O comerciante Luiz Wilmar de Oliveira, 53 anos, foi à missa no último sábado atendendo ao pedido da mulher, falecida havia um mês. Gostou da cerimônia e da pregação, mas estranhou que tudo ocorresse no subsolo de um centro comercial às margens da Rodovia da Uva, em Colombo (região metropolitana de Curitiba). Achou ainda mais curioso que o padre fosse o dono do supermercado, que ele já conhecia. Oliveira, na verdade, estava em uma "missa de cura" da "Igreja Católica Apostólica Carismática", celebrada pelo padre Celso Manuel Pianu e sem vínculo algum com a Igreja Católica de Bento XVI e do arcebispo dom Moacyr Vitti, o que a torna uma espécie de "igreja pirata".
A única forma de identificar a igreja de Pianu é pelo muro pintado na lateral do estacionamento do centro comercial. O acesso ao subsolo é igual ao de uma garagem, mas do lado de dentro tudo está muito bem pintado, com cadeiras de plástico, um altar, com velas e crucifixo, e o sacrário (com a lâmpada vermelha indicando a suposta presença da Eucaristia). Mas não há imagens de santos, nem da Virgem Maria.
Sobre o altar também há um missal (livro que tem a liturgia da missa), mas o celebrante não vira uma página sequer do livro mesmo porque a cerimônia é uma colagem de poucas partes da missa católica com muitos cantos (o repertório inclui sucessos dos padres Marcelo Rossi e Reginaldo Manzotti) e bênçãos de água e objetos, ao estilo neo-pentecostal. A influência das igrejas evangélicas também está na linguagem. "Precisamos de pessoas para lavar o piso da igreja na terça-feira, amém?", pergunta Pianu, para receber outro "amém" como resposta. As leituras não correspondem às do calendário litúrgico católico. Mas ele se ajoelha diante do sacrário, diz as palavras da consagração do pão e do vinho e distribui a comunhão exatamente como na Igreja Católica. No fim, a "cura e libertação": Pianu e seus auxiliares (um deles confirmou que o celebrante é o dono do supermercado em frente à igreja), todos com aventais vermelhos, colocam as mãos sobre os fiéis, que fazem fila. Na cerimônia a que a reportagem da Gazeta do Povo assistiu, ele garantiu que muitas pessoas haviam sido curadas de dor de cabeça em suas casas.
"Ele fala melhor que muito padre", admite Oliveira, que por muito tempo freqüentou o Santuário do Perpétuo Socorro (no bairro Alto da Glória, em Curitiba) e não suspeitava que a igreja de Pianu fosse uma dissidência ou um grupo que utiliza o nome da Igreja Católica para atrair fiéis incautos. "Infelizmente deve haver muitos católicos de boa vontade que participam dessas igrejas achando que estão na Igreja Católica", afirma o padre Arcangelo Deretti, professor de Eclesiologia do Studium Theologicum de Curitiba. Segundo o sacerdote, esses grupos podem até se autoproclamar católicos, mas não o são de fato. "Não é possível ser católico sem a submissão ao Papa e aos bispos. Essa igreja em Colombo é, na prática, como um grupo protestante", descreve.
Padre Arcangelo dá uma dica para o fiel saber se a igreja que freqüenta é realmente católica: "na Oração Eucarística, o padre sempre menciona o nome do Papa e do bispo local." Na celebração de Pianu, tudo que vem depois da consagração é omitido, inclusive os nomes de Bento XVI e dom Moacyr. "Os fiéis desses grupos são católicos menos esclarecidos, mais ligados ao padre do que à doutrina. A educação dessas pessoas na fé não foi muito sólida, e talvez, em alguns casos, a Igreja tenha falhado na catequese", aponta o presidente do Instituto Ciência e Fé, Aroldo Murá Haygert.
Pianu chegou a conversar informalmente com a reportagem depois de uma de suas celebrações, mas durante a semana se recusou a dar entrevista, alegando que a "diretoria da igreja" não permitia que ele falasse. A Arquidiocese de Curitiba também não se pronunciou sobre a existência de igrejas paralelas em seu território.



