
Brasília O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que os produtos geneticamente modificados devem ser regulados pela força do mercado. Ele posicionou-se contra o estabelecimento de leis estaduais para os transgênicos, como insiste o governo do Paraná. "Se a gente permitir que a legislação seja específica de cada estado, acho que iremos criar várias repúblicas dentro do Brasil", disse.
O petista participou ontem de uma entrevista coletiva com 11 repórteres de jornais regionais do país entre eles, a Gazeta do Povo. O encontro de duas horas ocorreu, pela manhã, no Palácio do Planalto. Especificamente sobre o Paraná, falou sobre a transgenia, mas declarou que o governador Roberto Requião (PMDB) tem o "direito de brigar pelo estado".
O presidente foi claro, porém, ao afirmar que a regulamentação depende da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTN-Bio). Afirmou que grande parte dos cientistas brasileiros e pessoas ligadas ao meio ambiente participam desse grupo e que ele tem condições de tomar decisões na área. "Eles vão definir qual é o produto que vai entrar em pesquisa, qual é o produto que vai ser produzido, qual é o produto que vai entrar em mercado."
Mais forte do que qualquer obrigação legal, entretanto, serão as condições financeiras oferecidas aos produtores rurais. Segundo ele, sempre terá preferência o produto que trouxer mais rentabilidade. "Se amanhã eu for comprar soja no Paraná ou for comprar soja no Rio Grande do Sul e oferecer para um produtor: olha, eu vou te pagar tanto pela saca do não-transgênico, R$ 10 a mais do que a transgênica, certamente no ano seguinte ele estará produzindo a soja convencional e não a transgênica."
Lula também ressaltou que, até o momento, o governo federal está intervindo da melhor maneira possível, "fazendo o que deve ser feito". "Há uma opção muito grande dos produtores, inclusive no Paraná tem muita gente plantando transgênico, porque para eles é economicamente viável nesse momento. O preço é o mesmo, tem menos praga."
A principal restrição aos produtos geneticamente modificados seria ambiental. Lula disse que o governo precisa tomar cuidado para não permitir que o transgênico cause qualquer dano em áreas que demandam mais cuidado, "sobretudo na Amazônia Legal". A regulamentação, para ele, deve se restringir essencialmente ao zoneamento de áreas que possam abrigar essa produção, sem agredir a natureza.
O posicionamento de Lula é um choque contra uma das principais bandeiras de Requião, que deseja transformar o Paraná em um estado livre de transgênicos. A guerra sobre o tema começou em 2003, quando a lei estadual 14.162 proibiu o cultivo, a manipulação, a importação, a industrialização e o comércio de transgênicos no Paraná. A norma foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.
Após proibições que causaram enormes transtornos legais, foi liberado no ano passado o embarque de soja transgênica no Porto de Paranaguá. Atualmente, até o silo público está liberado para receber soja modificada, apesar dos protestos do governador. Por último, ocorreu a tentativa de declarar ilegal a aplicação do herbicida glifosato (específico para as lavouras transgênicas), o que também foi revertido judicialmente.
As diferenças de avaliação sobre o tema entre os governos federal e estadual também chegaram à CTN-Bio. A comissão, defendida por Lula, tem sido alvo de constantes críticas de aliados de Requião. "O governo do Paraná repudia as decisões políticas da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) que, atendendo aos interesses comerciais das empresas multinacionais, desrespeitam os princípios fundamentais de biossegurança e afrontam decisões judiciais", declarou no dia 20 o coordeandor do Grupo Técnico de Rotulagem dos Transgênicos, Álvaro Rychuv, em texto publicado na agência de notícias do governo estadual.



