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A corredeira Caiacanga, em Porto Amazonas, é um dos trechos mais bonitos do Rio Iguaçu. A partir desse ponto ele começa a ganhar vida novamente | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
A corredeira Caiacanga, em Porto Amazonas, é um dos trechos mais bonitos do Rio Iguaçu. A partir desse ponto ele começa a ganhar vida novamente| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

25/11 - Equipe da Gazeta do Povo chega a Porto Amazonas pelo Rio Iguaçu

Bastidores

Piso!

O comando de Robson, dez anos de prática de rafting, era tudo o que a gente não queria ouvir. A instrução durante a prática do esporte pode ser traduzida assim: "Se joga dentro do bote que a descida vai ser difícil".

No quarto dia da expedição, além da nossa equipe de todos os dias, contamos com a apoio do Robson e do Mauro, praticantes do esporte que exige bom preparo físico e sensibilidade para detectar os melhores pontos para passagem pelas corredeiras.

Antes de começar, Robson dá as instruções: cada um deve fixar-se o melhor possível no bote, colocando os pés nos locais apropriados. "Cair é normal", disse ele. Sinceramente, uma das afirmações mais desagradáveis que ouvimos. Então, ao cair, a ordem é não ficar em pé no rio porque é grande o risco de o pé ficar preso nas pedras. Caiu, assuma posição de corredeira, ou seja, cabeça e pontas do pé para fora da água, boiando, e espere o resgate. E Robson pede atenção para os comandos durante a descida: Atenção! Segura! Piso!

Então, nos preparamos para a descida: colete salva-vidas e o capacete, que depois descobrimos que tem múltiplas funções: protege a cabeça numa eventual queda nas pedras, dentro da água; protege dos galhos com os quais você vai se deparar quando o bote passa próximo da margem; e se, eventualmente, você tiver de percorrer algum trecho por terra, com vegetação abundante, como aconteceu com parte do nosso grupo, o capacete também vai te proteger dos galhos e impedir que teias de aranha fiquem grudadas no seu cabelo.

Depois é só curtir a paisagem, já que o Rio Iguaçu é bem mais bonito nesse trecho. O silêncio só é interrompido por aquele barulhinho característico de água caindo, que indica a proximidade da primeira corredeira. Leve, classe I (numa escala que vai até VI), essa não exigiu nenhuma habilidade especial para descer.

Depois vieram outras mais emocionantes, com direito ao comando "Piso!".

Leia amanhã

Pesquisador percorre margens por quatro anos e traça um perfil do Rio Iguaçu.

  • A partir de Balsa Nova o Iguaçu tem um aspecto melhor
  • Salto Caiganga: corredeiras garantem a oxigenação da água
  • Durante o trajeto é possivel observar que o rio é bem largo e não tem cheiro, além de possuir muita vegetacao nas margens
  • Espuma: processo natural de depuração da água
  • Sandrília e Joilson: cuidado com o rio
  • Mello e a casa construída com a madeira do Iguaçu
  • Equipe percorreu 15 quilômetros com o bote, a remo, pois o trecho possui corredeiras
  • Maquinário da indústria de papel e celulose Amazonas, no Salto Caiacanga
  • Casas nas margens do salto Caiacanga
  • A profundidade média do rio Iguaçu é de 5 metros e a largura chega a 80 metros

Até a primeira metade do século passado o Rio Iguaçu era o canal para o escoamento, principalmente, da produção de madeira e erva-mate. Em dezembro de 1882, o vapor Cruzeiro fez a primeira viagem entre Porto Amazonas e União da Vitória (na época, Porto União da Vitória). O escritor Arnoldo Monteiro Bach, autor do livro Vapores, lembra que a embarcação veio do Rio de Janeiro até o Porto de Antonina, onde foi desmontada e subiu a Serra do Mar, pela Estrada da Graciosa, durante quatro meses, em 11 carroções puxados por bois até Porto Amazonas. Lá o Cruzeiro foi montado novamente.

No quarto dia da Expedição ao Rio Iguaçu, Porto Amazonas foi o destino da viagem, que começou em Balsa Nova. Foram 15 quilômetros percorridos com o bote, a remo, porque o trecho é de corredeiras. O biólogo Tom Grando, consultor da expedição, explica que as escarpas que atravessam o Iguaçu nesse trecho proporcionam condições ideais para a prática do rafting.

