
O Brasil tornou-se um paraíso para a prática da corrupção ou está bancando uma cruzada contra ilegalidade? Para o ministro de Estado do Controle e Transparência, Jorge Hage Sobrinho, o que aumentou foi justamente a investigação e a descoberta das fraudes. "O que fizemos foi rasgar o tumor, abrir o buraco e deixar que a corrupção aparecesse", diz. Na visão do ministro, a Controladoria-Geral da União (CGU), responsável por auditorias, e a Advogacia-Geral da União (AGU), instância onde são ajuizadas as ações, estão tendo papel decisivo na busca da ética no serviço público. Em entrevista à Gazeta do Povo, durante o VII Encontro Nacional dos Advogados da União, realizado dos dias 12 a 16 de novembro em Foz do Iguaçu, Hage Sobrinho falou sobre o avanço no combate à corrupção e as barreiras judiciárias para se obter mais transparência no país.
Qual o número de auditorias que a CGU tem feito no país?Nos últimos quatro anos nós realizamos cerca de 7 mil ações de auditoria nos órgãos federais, outra quantidade em prefeituras, onde trabalhamos não só a partir de denúncias da população, mas também com sorteios públicos. Nós sorteamos 60 municípios no Brasil a cada dois meses, em número proporcional à dimensão de cada estado, e as nossas equipes visitam essas cidades para verificar a aplicação de dinheiro federal, seja usado pela prefeitura, estado, órgãos federais e outras organizações. Com a divulgação dos gastos públicos no Portal da Transparência, esse tipo de denúncia tem aumentado?Ao mês chegam uma média de 500 denúncias e não damos conta. Por isso a cada dois meses sorteamos os 60 municípios. Quando há denúncia grave, ela geralmente vem acompanhada de uma orientação do Ministério Público e aí damos prioridade. Nesse caso, independentemente de sorteio, vamos ao local e fiscalizamos. Do ponto de vista do incremento da transparência do poder executivo, o Brasil já avançou quilômetros nos últimos quatro anos. Hoje o Portal da Transparência da Controladoria é um dos maiores sites de transparência no mundo.
Apesar dos avanços, ainda existem entraves no judiciário para a busca da transparência. Quais o senhor considera os principais?Há dificuldades grandes ainda, por exemplo, no que se refere a sigilo bancário e fiscal. Os sigilos bancário e fiscal foram criados originalmente para proteger a vida privada do cidadão. Mas hoje, essas ferramentas se transformaram em proteção de criminosos. Então cada vez que um órgão de investigação precisa quebrar o sigilo, tem que ir à Justiça. E muitas vezes aquele órgão de investigação, por exemplo, a Polícia Federal, que obtém a quebra do sigilo, não pode repassar e transferir esses dados para outro órgão de investigação, como seja, a Controladoria ou o Ministério Público. Então nos batemos muito pelo compartilhamento do sigilo. Pelo menos depois que um órgão obtiver autorização judicial, ele possa compartilhar com outros o mesmo dado, para que não seja necessário cada órgão fazer o mesmo pedido à Justiça.
De que forma deveria ser esse procedimento em relação às autoridades públicas ? Defendemos a relativização, a flexibilização do sigilo quando se tratar de autoridades públicas. A pessoa que faz uma opção pela vida pública tem que automaticamente renunciar um pouco à sua privacidade. A vida dela tem que ser mais visível para o cidadão. Se ela não quer isso, que vá cuidar só da atividade privada. Mas se estiver no poder executivo, legislativo e judiciário, tem que renunciar a esse excesso de privacidade e se expor mais porque lida com interesses públicos, com dinheiro público, então não pode ficar escondida atrás desses biombos.
Existem também ameaças de se impedir as escutas telefônicas. Como o senhor vê isso? A possibilidade de escuta telefônica tem ajudado muito as investigações. Um exemplo é a Operação Carranca que a polícia realizou no Nordeste, a partir de dados de levantamentos de fiscalizações da CGU em 2006, em 50 municípios de Alagoas. Isso começou depois que identificamos um tipo de conluio e de fraude promovida por empresas em licitações de 12 prefeituras de Alagoas. A Polícia Federal precisou instaurar a escuta telefônica. Obteve autorização da Justiça e foi por conta dessas escutas telefônicas que foram presos mais de 30 empresários e agentes públicos que estavam comendo dinheiro público. Se não fosse a escuta telefônica, não se teria descoberto esse esquema todo. Por isso é fundamental que se reduzam as resistências a essas autorizações.



