
Ponta Grossa - Não vira papel, nem se transforma em móveis e não vai para a construção civil. A maior parte da madeira cortada no Paraná é usada como fonte de energia. É queimada: vira carvão vegetal ou alimenta, na forma de lenha e cavaco, fornos e caldeiras. Pelos cálculos do Instituto Nacional de Eficiência Energética (Inee), a metade do material vegetal usado para produzir energia vem de matas nativas. Em recentes fiscalizações, o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) encontrou fornos de carvão e picadores de madeira abastecidos com araucária, cedro e até imbuia. No Centro-Sul a região que tem os maiores remanescentes e também a que mais devasta a Mata Atlântica no Paraná , sobrevoos de helicóptero realizados neste ano localizaram 1,1 mil fornos de carvão em meio à floresta.
Segundo o superintendente estadual do Ibama, José Álvaro Carneiro, uma grande quantidade do que é produzido de carvão no Paraná é usada nas usinas siderúrgicas de Minas Gerais. Assim, araucárias cortadas no estado estariam sendo usadas para fabricar aço e ferro gusa. A "importação" de carvão paranaense seria uma forma de burlar uma rigorosa lei mineira: todo o produto queimado nas caldeiras das usinas só pode vir de madeira de florestas plantadas.
Biológo e escritor, Felipe Costa conta que as empresas passaram a comprar carvão também de Goiás e Bahia. "A cadeia produtiva em torno das siderúrgicas é suja e criminosa. Envolve trabalho escravo, trabalho infantil e desmate. A forma de impedir que árvores nativas sejam abatidas e torradas é ficar em cima de quem compra", diz. Para ele, que mora em Minas Gerais, muitos empresários ainda se valem da máxima de reduzir custos, mesmo praticando ilegalidades, e procuram áreas onde ainda é possível desmatar.
Para o coordenador de mobilização da Fundação SOS Atlântica, Mario Mantovani, a pressão sobre o que resta de vegetação nativa para lucrar antes que alguma estrutura pública impeça a destruição completa da floresta promoveu "uma espécie de salve-se quem puder". "Não é nada inteligente queimar árvores como araucária e imbuia. Estão fazendo lenha e cavaco disso. Mas é que algumas pessoas enxergam as toras apenas como uma forma de ganhar dinheiro. Se não conseguem um valor melhor por elas, aceitam até queimar, desde que lucrem com isso", avalia.
O diretor-geral do Instituto Nacional de Eficiência Energética (Inee), Jaime Holanda, conta que 14% da energia primária brasileira vem da madeira. E mais da metade da madeira queimada vai para a indústria. "Cerca de 35% do ferro gusa produzido no Brasil é com carvão vegetal. E em nenhum outro lugar do mundo se usa isso, já que há fontes de carvão mineral. O problema do uso de vegetal é o aspecto criminoso de queima de mata nativa", afirma. Contudo, alguns setores industriais conseguiram priorizar as florestas plantadas, como pínus e eucalipto e buscaram formas mais racionais de usar a madeira. As toras são divididas em três partes: a mais nobre é vendida para serrarias, a menos nobre alimenta as caldeiras da própria fábrica e a intermediária vai para a produção de papel.



