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No Prêmio Esso de Jor­na­lismo deste ano, um dos trabalhos finalistas é "Democracia nas favelas", de O Globo. Como explicam seus autores, Carla Rocha, Selma Schmidt, Vera Araújo e Fábio Vasconcellos, é "uma viagem pelo cotidiano da população de comunidades pobres ocupadas pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs)". O levantamento durou quatro meses e mostra os resultados da presença policial nas favelas Santa Marta, em Botafogo, Chapéu Mangueira e Babilônia, no Leme, Cidade de Deus, em Jaca­repaguá, e Batam, em Realengo. Foi incluída no trabalho a favela Tavares Bastos, no Catete, que, apesar de não fazer parte do projeto de segurança, é mantida sob ocupação do Bope e sem tráfico há nove anos.

Para quem não teve a oportunidade de ler, eis uma "palha", como diria o Beronha, ou briefing, como prefere Natureza Morta: "O cotidiano dos morros, há pelo menos 40 anos dominados por bandos armados, está passando por grandes transformações". É a cidadania que chega e ocorre "a retomada da convivência com a cidade formal". Em 2007, outra série do jornal ("Favela S/A") abordou a ditadura imposta pelo tráfico ou pela milícia nos morros, áreas em que "a democracia ainda não chegou". As reportagens, assinadas por Paulo Motta, Carla Rocha, Cristiane de Cássia, Dimmi Amora, Fernanda Pontes, Luiz Ernesto Magalhães, Selma Schmidt, Sérgio Ramalho e Angelina Nunes, abordaram os aspectos econômicos relacionados ao controle exercido pelas facções criminosas. Há otimismo, mas há resistência. "O risco de o Estado paralelo se converter num estado policial é uma realidade", mas, a exemplo do que aconteceu no Brasil, "em especial com a saída do último general, as comunidades ocupadas também experimentam uma distensão lenta e gradual. E, assim como a democracia não foi garantida com a promulgação da Constituição de 1988 – por sinal, ainda vem sendo construída dia a dia , os novos tempos nas favelas ainda enfrentam dificuldades e contradições".

De qualquer modo, "provou-se que é possível afastar o tráfico e bandos armados". Sem o tribunal do tráfico, que era a autoridade máxima e inquestionável, "moradores e policiais enfrentam agora a difícil tarefa de construir novas formas de convivência". Uma simples briga de marido e mulher, que antes era resolvida por traficantes, passou a fazer parte do rol de ocorrências das delegacias próximas. O Morro de Santa Marta, por exemplo, registrou o primeiro episódio de briga de casal que, em vez de ir para o tribunal do tráfico, foi parar na Justiça, gerando o primeiro caso de aplicação da Lei Maria da Penha naquela favela. Também pela primeira vez "começaram a ser detidos usuários de maconha, quando antes o vício não só era tolerado como estimulado". A economia local foi afetada, com grande valorização imobiliária dentro das favelas e no entorno. Para especialistas, levar a democracia às favelas é um processo gradual, que depende da presença do Estado. "Uma tarefa e tanto se considerarmos que, justamente quando a repressão afrouxava, em meados de 1970, as favelas começavam a experimentar o início de seus anos mais duros de dominação armada".

A premiação do Esso sairá dia 8 de dezembro.

À equipe de O Globo, boa sorte. Igualmente boa sorte à comunidade das favelas.

Francisco Camargo é jornalista.

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