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Fenianos, em frente ao Palácio da Alvorada: hospedagem negada | Divulgação
Fenianos, em frente ao Palácio da Alvorada: hospedagem negada| Foto: Divulgação

A regra é clara: só dormir na casa de estranhos, nunca pernoitar no carro e, em último caso, deitar na rua, ao relento mesmo. Com essas e outras metas na bagagem, o urbenauta curitibano Eduardo Fenianos, de 38 anos, viajou 38.000 km de carro pelo país em 185 dias. Visitou as 27 capitais do Brasil e outras pequenas cidades pelo caminho com apenas R$ 415 por mês. Em suas andanças, pediu para dormir no Palácio da Alvorada, a residência oficial do presidente Lula. Diante da negativa, acabou passando a noite em um parque de Brasília.

"Se eu entrei em 364 casas dos mais variados brasileiros, por que não dormir na 365ª casa, que é do homem que representa esses brasileiros? Eu pensei: se ele (o presidente) recebeu o astronauta, tem que receber o urbenauta (navegador da cidade). Foi uma provocação", contou Fenianos, em referência a Marcos Pontes, único astronauta brasileiro a viajar pelo espaço.

O pedido virou uma bandeira durante a viagem e o urbenauta conta que teve até torcida. "As pessoas me diziam: ‘vai dormir no Lula’. No interior do nordeste, pediam para eu dar recados a ele. É como se eu tivesse quatro mochilas pesadas nas costas cheias de coisas para falar", diz Fenianos, formado em jornalismo. Como a segurança vetou o abrigo presidencial, o urbenauta estendeu sua rede em um parque. "Acordei no meio da noite com morcegos e uma galera fazendo barulho".

Essa é apenas uma das histórias que Fenianos acumulou durante a aventura, que começou em 26 de abril e terminou em 27 de outubro. De acordo com o roteiro, o urbenauta partiu de São Paulo em direção ao sul. Passou pelo sudeste, nordeste, norte e, por fim, o centro-oeste.

Parte do que ele viu e ouviu está no livro "Expedições Urbenauta – Brasil" (editora Univer Cidade), que foi lançado nesta terça-feira (9). Com muitas fotos, a publicação traz um pouco do passado e do presente do Brasil e suas capitais. "Meu objetivo era visitar os pontos cardeais (de cada cidade) para ver as diferentes realidades e não ficar atrelado aos roteiros turísticos".

Orçamento apertado

Uma viagem tão longa e um orçamento tão apertado. Outro desafio do Urbenauta era conseguir se manter com R$ 415 por mês, o valor do salário-mínimo. Ele garante que conseguiu e até se deu ao luxo de uma extravagância. "Cheguei a emagrecer 7 kg porque encasquetei de ir até Fernando de Noronha. Chorei de deslumbramento", conta Fernianos, que pagou uma pechincha pela passagem: R$ 200 (o valor chega a mais de R$ 1mil normalmente).

"Eu mandei cartas para o governo do estado de Pernambuco, para as companhias aéreas e outros lugares. Um dia recebei uma resposta". A ajuda veio de uma emissora local. Para bancar mais essa despesa, Fenianos conta que deixou de almoçar e economizou muito no mês anterior. "Eu fui para Fernando de Noronha em julho. Em junho, gastei só R$ 175, 88".

Sem teto

Extrovertido, o urbenauta diz que arrumava teto para dormir sempre em cima da hora. "Ligava duas horas antes". Alguns contatos já haviam sido previamente estabelecidos, mas, às vezes, dava tudo errado. Em Belo Horizonte, ele tinha combinado de ficar na casa de uma jovem. No entanto, quando bateu à porta da mineira, foi barrado pela mãe dela. "Uns 20 minutos depois, chegou um PM e ficou me interrogando", conta, rindo.

Uma tática para garantir a noite de sono em lugar seguro era parar em postos de gasolina. "Ficava conversando com os frentistas e sempre arrumava algum lugar". Segundo Fenianos, o segredo é "o poder de persuasão" e chegar "na amizade". O urbenauta afirma que nunca fez distinção e pernoitou em moradia de gente rica e pobre.

"Dormi na casa de foragido, travesti, ex-gay, em acampamento do MST, em tribo indígena, entre os madeireiros na Amazônia, na favela", revela. Questionado sobre o que mais marcou nesses seis meses, Fenianos pára, pensa e diz: "As amizades que fiz, os abraços, o carinho com que fui recebido".

A gentileza será retribuída. "Estou pensando em comprar uns colchões e colocar ganchos para rede na parede. Tem três meninas de Campo Grande que vão ficar aqui para ir ao show da Madonna e uma galera de Fortaleza que está querendo vir".

Percalços e projetos Em uma expedição tão longa, em que Fenianos ficava muito tempo sozinho dentro do carro, difícil não pensar em imprevistos. Logo no início, o veículo quebrou e ele teve de tirar do "salário" R$ 130. Na única vez em que foi roubado – levaram o GPS e uma câmera fotográfica – estava em Belém (PA).

Em Manaus, não acreditaram no projeto e chamaram o urbenauta de "golpista". Com a vida atribulada e distante, o casamento de seis anos se desfez. Mas nada que desanime o aventureiro, patrocinado por uma fabricante de veículos e um banco.

Entre os projetos futuros, está a publicação de um diário de bordo com detalhes da viagem e a exibição de um documentário. As primeiras impressões dos recantos do Brasil? "No sul, o pessoal é mais fechado e no nordeste, mais aberto. Lá em Manaus, eles não gostam de dar informação e, no nordeste, dão informação errada quando têm vergonha de dizer que não sabem", conta.

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