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Medida traz riscos

Implanon: aposta do governo Lula para reduzir gravidez é aplicada em meninas de 10 anos

Aposta do governo Lula para reduzir gravidez, o contraceptivo Implanon está sendo aplicado em meninas de 10 anos. Medida traz riscos (Foto: Pexels)

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Em julho deste ano, o Ministério da Saúde oficializou a incorporação do Implanon — contraceptivo hormonal em forma de um pequeno bastonete inserido sob a pele — ao Sistema Único de Saúde (SUS). Entretanto, algumas prefeituras vêm aplicando o método em meninas de 10 anos de idade, contrariando recomendações médicas e levantando debates sobre a sexualização precoce.

Um dos casos mais emblemáticos é o da prefeitura de Fortaleza, sob a gestão de Evandro Leitão (PT), que atestava em seu site oficial que o implante era "destinado às adolescentes de 10 a 19 anos" que atendiam "aos critérios estabelecidos pelas equipes de saúde".

A Gazeta do Povo entrou em contato com a Prefeitura para questionar sobre as razões do implante em crianças dessa idade, bem como os critérios adotados, incluindo a necessidade de anuência dos pais para a aplicação.

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Fortaleza negou que meninas de 10 e 11 anos tenham recebido o implante subdérmico "no período de maio de 2024 a abril de 2025, quando o contraceptivo foi ofertado". Mas pontuou que "a faixa etária de 10 a 19 anos é uma definição da OMS sobre gravidez na adolescência e a SMS segue a definição nacional". 

No entanto, após os questionamentos da reportagem a página do site da Prefeitura que garantia que o Implanon era destinado a crianças de 10 anos no município foi retirada do ar.

Site do informe da prefeitura de Fortaleza que garantia que o Implanon era destinado "a faixa etária de 10 a 19 anos", antes e depois dos questionamentos da reportagem da Gazeta do Povo. (Foto: Site oficial da Prefeitura de Fortaleza)

Após questionamento, a Secretaria informou que "optou por retirar [a matéria] do ar, uma vez que não temos mais o contraceptivo disponível no estoque de medicamentos da secretaria e a procura pelo implante subdérmico tem sido alta, para além da faixa etária inicialmente beneficiada. Quando o método voltar a ser ofertado, uma nova matéria será feita e divulgada indicando as pessoas beneficiadas".

Campinas já aplicou o Implanon em mais de 60 meninas de 10 a 14 anos

Outra administração municipal que garante em seus canais oficiais que o contraceptivo é destinado a crianças de 10 anos é a prefeitura de Campinas, sob a gestão de Dário Jorge Giolo Saadi (Republicanos).

Em seu site oficial, o município alega que a pasta da saúde já realizou quase 3 mil implantes do método contraceptivo e, entre eles, mais de 60 foram aplicados em crianças de 10 a 14 anos.

Segundo a coordenadora da área da Saúde da Mulher de Campinas, Miriam Nobrega, o Implanon tem "resultado superior à laqueadura e vasectomia" e seu direcionamento tem sido realizado principalmente para o "público na faixa etária de 10 a 18 anos".

Miriam afirmou ainda que "a adolescente pode usar todos os métodos anticoncepcionais disponíveis" e que "a idade não é critério para uso, exceto os definitivos".

Em Pinhais, no Paraná, anuência dos pais é necessária somente até os 11 anos

No sul do país, um dos municípios que também insere o Implanon em crianças de 10 anos é Pinhais, no Paraná, sob gestão da Professora Rosa Maria (PSD). Um documento a qual a reportagem teve acesso mostra que um dos critérios para a implementação é histórico de gestação anterior, isto é, aplica-se apenas a adolescentes que já tiveram filhos.

Em resposta à Gazeta do Povo, a prefeitura de Pinhais afirmou que é necessária autorização de um maior responsável para implantação do Implanon em meninas com menos de 12 anos de idade. Mas argumenta que "a partir dos 12 anos todo adolescente tem direito à contracepção, independentemente da presença ou autorização dos responsáveis, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)".

No entanto o ECA, em nenhum artigo, menciona que adolescentes de 12 anos — com histórico de gestação ou não — têm direito à contracepção independentemente da presença ou autorização dos responsáveis, como alega o município.

