• Carregando...

Diversas foram as mu­­­dan­­­ças na legislação arbitral dos países latino-americanos para acompanhar a onda de privatização e globalização iniciada nos anos 1990. O Brasil não foi exceção. Embora presente em nossa legislação desde a Constituição Imperial de 1824, a arbitragem só veio a receber sopro de vida a partir da entrada em vigor da Lei de Arbitragem (Lei n.º 9.307), em novembro de 1996.

Nos primeiros cinco anos, o instituto teve pouco uso entre nós em função da flagrante falta de conhecimento e cultura por parte de juízes, advogados e empresários. Como sabemos, mudar as leis não é tão difícil quanto mudar a mente e o comportamento das pessoas. Ademais, o brasileiro sempre foi tido como estatólatra: tende a culpar o Estado por todos os seus problemas, mas paradoxalmente é do mesmo Estado que busca a solução para resolvê-los. Essa relação de completa dependência do Estado onipresente está fortemente enraizada em nossa cultura. A Lei de Arbitragem desmistificou essa relação única e trouxe um novo caminho. Porém, como tudo o que é novo, contemplou rejeição e preconceito até ser melhor entendida. Assim, o desenvolvimento arbitral no Brasil pouco evoluiu nos primeiros anos de vigência da nova Lei.

No entanto, a partir de 2001, com a decisão do Supremo Tribunal Federal pela completa constitucionalidade da Lei 9.307/96, a arbitragem expandiu-se consideravelmente. Contratos passaram a contar com a cláusula arbitral, advogados e outros profissionais se interessaram mais pelo instituto, faculdades de Direito inseriram cursos em seus programas acadêmicos e centros de arbitragem foram criados. Merece destaque a posição de liderança, desde a primeira hora, da Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial do Paraná (Arbitac), a qual tive a honra de presidir. O ponto negativo nesse período foi o surgimento de inúmeros centros de arbitragem de fachada, com o único objetivo de arrecadar fundos com os enganosos cursos de formação "profissionalizante" de juízes arbitrais. Felizmente, tais iniciativas estão cada vez mais afastadas da sociedade brasileira pela atuação exemplar do Ministério Público e do Poder Judiciário.

No contexto internacional, destaca-se, em 2002, a ratificação pelo Brasil da Convenção de Nova Iorque, que colocou o país em pé de igualdade com os principais centros comerciais e arbitrais do mundo. Não há nação nos dias de hoje, com mínima participação no comércio internacional, que não seja membro da citada convenção e que não estimule ou preserve o uso da arbitragem. Trata-se de uma senha de respeitabilidade para levar adiante projetos de desenvolvimento sustentável.

Infelizmente, na contramão da história, surgem movimentos na América Latina de rejeição à arbitragem, a exemplo da Ve­­­ne­­­zuela, Bolívia e Equador. A primeira, banhada por petróleo na bacia do rio Orenoco, passa por um período de obsoletismo do seu parque industrial sem precedentes, proveniente do êxodo tecnológico e de investimentos em infraestrutura. É natural os governos desejarem proteger seus recursos naturais, mas seu beneficiamento responsável se justifica evitando que as riquezas fiquem dormindo em berço esplêndido. Sabemos todos que antes de colocar seu capital em uma empresa ou em um país, o investidor, seja nacional ou estrangeiro, busca enxergar a "placa de saída" para resolver acidentes de percurso.

Em função de suas características principais, como escolha e especialidade do julgador, maior celeridade e economia, o uso da arbitragem passou a ser a regra nos contratos internacionais e cada vez mais uma tendência em contratos domésticos. O Brasil ocupa hoje uma posição de visibilidade no cenário internacional e tal se deve muito a sua estabilidade política, econômica e jurídica, sendo a arbitragem um componente importante nesse tripé. A propósito, a atuação do Poder Judiciário brasileiro tem sido fundamental para gerar credibilidade e previsibilidade às partes que desejam fazer uso do juízo arbitral. Ademais, embora não seja perfeita, não vemos necessidade de alteração da Lei de Arbitragem brasileira, pois melhor do que a letra fria da lei é a sua adequada interpretação, o que vem ocorrendo. Essa conjunção de fatores, aliada aos grandes eventos esportivos internacionais que serão sediados pelo Brasil em futuro próximo, seguramente despertará ainda mais o interesse pela arbitragem entre nós: os horizontes são claros para o seu contínuo e esperado desenvolvimento.

* Advogado, consultor em Direito Estrangeiro do escritório Smith International Legal Consultants e professor da Universidade de Miami

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]