Quem assiste à televisão ou tem algum conhecimento da cultura pop deve se lembrar de pelo menos um exemplo de personagem de-fensor da filosofia vegetariana. Se a memória não ajuda, aqui vão alguns exemplos: os tubarões Lenny de O Espanta Tubarões e Bruce de Procurando Nemo, a loira Phoebe do seriado Friends, Lisa de Os Simpsons e o dinossauro Horácio dos quadrinhos de Maurício de Souza. As referências ao vegetarianismo em filmes, animações e seriados refletem uma realidade: o número de vegetarianos cresce a cada dia e principalmente entre os jovens.
No Brasil não existem estatísticas precisas, porém o aumento no número de adeptos pode ser sentido com base na procura por restaurantes especializados. Em Curitiba, a lista já passa de uma dúzia, muitos deles abertos nos últimos anos. Na internet, multiplicam-se as listas e grupos de discussão sobre o tema. Somente o site da Sociedade Vegetariana Brasileira soma aproximadamente 3 mil acessos diários. Além disso, alguns locais começam a servir de ponto de encontro para os vegetarianos. Em Curitiba, um dos mais famosos é o Superdog, que vende cachorro-quente vegetariano na esquina das ruas Dr. Manoel Pedro e Munhoz da Rocha, no bairro Cabral. Até mesmo algumas indústrias alimentícias de derivados de carne, percebendo o crescimento desse segmento, lançaram produtos especiais à base de soja.
Os motivos que levam alguém a ser vegetariano são diversos. Para a maioria, a razão de abrir mão da picanha suculenta ainda está na ética animal: os vegetarianos em geral condenam as formas de abate e a exploração a que os animais são submetidos. A vendedora Anita Alves, 28 anos, optou pela dieta vegetariana há 12 anos, por acreditar que essa é uma forma de se alimentar sem crueldade. "Nunca tive recaídas. Deixei naturalmente e com muita convicção. Hoje faço inclusive parte do movimento Hare Krishna", conta.
A segunda causa mais apontada é a preocupação com a saúde. Muitos excluem as carnes do cardápio acreditando que a vida sem elas é mais saudável. Esse foi o caso da aposentada Esther Moreira Xavier, 80, que cortou as carnes da alimentação há 47 anos. "Eu sofria com cólicas terríveis e descobri que as dores tinham relação com a digestão da carne. Depois que parei nunca mais tive", diz.
Entretanto, abandonar o hábito carnívoro nem sempre é fácil. As irmãs Aline, 18, e Letícia Ga-rus, 12, decidiram mudar a alimentação há três meses. Apesar de algumas recaídas, elas dizem que já se sentem melhor. "Eu amava aquele cheirinho de churrasco, mas apesar de lembrar do gostinho da picanha na boca, não volto a comer de jeito nenhum. Minha saúde melhorou muito, já não me sinto tão pesada após uma refeição", conta Aline.
Seja qual for o motivo da escolha e o grau de adesão à dieta, especialistas alertam que alguns pontos merecem atenção especial quando o assunto é vegetarianismo. Isso porque, embora na teoria seja possível obter todos os nutrientes necessários a partir de uma dieta vegetariana, na prática muitos adeptos não seguem à risca os cuidados necessários.
Um dos riscos mais comuns para os que não seguem uma dieta equilibrada é de anemia, decorrente da falta de ferro no organismo. De acordo com o nutricionista especializado em dietas vegetarianas George Guimarães, uma maneira de compensar essa deficiência é consumir outros alimentos ricos em ferro, como castanhas, leguminosas (feijão, lentilha, grão-de-bico) e vegetais verde-escuros. Os velhos truques de cozinhar em panelas de ferro e beber água em copos revestidos de ferro também funcionam. As proteínas também podem ser compensadas por meio do consumo de leguminosas. Minerais como cálcio e zinco podem ser encontrados em alimentos como leite e derivados, vegetais verde-escuros, algas-marinhas, melado, frutas secas, cereais e oleaginosas (nozes, amêndoas, castanhas).
Os vegetarianos mais radicais (vegans), que excluem da dieta qualquer alimento de origem animal, correm ainda o risco de ter deficiência da vitamina B12. Nesses casos, a reposição pode ser feita por meio de suplementos ou injeções anuais.
A falta de B12, responsável pela formação e manutenção do sistema nervoso e do sangue, pode ser prejudicial ao desenvolvimento das crianças. No entanto, apenas 5% dos casos de deficiência da vitamina são resultantes somente da dieta. Além disso, um adulto necessita em média de apenas 2,4 mcg de vitamina B12 diariamente, quantidade facilmente obtida por quem consome queijos e leite. De acordo com o médico coordenador do Departamento de Medicina e Nutrição da Sociedade Vegetariana Brasileira, Eryc Slywitch, o corpo é capaz de estocar B12 por um período de até cinco anos. "A quantidade de B12 necessária ao corpo é incrivelmente pequena. Não há necessidade de se consumir todos os dias", afirma.



