
Quase quatro em cada dez acidentes registrados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) na última temporada de verão (de dezembro de 2010 a fevereiro deste ano) tiveram como causa presumida a falta de atenção. Das 5,7 mil ocorrências do período no Paraná, cerca de 2 mil estiveram relacionadas a fatos que fizeram os motoristas se distraírem ao volante. Mais do que alertar para manter o cuidado nas estradas, os dados ilustram o desconhecimento do brasileiro nas medidas de segurança e mostram a dificuldade em perceber os riscos inerentes à direção, fruto de uma educação falha para o trânsito.
Chefe do Núcleo de Comunicação da PRF no estado, Wilson Martinez estima que 95% dos acidentes são causados por falha humana. "A falta de atenção é apenas uma dessas causas. Isso significa que 95% das ocorrências poderiam ser evitadas", afirma. A PRF fiscaliza 3,4 mil quilômetros de estradas no Paraná. A distração não se trata de um problema exclusivo brasileiro, mas de todo o globo, na avaliação do consultor de Segurança em Programas de Trânsito J. Pedro Corrêa. "O advento do celular e o uso das mensagens de texto enquanto se dirige aumentaram a preocupação das autoridades de trânsito de todo o mundo."
A diminuição dos riscos passa necessariamente pela criação de programas específicos de educação para o trânsito, que contemplem campanhas de conscientização. "Ainda não temos uma educação básica no país e uma cultura de segurança devidamente estratificada. Jamais na história brasileira, a palavra segurança teve prioridade para o governo", explica Corrêa. "O governo vai ter de assumir sua responsabilidade para ensinar as atuais gerações a darem valor à vida", diz a coordenadora do grupo de Pesquisa em Trânsito e Transporte Sustentável da UFPR, Alessandra Bianchi.
Alessandra alerta para um fator que ajuda a explicar o elevado índice de desvios de foco. "Imagine que tenha sofrido um acidente na estrada. É mais fácil admitir que estava acima do limite de velocidade ou desatento?", questiona. Conforme a PRF, as causas presumidas são identificadas pelos agentes e, quando não há razão clara, são enquadradas no critério "outras" (veja infográfico nesta página). Ela cita o excesso de velocidade, terceira razão no ranking da PRF, como um dos fatores primordiais das ocorrências. "A desatenção é, na verdade, falta de tempo para a reação causada pelo excesso de velocidade", esclarece.
Década de segurança
Embora o Brasil esteja participando da Década de Segurança no Trânsito (2011-2020), coordenada pela Organização das Nações Unidas, há o temor de que as ações não diminuam os óbitos causados por acidentes de trânsito aproximadamente 35 mil brasileiros morrem por ano nas estradas e ruas brasileiras. Embora os índices lembrem os de uma guerra, os atores do trânsito continuam a se comportar de forma equivocada. "Falta educação não só para o motorista brasileiro, mas para todos os usuários de rodovias, como pedestres, ciclistas e motociclistas", diz Martinez, da PRF.
De acordo com Corrêa, as ações de segurança para o trânsito começaram a ser discutidas em 2001, mas o país não se preparou para, de fato, combater o problema. "Esperava-se que, nos anos que antecederam a década, fosse programado grande plano de execução, o que não ocorreu", critica. "Para mudar esse panorama, seria necessária a existência de uma agência de trânsito, com ligação direta à Presidência da República, com capacidade de mobilizar todos os ministérios do governo", sugere.




