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Sétima arte

Igual ao Cinema Paradiso

Mudança na projeção de filmes, do rolo para o digital, provocou também uma transformação na relação das pessoas com o cinema

Na profissão há 48 anos, Linhares nunca danificou um filme | Henry Milleo/ Gazeta do Povo
Na profissão há 48 anos, Linhares nunca danificou um filme (Foto: Henry Milleo/ Gazeta do Povo)

Desde que Cid Linhares começou a trabalhar, em 1966, muita coisa mudou nas salas de projeção de cinema. Os projetores não são mais de carvão, os rolos de filme estão dando espaço para a reprodução digital, o espaço encolheu, a quantidade de pessoas envolvidas na atividade diminui e é proibido fumar em ambientes fechados. "Quem trabalha aqui é um solitário. Os melhores amigos do projecionista eram o café e o cigarro", resume Linhares, de 61 anos.

Atualmente, ele trabalha no Cine Guarani, espaço mantido pela Fundação Cultural de Curitiba, e deve se despedir da profissão em fevereiro, quando planeja se aposentar. Parar de trabalhar, no entanto, não está nos planos: já foi convidado para supervisionar a projeção de uma rede de cinema de shopping.

Linhares rodou o Brasil e, mais do que as mudanças tecnológicas, também assistiu a uma transformação cultural. "A coisa mais gostosa do meu tempo de cinema era ver a pessoa ter reação, sentir o cheiro de cinema. Hoje não existe mais. Está se perdendo a essência", diz.

Foi numa projeção, inclusive, que conheceu sua mulher. Era uma ‘matinada’ e a sala tinha um cheiro gostoso, de perfume. Em um intervalo, ele desceu, olhou para a mulher e começaram a conversar. Foi um pulo para virar um namoro e, por fim, um casamento. Os dois estão juntos há 43 anos.

Amor

Linhares se orgulha de nunca ter danificado um só rolo de filme. "Os filmes eram muito fracos e pegavam fogo", explica. Segundo ele, o ritual da projeção é simples. Cada filme vem em cerca de cinco rolos de película fotográfica. É o operador que monta e revisa todas as produções antes de colocar no projetor e passar para o público.

Às vezes, as coisas não saíam como o esperado. Entre 1969 e 1970, época que ele chama de epidemia de faroeste, o cinema em que trabalhava tinha três projetores, que recebiam os rolos individualmente. Três passaram sem problema, mas o quarto tinha uma sequência de luta de espadas, sem qualquer relação com o filme. "Foi um griteiro no cinema. Subiu gerente para reclamar, mas a culpa não era minha. O rolo veio trocado de outro cinema, porque eles traziam de bicicleta. Era uma confusão."

Por suas mãos passaram as projeções de clássicos do cinema, como Ben-Hur, e sucessos de bilheteria, como Ghost. O primeiro é um de seus filmes preferidos, junto com outros épicos, como Os Dez Mandamentos e O Rei dos Reis. Já o blockbuster... "Foi um saco. Ghost ficou um ano e meio passando. Eu não aguentava mais."

Embora tenha amor pelo cinema, Linhares revela que não gosta de assistir filmes nas horas de folga. No salão então, nem pensar. "É porque se eu vejo algum defeito, comento", conta rindo ao lembrar que isso de falar mal de filmes é uma das coisas que foi ensinado a nunca fazer.

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