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O Poder Legislativo no Brasil não dá muitos motivos para que a população confie nele. Desde que o ano começou, o Senado tem sido a Casa dos escândalos: cessão de celulares custeados com dinheiro público para viagens de parentes de senadores; existência de 181 diretorias que abrigam apadrinhados; gasto de R$ 6,2 milhões com horas extras em pleno mês de férias... Na Câmara dos Deputados, há um movimento para articular o aumento do salário dos parlamentares dos atuais R$ 16,5 mil para R$ 24,5 mil. Já a Assembleia do Paraná, embora tenha acabado de aprovar um projeto de transparência, continua sendo suspeita de manter a prática de nepotismo, além de funcionários fantasmas.

Diante de tantos exemplos de mau uso dos recursos públicos, é natural que os eleitores alimentem o descrédito com os parlamentares. E dessa semente nasce a ideia de que o Legislativo é inútil e que deveria ser fechado. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) acabou reacendendo esse debate. Em entrevista a uma rádio no último domingo, afirmou que o atual estado de coisas levará, mais cedo ou mais tarde, alguém a propor um plebiscito para decidir sobre o fechamento do Congresso.

É possível que uma proposta dessas ganhe a simpatia de amplas parcelas da sociedade. Mas, se o Parlamento é ruim, pior ainda seria não termos nenhum Congresso. A discussão pública deveria ser centrada em aprimorar ainda mais o controle social sobre o Legislativo, e não em extingui-lo. Porque, ainda que de forma muito deficiente, o Parlamento cumpre a sua função primordial, preconizada há dois séculos e meio pelo Barão de Montesquieu: contrapor-se à tendência de hegemonia do Executivo.

Para quem acha que os parlamentares brasileiros nunca cumprem com esse dever, vale lembrar que ainda estaríamos pagando a famigerada CPMF se não tivéssemos um Legislativo. A proposta de recriação do imposto, apresentada pelo governo federal, foi derrubada no Senado. O ex-presidente Fernando Collor não teria sofrido o impeachment. No Paraná, a Copel seria uma empresa privada (o projeto de privatização da estatal, do governo Lerner, foi derrubado pelos deputados estaduais).

A ausência de um Parlamento também poderia levar o presidente Lula a decretar o fim do limite de uma reeleição para tentar sucessivos mandatos. Quem gosta do presidente pode achar que isso seria bom. Mas, e se essa ideia tivesse ocorrido ao Collor, já livre do impeachment? Ele poderia ser o inquilino do Palácio da Alvorada até hoje.

Os efeitos negativos da ausência do Parlamento podem ser notados, em certa medida, na Venezuela. Como a oposição a Hugo Chávez boicotou a eleição para o Congresso deles, só partidários do governo assumiram cadeiras no Legislativo local, que referenda tudo o que o presidente decide. Em outras palavras, a Venezuela tem um Parlamento apenas decorativo. Não é à toa que o país flerta a todo momento com um regime ditatorial.

Fernando Martins é jornalista.

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