
O projeto é ousado: transformar uma antiga e perigosa rodovia, que cortava a cidade de forma traumática e estancava o desenvolvimento econômico da região, em uma avenida moderna, arborizada e funcional, com uma variada oferta de serviços, oportunidades de negócio e lazer. A prefeitura de Curitiba chegou a convocar a população para conhecer a Linha Verde, como ficou conhecido o trecho da BR-476 que corta a capital, assim que a primeira fase da obra foi inaugurada, no dia 9 deste mês. Mas, por enquanto, as únicas mudanças sentidas na região foram no trânsito. Para a principal aposta da administração Beto Richa atingir seu objetivo e passar a integrar a lista de cartões-postais da capital conhecida por suas inovações urbanísticas, ainda falta muito. Pelo menos duas décadas, na opinião de especialistas.
A ideia de revitalizar a BR não é nova. O projeto do ex-prefeito Cassio Taniguchi era implantar o Eixo Metropolitano, num total de 18 quilômetros. Em 2003, a prefeitura conseguiu um financiamento de cerca de R$ 480 milhões no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), mas o projeto não saiu do papel. Na administração Beto Richa, o projeto foi rebatizado e encurtado para cerca de 9 quilômetros. As obras começaram em janeiro de 2007 e causaram transtornos não só na região, mas até no Centro da cidade, já que importantes ligações com a região central, como a Avenida Marechal Floriano, também foram revitalizadas. As obras da segunda etapa, entre os bairros Jardim Botânico e Atuba, deverão começar no ano que vem e custarão cerca de R$ 138 milhões.
Apesar do atraso e da falta de previsão para a conclusão da obra, a demora para a transformação não pode ser creditada apenas na conta da prefeitura. A mudança mais profunda ficará por conta da iniciativa privada, a quem caberá realmente mudar a cara da antiga rodovia. O processo começou no ano 2000, com uma lei que alterava o zoneamento em toda a cidade. No ano passado, uma nova lei, que promovia mudanças no zoneamento na área da rodovia, foi aprovada pela Câmara Municipal.
Ocupação
Segundo o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), o potencial construtivo ao longo da Linha Verde chega a aproximadamente 3 milhões de metros quadrados, em uma área física de 1 milhão de metros quadrados o zoneamento da região permite que o empreendedor adquira potencial para triplicar a área construída. A projeção, no entanto, é feita pelo teto o próprio Ippuc sabe que dificilmente todos os espaços serão preenchidos. "É uma questão de mercado. 50% (de ocupação) já estará bom", afirma o arquiteto Ricardo Bindo, supervisor de Planejamento do Ippuc.
Uma preocupação é o risco de áreas da Linha Verde ficarem ociosas, como em alguns eixos estruturais (as vias dos ônibus expresso) ao longo da cidade. O presidente do Ippuc, Cléver Almeida, lembra que, no eixo Norte-Sul, somente 25% das áreas disponíveis são ocupadas. "Mesmo 40 anos depois, temos menos ocupação entre o Cabral e Santa Cândida. Há um vazio depois do Boa Vista", diz. Na avaliação de Almeida, o mesmo processo pode ocorrer na Linha Verde. "Não é uma coisa que vai acontecer da noite para o dia, só porque a legislação existe."
A prefeitura tenta incentivar a ocupação por meio de benefícios para quem pretende investir na região. As vantagens começam para empreendimentos com 2 mil metros quadrados ou mais. Como o zoneamento da região permite que o empreendedor adquira potencial construtivo para triplicar a área, ele poderia construir 6 mil metros quadrados no lugar de 2 mil. Neste caso, a vantagem será um desconto de 50% na aquisição do potencial construtivo. Se nos 6 mil metros quadrados forem construídos 3 mil de apartamentos residencias e os outros 3 mil em escritórios, por exemplo, o empreendedor ganhará um desconto de 10% sobre o total. "Na Linha Verde, quanto mais constrói, menos paga", explica Ricardo Bindo.
Outra vantagem, explica Cléver Almeida, é o empreendedor ganhar 10% do total da área para empreendimentos comerciais, em todos os casos. "É um prêmio. O objetivo é fazer com que o benefício acelere o processo de ocupação", diz o presidente do Ippuc. Os técnicos do Instituto preferem não falar em prazos ou previsões. "Tudo depende do mercado imobiliário, temos de ver como vai ficar", afirma Ricardo Bindo. "No ano passado, em função da crise, todo mundo segurou [investimentos]. Estamos dando todas as condições para tornar a Linha Verde atrativa. Mas há áreas ociosas nos eixos estruturais, por exemplo, e o mercado só vai construir prédios lá quando houver interesse."




