
Morar em uma casa de 450 metros quadrados, na área central de Curitiba, e não pagar nada por isso. A ideia soa meio socialista, mas, na verdade, o imóvel imponente na esquina da Rua da Paz com a Rua Nilo Cairo virou um "mocó de luxo". Desde o fim do ano passado, a residência, que abrigava uma empresa de Recursos Humanos, estava para alugar. O casarão de 15 cômodos foi vendido e será demolido na próxima semana. A residência, no entanto, não é o único neste estado. Segundo levantamento da prefeitura, 72 imóveis em Curitiba estão abandonados e viraram alvo fácil para ocupação de andarilhos, moradores de rua, traficantes, usuários de drogas, prostitutas e travestis. Os locais escondem práticas como consumo e venda de drogas e até assassinatos.
A maior parte dos imóveis abandonados fica na região central de Curitiba e nos arredores, como os bairros Alto da XV e Água Verde. Ao todo, existem 72 processos em andamento sobre imóveis sem uso na cidade, segundo a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Urbanismo. A prefeitura afirmou que os proprietários estão sendo localizados ou já foram notificados.
Só nas últimas três semanas o número 156 da prefeitura recebeu 28 denúncias da população sobre imóveis abandonados. A fiscalização muitas vezes descobre que são terrenos baldios. Se for constatado que o imóvel está abandonado a Secretaria de Urbanismo tenta localizar o proprietário, que recebe uma notificação para vedar todos os vãos que permitam a entrada de invasores para evitar que o local se transforme em um mocó.
Se o proprietário não tomar as providências, recebe uma multa de mil reais. Em caso de reincidência, há uma segunda punição com o dobro do valor da primeira multa. A prefeitura afirma que às vezes é um pouco demorado localizar o verdadeiro dono, como nos casos em que o imóvel é uma herança ou nas situações que foi vendido e já passou para outro dono. A assessoria de comunicação esclarece que a prefeitura não tem nenhum imóvel abandonado na cidade.
Mocó será demolido
A Rua da Paz na altura do número 98 teve o nome deturpado. O casarão atraente virou um alvo fácil para os invasores. Um dos portões foi arrancado e a entrada livre possibilitou que a reportagem checasse o ambiente dentro da mansão, na tarde chuvosa de quinta-feira (20). Durante os cinco minutos dentro da casa, nenhum "morador" foi encontrado, apenas vestígios de "habitação", como alguns chinelos, um par de tênis, garrafas térmicas, uma carteira de cigarro e um isqueiro, além de muito lixo e entulho.
Na parte de baixo da casa, uma cortina encobria o que tinha dentro da garagem. O único sinal que havia alguém era uma vela acesa. Por fora a casa está bonita, embora tenha alguns vidros quebrados. Do lado de dentro está praticamente destruída. O teto de gesso apresenta buracos e algumas peças não têm nenhum pedaço de forro. Portas, fiação elétrica, pias, vasos sanitários e a parte de metal foram arrancados e levados embora. O forte fedor também revela que os moradores não fazem cerimônia para definir qualquer cômodo como banheiro, já que os sanitários foram arrancados.
Os moradores próximos à mansão reclamam da falta de segurança com o intenso tráfego de pessoas no local. No entanto, o problema, neste caso, está com os dias contados. A casa foi vendida para uma construtora. Na próxima semana a residência deve começar a ser destruída e um prédio será construído no local. O valor da venda girou em torno de R$ 1 milhão.
Medo
De acordo com uma comerciante que trabalha na região e preferiu não ser identificada, o movimento de entra e sai é constante durante os dias. "Faz uns dois meses que aumentou. Antes eram apenas mendigos que ficavam ali, mas agora têm várias pessoas bem vestidas que entram na casa", disse. Carros de luxo também costumavam estacionar na garagem. "Eles entram ali ficam um pouco e logo saem. Acho que é por causa de drogas. Sempre têm meninas que entram de sacola e saem sem nada", explicou.
A comerciante conta que três pessoas morreram dentro da casa, uma mulher e dois homens. A mulher teria sido violentada. "Tem tudo o que não presta ali dentro. A noite é um terror", contou o porteiro Celso dos Santos, que trabalha perto.
Ele disse que quase todos os dias a polícia tirava pessoas de dentro da casa, mas os policiais iam embora e meia hora depois a mansão estava novamente ocupada. Testemunhas afirmam que já presenciaram roubos de celulares de pedestres que passavam em frente da casa, cometidos por pessoas que saíram de dentro do mocó. A imobiliária que estava responsável por vender o imóvel explicou que colocou cadeados e correntes no portão, mas eram arrebentados. "Nós sempre tomamos a providência de chamar a polícia, mas à noite eles voltavam. Eu mesmo já expulsei algumas pessoas lá de dentro", afirmou o vendedor que estava responsável pela negociação da casa.
Segundo o porteiro Santos, três casas que ficavam na Rua Ubaldino do Amaral foram queimadas por moradores de rua. "Eles usam e depois colocam fogo." A moradora Dirlene Sabóia da Cunha também tinha medo dos residentes da mansão. "Na garagem tem três moradores fixos. Dentro da casa tem mais uns seis. Eles saem durante o dia e voltam à noite", disse.
Partilha de bens
De acordo com o coronel Jorge Costa Filho, Comandante do Policiamento da Capital, o grande problema dos imóveis abandonados da região central envolve a partilha de bens. "A população tem que ter consciência que o Estado faz a segurança pública e os imóveis são privados. Isso é uma questão para a Justiça resolver. Nós fazemos ações de retirada dos invasores dos locais, mas não podemos deixar um policiamento fixo no imóvel se não vira uma segurança particular", explicou Costa Filho.
Para o coronel, somente interpretações da Justiça podem afirmar se o proprietário de um imóvel abandonado é responsável por algum crime cometido nas dependências da residência. "A PM faz a prevenção e na constatação de delito faz a intervenção", disse. "Falta responsabilidade social e conscientização por parte dos proprietários", definiu.
Veja abaixo, indicada pela seta verde, a localização do imóvel