"Existem critérios estabelecidos para que as pacientes sejam elegíveis ao método. As meninas com idade entre 10 a 19 anos 11 meses e 29 dias podem fazer uso do implante se histórico de gestação anterior e em situação de vulnerabilidade social, estando já vinculadas ao CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social). Sendo essa uma condicionante, já garantimos que as situações de violência tenham passado por notificação e que as pacientes estejam em acompanhamento por profissionais da rede especializada", diz trecho da nota enviada pela prefeitura de Pinhais à reportagem.

Implanon traz riscos a crianças, diz ginecologista

Uma vez aplicado na paciente, o contraceptivo Implanon libera doses constantes de etonogestrel por até três anos, bloqueando a ovulação, espessando o muco cervical e tornando o endométrio menos receptivo à implantação do óvulo fecundado.

Para a médica especialista em ginecologia e obstetrícia Elizabeth Kipman, a aplicação do Implanon em crianças de 10 anos traz muitos riscos. "No uso prolongado de anticoncepcionais hormonais, riscos podem se somar associados a outros fatores, como idade muito precoce, históricos familiares de doenças vasculares, de excesso de peso, de câncer de mama ou fígado ou de tromboses; dificuldade para o acompanhamento médico adequado."

Para além desses riscos, Kipman destaca que "alguns estudos indicam uma possível associação entre o uso de anticoncepcionais hormonais e maior riscos de depressão ou ansiedade em adolescentes".

Ela também aponta para a possibilidade de que a inserção do implante leve à suposição de que o ato sexual deve ser liberado indiscriminadamente mesmo antes do desenvolvimento biológico completo.

"Estímulo para a iniciação sexual precoce", diz deputada

Desde que a prefeitura de Fortaleza divulgou que a aplicação do Implanon poderia ser destinada a crianças de 10 anos, congressistas passaram se posicionar de maneira contrária e a cobrar explicações dos órgãos competentes.

À Gazeta do Povo, a deputada federal Mayra Pinheiro (PL-CE), que também é médica, afirmou que a prefeitura da capital cearense "está normalizando relações sexuais para pessoas muito jovens em um país onde abaixo de 14 anos a relação sexual é considerada crime de estupro".

"Crianças deveriam ser estimuladas a estudar, brincar e não, a fazer sexo. Crianças não devem ser expostas à medicalização precoce como se a atividade sexual nessa idade fosse algo normal ou aceitável", diz. "A medida da Prefeitura de Fortaleza é, sem dúvida, um estímulo à iniciação sexual precoce e sexualização infantil", prossegue.

Também crítico, o deputado federal André Fernandes (PL-CE) protocolou na Câmara dos Deputados um requerimento direcionado ao Ministério da Saúde contestando a legalidade da aplicação do Implanon em crianças.

O parlamentar cearense também citou a Portaria 48/2025 do Ministério da Saúde, que prevê que o implante de contraceptivos no SUS, seria destinado exclusivamente a adolescentes de 14 a 17 anos.

“Trata-se de uma divergência grave, pois não apenas afronta norma federal emanada do próprio Ministério da Saúde, mas também expõe crianças em idade precoce a um método contraceptivo cuja segurança e adequação nessa faixa etária não foram devidamente estabelecidas em diretriz oficial”, afirmou o deputado.

Evandro Leitão (PT), prefeito de Fortaleza (Foto: Prefeitura de Fortaleza)

A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) foi outra a se posicionar contra o Implanon em crianças. “Quando eu dou um anticoncepcional para uma menina de 10 anos, eu estou querendo que ela não conceba. Portanto, eu estou admitindo que ela está tendo relações sexuais. Essa medida é tão somente o Estado assumindo sua falência e seu fracasso no enfrentamento à erotização e à sexualização precoce de crianças e adolescentes”, disse a senadora em postagem no X.

“É uma das medidas mais absurdas que eu posso encontrar por um ente administrativo, por um ente público. Dar o anticoncepcional a uma menina em idade de formação, administrar o corpo dela hormônios, é também colocar a vida dela em risco", pontuou Damares.

Ministério da Saúde não respondeu questionamentos sobre Implanon

A reportagem entrou em contato com o Ministério da Saúde pedindo posicionamento sobre a inserção do Implanon em crianças, mas não houve retorno até o fechamento da reportagem.

A Gazeta do Povo também contatou a Sociedade Brasileira de Pediatria e a Sociedade Cearense de Pediatria, que também não se manifestaram.

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