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Câncer de mama

Mamografia só aos 50 anos causa controvérsia

Médicos que apoiam a recomendação argumentam que exame precoce estimula tratamentos desnecessários. Quem defende a rotina a partir dos 40 afirma que ela salva vidas

Silvia descobriu um câncer de mama aos 45 anos, pela mamografia: "A doença é uma coisa séria; as pessoas acham que é fácil de curar, que é moleza, pelos exames disponíveis, mas não é." | Rodolfo Buhrer/Gazeta do Povo
Silvia descobriu um câncer de mama aos 45 anos, pela mamografia: "A doença é uma coisa séria; as pessoas acham que é fácil de curar, que é moleza, pelos exames disponíveis, mas não é." (Foto: Rodolfo Buhrer/Gazeta do Povo)

Quando o assunto é câncer de mama – a doença que mais mata brasileiras atualmente, com 50 mil casos e 10 mil óbitos anuais, segundo o Ministério da Saúde – o Brasil tem posição clara: a melhor forma de prevenção é a mamografia, exame recomendado a mulheres acima de 50 anos. Um estudo promovido pelo US Preventive Service Task Force (USPSTF na sigla em inglês) – órgão que assessora o governo em assuntos de saúde preventiva – e divulgado na segunda-feira reforçou o posicionamento brasileiro, mas causou controvérsia na comunidade médica.

A recomendação esbarra no fato de que a idade mínima para a realização da mamografia não é consenso entre médicos, muito menos entre órgãos que estudam e pesquisam o tema no Brasil e nos EUA. A Sociedade Americana de Câncer disse que vai ignorar a nova diretriz. O Instituto Nacional do Câncer (Inca) e o próprio Ministério da Saúde afirmam que a prevenção deve começar a partir dos 50, mas a Sociedade Brasileira de Mastologia defende que a prática deve se iniciar antes.

A razão da discordância está no fato de que, para o primeiro grupo, exames de mama realizados antes dos 50 estimulam cirurgias e tratamentos invasivos nem sempre necessários e eficazes, e que muitos tumores que aparecem nessa época costumam desaparecer com o tempo. Resu­mindo, seriam muitos os riscos para poucos benefícios. "Não existe índice de sobrevida maior para quem fez o exame antes dos 50, então, porque submetê-las a exames desnecessários?", questiona o oncologista e médico do Hospital de Clínicas Vinicius Budel. "Essa recomendação vem de um estudo sério, feito por experts, e já é seguido no Brasil".

Para o "outro lado", no qual se inclui o oncologista José Cle­mente Linhares, do Hospital Erasto Gaertner, o estudo americano não se aplica no Brasil. "As populações são diferentes, logo a comparação não faz sentido. O câncer de mama está aliado a fatores que diferem de um país para outro, como a idade em que a mulher foi mãe, quando entrou na menopausa e o tipo de alimentação", diz.

Segundo Linhares, é verdade que o diagnóstico antes dos 50 estimula os ditos "falsos positivos", mas que isso ocorre também com outros tipos de exames de rastreamento, como o de câncer de colo de útero. "É melhor correr riscos e salvar algumas vidas do que ficar avaliando o custo-benefício e não salvar nenhuma. Não vivemos de estatística. Por isso a medicina não é uma ciência, mas uma arte."

Um levantamento feito pelo Erasto Gaertner parece ir na contramão do que afirma o estudo, de que a maioria dos tumores que aparecem antes dos 50 é inofensiva. "29,8% dos casos tratados por nós são de mulheres entre 40 e 49 anos, e 24,3%, de mulheres entre 50 a 59 anos, ou seja, a incidência é parecida nas duas faixas etárias", diz Linhares. Já para Budel, do HC, a maioria dos casos surgidos antes dos 50 é de mulheres que têm histórico da doença na família. "Se a mãe, irmã ou tia tiveram a doença, ela pode fazer a mamografia até antes dos 40, mas não há necessidade de todas fazerem. Cada caso é um caso, e quem sabe quando o exame é necessário não é uma lei ou o governo, mas o médico", enfatiza.

A administradora de recursos humanos Silvia Bogolla, 48 anos, é um exemplo de incidência precoce. Aos 45, descobriu a doença através da mamografia. Com histórico na família (duas tias tiveram o câncer, uma aos 50, outra aos 70), Silvia fazia o exame desde os 29 anos. Para ela, a idade correta deveria ser aos 40, independentemente do que dizem as estatísticas. "Eu tive antes dos 50 por histórico familiar, mas uma parente teve antes e não tinha casos na família. Quanto antes a gente fizer, melhor. A doença é uma coisa séria; as pessoas acham que é fácil de curar, que é moleza, pelos exames disponíveis, mas não é."

Autoexame

Outro ponto sem definição diz respeito ao autoexame das mamas, no qual a mulher apalpa os seios e axilas à procura de nódulos. O estudo americano aconselha os médicos a não ensinar o toque às pacientes, pois o método seria ineficaz e causaria ansiedade e estresse desnecessários.

Para Linhares, banir o autoexame é "exagero". O médico afirma que o toque só detecta tumores com mais de 1,5 cm, e que, nesses casos, a mamografia é a melhor opção, pois de­­tecta tumores milimétricos, mas que o contrário também pode ocorrer. "Há casos em que a mamografia não acusa nada, mas o toque consegue detectar. Ele não substitui a mamografia, mas é um metódo auxiliar considerável, além de ajudar no autoconhecimento do corpo."

A vendedora Vanderli Libe­rato só detectou um tumor de 1,5 cm através do toque. "Sou totalmente a favor do autoexame. As mulheres precisam parar de ter preconceito contra o próprio corpo e adotar a prática. A única pessoa que pode realmente te salvar é você."

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