renascença. E simboliza o racionalismo: a natureza dominada pelas formas impostas pelo homem. Curiosamente, uma das primeiras tentativas de domar o crescimento naturalmente desordenado de Curitiba e dar-lhe uma racionalidade foi obra de um francês: o Plano Agache, lançado ainda na década de 40 do século passado. O plano não vingou, mas plantou as sementes da organização urbanística que viria a caracterizar a cidade.

Já a estufa, dominando o alto do Jardim Botânico, é "inglesa". Foi inspirada no Palácio de Cristal de Londres, estrutura construída no século 19 para abrigar a Grande Exposição Universal. À época, era um prodígio da engenharia – como Curitiba chegou a ser nos anos 90.

Pode-se dizer ainda que a estufa é o coração do Jardim Botânico. E, sendo assim, o que pulsa dentro dele é a Mata Atlântica – ou ao menos exemplares desse bioma. O capão pouco atrás é outra amostra do ecossistema sobre o qual a cidade foi erguida. O esforço de preservá-lo e ao mesmo tempo abrir um espaço público a todos foi um duplo sucesso do planejamento urbano. Primeiro, por ser uma vitória sobre a pressão imobiliária. Depois, por mostrar que o poder público pode oferecer à comunidade algo que seja elogiado até por estrangeiros acostumados à eficiência do mundo desenvolvido.

O Jardim Botânico, enfim, materializa o espírito daquele tempo em que a cidade estava sempre se reinventando e inovando. Talvez seja uma luz que se enfraqueceu nos dias atuais. Mas ela ainda se acende quando a estufa se ilumina à noite. Basta olhar.

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