A partir de Porto Amazonas, marco zero da navegação fluvial do Iguaçu, o rio é navegável e foi por isso que os vapores tomaram conta daquele cenário até 1953, quando as crises da erva-mate, da madeira e a chegada de meios de transporte mais eficientes colocaram um ponto final nessa história.

História que sobrevive na memória de Otávio Mello, 79 anos. Morador de Porto Amazonas, onde nasceu, ele deixa de fazer qualquer coisa para falar dos últimos anos da navegação no Iguaçu, período que acompanhou, e se emociona. Em 1949, Mello era funcionário do Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis, um órgão do governo federal. O seu trabalho era mergulhar no Rio Iguaçu, em Porto Amazonas, e manter o fundo do rio limpo para a circulação dos vapores.

Ele conta que muitas das embarcações, quando subiam o rio, traziam para a cidade madeira que ficava guardada no porto, na beira do Iguaçu. Se chovia muito, a água levava a madeira, que mais abaixo era usada pelas famílias para a construção de suas casas. A casa que Mello comprou em Porto Amazonas era dessa madeira. Ela foi desmontada e hoje ele vive com a esposa, dona Leoni, numa casa de alvenaria. Há seis anos, Mello pegou a madeira de pinheiro, que tem cerca de cem anos, e construiu a casa do sítio, distante cerca de cinco quilômetros da cidade.

No ano passado, para matar a saudade do tempo da navegação no Iguaçu, ele reuniu toda a família para um passeio de barco pelo rio. Quem oferece esse passeio é José Gonçalves, 67 anos, que construiu o barco Novo Horizonte em 2003. Foram dez meses de trabalho. Aposentado do serviço público municipal, ele usou os conhecimentos de mecânica e metalúrgica e o projeto de um amigo engenheiro naval para construir a embarcação. "A Marinha fez três vistorias e deu a liberação."

O Novo Horizonte tem capacidade para 35 passageiros. Ele pode descer o rio de Porto Amazonas a União da Vitória, mas o mais usual é ir até São Mateus do Sul, distante 155 quilômetros. São até dez horas de viagem, dependendo do nível do rio. Na subida, a navegação se estende por 16 horas.

Apaixonado pelo Rio Iguaçu, Gonçalves guarda documentos da Marinha sobre a navegação. Por exemplo, em 1939 foram transportadas 43.459 toneladas de madeira, erva-mate e outros produtos. Os documentos são do Ministério da Viação e Obras Públicas – atual Ministério dos Transportes – Departamento Nacional de Portos, Rios e Canais.

Muita espuma

A partir de Balsa Nova o Iguaçu tem um aspecto bem melhor. A água já é mais limpa e a mata ciliar está melhor preservada. A profundidade média é de 5 metros e a largura do rio chega a 80 metros. O que se observa muito nesse trecho do rio é a presença de espuma, resultado do processo natural de depuração da água. "A presença do oxigênio na água provoca esse fenômeno", explica o biólogo Tom Grando, consultor da expedição.

A região também tem muitos pontos de extração de areia, que pode ser feita em dois locais: onde o rio extravasa e joga o material para fora ou no leito do rio, uma prática com grandes impactos ambientais porque é o leito que sustenta a fauna aquática, diz Grando.

Quem conhece o Rio Iguaçu aponta com facilidade as mudanças por que ele passou. Em Porto Amazonas, na margem da corredeira Caiacanga, vive, há 16 anos, Joilson Tadeu Scepanski. Ele trabalha para uma indústria de papel da cidade e cuida de um gerador de energia instalado no local há 56 anos. A esposa Sandrília e três filhos são a companhia de Scepanski, que pesca no Iguaçu. "Ainda dá lambari e bagre por aqui, mas do jeito que está eu não sei até quando. Vai diminuindo a cada ano."

Ele diz que o rio mudou muito em alguns anos. "Eu ajudo a limpar como posso, recolhendo o lixo que vem pelo rio e fica parado nas margens." Scepanski conta que recolhe cerca de 50 quilos de lixo por mês, principalmente garrafas PET. O material é entregue para a prefeitura de Porto Amazonas.

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