Recentemente, em conversa numa roda ali no bar do Maneco, surgiu uma troca de opiniões sobre o comportamento do curitibano nato. Tal assunto se prendeu ao fato de matérias abordadas pela mídia aproveitando o aniversário da cidade, que é comemorado hoje. Uma comemoração que bem pode sobrevir de um erro cartorial.
A primeira notícia que se tem da fundação de Curitiba é de um comunicado de Eliodoro de Ébano Pereira feita ao rei de Portugal, informando que havia fundado as vilas de Curitiba e de Iguape, isto em 1654. Catorze anos depois, em 1668, Gabriel de Lara, atendendo a pedido de moradores, faz erigir o pelourinho, que significava a presença da justiça do rei.
Na ocasião, nomeia para assentar a justiça da vila o capitão povoador Mateus Leme. Durante vinte cinco anos, foi ele o interventor da cidade. Em 1693, com Mateus Leme já velho, o povo exigiu que se elegessem as justiças e a vereança. Portanto, a data de hoje está mais ligada à criação da Câmara Municipal do que a fundação da vila. O comentário acima o faço por entender a criação de Curitiba nas três etapas e nas datas apresentadas. Deixando de lado o nascimento da cidade, e pulando um bom tanto da sua história nesses últimos 355 anos, vamos a épocas mais recentes.
É público e notório que Curitiba é uma cidade sem portas, é que nem coração de mãe, sempre cabe mais um, e mais um bom tanto de adjetivos para qualificá-la como grande acolhedora de ádvenas, o que não deixa de ser verdade.
Um indivíduo que nunca morou em Curitiba, mas em São Francisco da Califórnia, vem aqui e declara que as três cidades do mundo onde se vive melhor seriam: Roma, São Francisco e Curitiba. O dito forasteiro deu o mote para o seu patrício, que na ocasião tomava posse como prefeito da cidade e que mandou espalhar pelos quatro cantos do Brasil a condição decantada pelo bizarro californiano.
Se Curitiba alguma vez tivera portas, estavam elas arrombadas. Em três tempos a população duplicou. Quem não tinha futuro no seu rincão veio para não ter também aqui. Hoje, a cidade sofre o seu inchaço com seus mais de trezentos mil favelados. A própria segurança de seus cidadãos virou estatística com justificativas esdrúxulas de parte de quem devia garantir o bem-estar de todos.
Viajando no tempo, vamos até 1820, quando por aqui passou o sábio francês Saint-Hilaire, que anotou em seus comentários o tipo físico do curitibano como sendo diferente de outros locais onde estivera no Brasil. Principalmente sobre as mulheres, considerando-as sociáveis e comunicativas.
Pouco tempo depois, Curitiba recebeu seus primeiros imigrantes os alemães , que começaram a entrar no Paraná em 1829. Quarenta e dois anos depois vieram os italianos e os polacos, isso em 1871. Com a miscigenação aos descendentes dos portugueses e espanhóis, foi sendo criado o curitibano de hoje em dia, que representa um pouco mais de um terço da população da capital.
A queixa dos adventícios é de que o curitibano é uma pessoa fechada e de poucos amigos. Inclusive comentado como sendo um tipo de costumes excêntricos e que vive encastelado em sua casa, onde não recebe visitas. A espinafração vai por aí afora quando são analisadas as atitudes desse estranho ser: o curitibano.
Como eu sou curitibano e com mais de 70 anos de idade, posso informar que não éramos tão assim antigamente. Esse antigamente tem apenas meio século, lá pelos anos da década de 1950. A todos na cidade se conheciam, isto não quer dizer que cada um sabia o nome e o endereço do outro. O linguajar, o tipo físico, o respeito e a educação faziam e ainda fazem parte do modo de vida de nós, curitibanos. Curitiba, cidade sem portas!
Quando isto aconteceu, o curitibano começou a passar a tramela nas suas portas e tornou-se um chato na sua própria cidade, desapareceu das reuniões públicas, os clubes da classe média foram ficando desertos. Os usos e costumes vindos de outros rincões ficaram de fora, não ultrapassaram as nossas soleiras. Somos como os índios da tribo dos moicanos, os últimos sobreviventes de uma raça vivendo a modo próprio. Isto somos nós, curitibanos.
As fotografias que mostramos hoje dão uma pequena ideia do povo de antanho e como vivia até meados dos anos 50.
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