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 | Ilustração: Felipe Lima
| Foto: Ilustração: Felipe Lima

Vamos combinar: podemos desaprovar os gastos com a Copa e mesmo assim não apoiar as manifestações violentas contra ela. Temos de deixar isso bem claro para não continuarmos como estamos, reféns das quebradeiras feitas por poucas pessoas. Como dizem por aí, esses manifestantes não me representam. Eu, Marleth Silva, jamais faria um protesto, nessa altura do campeonato, contra um evento que vem sendo organizado há mais de dez anos, quebrando lojas e destruindo o mobiliário urbano. Posso protestar de outras formas, como fizeram as pessoas que em 2013 levaram cartazes para dentro dos estádios da Copa das Confederações. Posso fazer manifestações pacíficas para não deixar passar em brancas nuvens minha indignação contra os arroubos imperialistas do Putin, contra o governo nigeriano que ignorou o rapto de meninas, contra o governo do Irã que comete violência contra homossexuais. Mas não vou quebrar nada. Nem quero que quebrem no meu nome.

Também vamos combinar que podemos desaprovar a falta de gestão dos preparativos para a Copa, a ineficiência dos senhores encarregados de preparar o Mundial no Brasil, e mesmo desaprovando tudo isso, querer assistir aos jogos. Não há vergonha nisso. Ninguém é cúmplice da Fifa por ter comprado um ingresso de R$ 60 para ver Espanha x Austrália. É uma situação delicada, sim, porque conspurcaram a festa do futebol que existe há 84 anos. Ela virou um evento grande e artificial demais. Moedas tilintam cada vez que um jogador chuta a bola. O torcedor virou cliente. É difícil conviver com esse mercantilismo e apenas apreciar a festa. É difícil não se indagar se pagar o ingresso ou vestir uma camisa amarela é uma forma de cumplicidade.

Vamos combinar ainda que muitos brasileiros podem torcer com paixão pela seleção brasileira ainda que desaprovem a máquina de fazer dinheiro em que se transformou a Copa do Mundo. Que nem Copa do Mundo é mais! É Copa do Mundo da Fifa. Aliás, essa antipática organização futebolística está traçando seu destino ao definir que existe um mundo que é dela, o mundo da Fifa. Uma hora dessas uma parte do planeta vai reconhecer que faz parte de outro mundo e cair fora desse barco suíço. Vamos combinar também que a publicidade que explora o Mundial está roubando nossa espontaneidade e mercantilizando nossa alegria. Por mais criativos que sejam, os comerciais já cansaram.

Vamos combinar que alguns brasileiros podem torcer por outras seleções e nem por isso merecem ser acusados de crime de lesa-pátria. É fã do futebol uruguaio? Veste a camisa celeste e boa sorte.

Vamos combinar que a proposta de trazer o mundial de futebol ao Brasil vem lá de trás, de 1999, quando Fernando Henrique Cardoso apresentou a candidatura à Copa de 2006. Sendo assim, petistas e tucanos estão no mesmo barco quando a discussão é sobre de quem foi a ideia de nos colocar nessa canoa furada. Era tão bom acompanhar os mundiais de longe, torcendo para os sul-africanos conseguirem terminar seus estádios, lamentando a confusão de voos armada pelos coreanos e japoneses que inventaram de juntar dois países para um campeonato só. Agora é diferente. A bola está conosco, se chama Brazuca e o mundo inteiro está de olho nela.

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