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Aconteceu nos últimos meses. A bordo dos ônibus das linhas Juvevê-Água Verde ou Água Verde-Abranches, pude praticar um esporte radical – observar a reação dos passageiros ao cruzarem a Rua Brasílio Itiberê com a Buenos Aires. Dê um Google. Trata-se do ponto exato onde está plantada a "Arena da Baixada", em plena zona da Fifa e bem no meio do quintal das nossas "quiziras".

Quando a gente passa por essa esquina, a bordo dos hibribus, o tempo parece correr em câmera lenta, no que somos ajudados pelo complexo sistema de desaceleração dessa verdadeira nave espacial. É a evolução da "jardineira". Mas deixemos esse assunto para os busólogos. Importa dizer que naquela fração de segundos, todos os pecados são cometidos, em pensamento e a viva voz – mesmo que seja de manhã, horário em que os curitibanos perdem a língua.

As manifestações intrabus são sortidas com um saco de jujubas: vão da maledicência à praga de madrinha, passando pelo olho gordo e impropério, chegando ao sapateado em cima do caixão seguido da boca suja. Blasfêmia, a gosto. Ao ouvir o que a turma diz, temo que o Soberano acorde de seu sono, se enfeze, fazendo com que o chão se abra. Juro. Dá mais pânico do que ficar preso no cemitério depois das seis, um dos cagaços que todo morador da "Água" tem.

Uma conhecida minha – opositora da Arena com grau máximo na Escala Richter – é típica passageira sísmica. Quando vamos na mesma condução, me benzo. Digo que a "vista comprida" dela deve ser responsável por alguns acidentes na interminável obra do estádio. Acho que um haitiano quase desaba lá de cima a cada vez que a moça pratica a "pantomima da ema" – o gesto de esticar o pescoço na janela para dar uma azarada básica.

Sorte esses bravos caribenhos terem sete vidas: enfrentaram o terremoto, o furacão, a cólera, a fuga para o Acre, o clima de Curitiba e, agora, a construção da Torre de Babel... Esse assunto fica para outro dia, pois é um cordel encantado. Vai se chamar "Como os alegres haitianos tornaram possível a Copa mais sofrida da paróquia". Deixe estar.

De volta ao coletivo, resta a mim, a título de fofoca, fazer uma síntese do que diz a turma. 1) "Isso não fica pronto nem se a Construtora Baggio acudir." 2) "Quem mandou?" 3) "Dou um dedo de que até o cafezinho tá superfaturado". 4) "Tá feio, né." 5) "Tô de olho nos pinheiros. Se arrancarem, arranco a roupa..." 6) Gente chata... vocês."

A conversa baixa o tom na Rua Alferes Poli, quando somos devolvidos ao silêncio. Faz sentido: chegar até a Praça Rui Barbosa, a sete quadras dali, demora uma eternidade. É o trânsito, ahã. Desse problema, desistimos de falar. Já a Arena... Veneno bom. Pensando bem, vamos sentir falta de falar da obra que amamos odiar. Vá entender.

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