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Fiscalização cresce, mas barracões de Curitiba ainda mantêm ‘escravos do lixo’

Nos últimos três meses, dois galpões de reciclagens foram fechados na capital

No fim de abril, Gazeta do Povo havia mostrado a dinâmica por meio da qual trabalhadores são mantidos em condições de escravidão | Hugo Harada/Gazeta do Povo
No fim de abril, Gazeta do Povo havia mostrado a dinâmica por meio da qual trabalhadores são mantidos em condições de escravidão (Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo)

A prefeitura de Curitiba apertou, nos últimos três meses, a fiscalização a barracões que compram e revendem materiais recicláveis. Dois galpões chegaram a ser fechados, no período, por falta de documentação. Antes, as últimas interdições haviam ocorrido em 2007. Ainda assim, a ação não tem sido capaz de conter uma dinâmica, na qual catadores são mantidos em condições análogas à escravidão. O esquema foi mostrado pela Gazeta do Povo, em reportagens publicadas no fim de abril deste ano.

Por meio de nota, a prefeitura disse que, nos últimos três meses, a Secretaria Municipal de Urbanismo fiscalizou 17 barracões que não fazem parte do Ecocidadão – o projeto de coleta seletiva do município, que funciona por meio de convênio com cooperativas. Além dos dois galpões interditados por falta de alvará, outros seis foram multados.

A exploração de catadores mantidos como escravos parece, no entanto, longe de ser superada. Na última semana, a Gazeta do Povo localizou trabalhadores atrelados a galpões de reciclagem. Os empresários alugam pequenos cômodos dentro dos próprios barracões aos catadores, que, em troca, são obrigados a vender tudo o que coletam aos donos do negócio, por preços abaixo dos praticados em mercado.

Marcelo*, de 28 anos, paga R$ 80 por mês para alugar um cômodo - chamado de “peça” – num barracão de recicláveis, localizado no bairro Parolin. O trabalhador afirma percorrer mais de 20 quilômetros por dia pelas ruas de Curitiba recolhendo materiais. Para ele, não tem feriado, fim de semana ou dia de chuva.

“Eu começo a semana devendo R$ 80. Então não posso perder dia de trabalho. Como eu tenho que vender para o dono [do barracão] que paga um preço menor, eu tenho que catar mais, pra compensar”, disse o catador, que falou sob condição de anonimato e de não ser fotografado.

O casal Roberto* e Andreia* também se viu absorvido pela dinâmica. Eles migraram do interior do estado a Curitiba no começo do ano passado. Inicialmente, Roberto* trabalhou na construção civil, mas perdeu o emprego por causa do desaquecimento do mercado. Desprovido, viu na coleta de recicláveis sua última alternativa. Há sete meses, está “preso” a um galpão, na Vila Torres.

“Eu não consigo sair, porque não tenho onde morar e não dá tempo para procurar um trabalho certo, de carteira assinada. Então a gente fica assim, vivendo como dá”, disse. “A gente tinha esperança [de] que fosse só por um tempo, mas não está tendo o que fazer”, completou Andreia*.

Para o Ministério Público do Trabalho (MPT), a única forma de superar a dinâmica de exploração em que os catadores são mantidos como escravos é endurecer ainda mais a fiscalização a barracões clandestinos.

“É aumentar a fiscalização pela prefeitura. É responsabilidade do município ir a todos esses barracões que não são legalizados, exigir a regularização e, se não regularizar, mandar fechar. É isso que tem que acontecer”, apontou a procuradora do trabalho, Margaret Matos de Carvalho.

Para além deste trabalho, o MPT considera como ideal que todos os catadores sejam absorvidos por cooperativas que fazem parte do Ecocidadão. Hoje, mais de 650 trabalhadores estão vinculados ao programa. “O desejável é que todos os trabalhadores façam parte das cooperativas. Está tudo nas mãos do município”, disse a procuradora.

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