Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Escritório central

MP descobre 181 pescadores lesados nas ações da Petrobras

Promotoria de Justiça conclui que a central de operações das fraudes funcionava dentro da 1ª Vara Cível de Paranaguá. Chefe seria o dono do cartório

Ozília desmaiou ao saber que a advogada havia se apropriado do dinheiro de sua indenização | Oswaldo Eustáquio/ Gazeta do Povo
Ozília desmaiou ao saber que a advogada havia se apropriado do dinheiro de sua indenização (Foto: Oswaldo Eustáquio/ Gazeta do Povo)

A Gazeta do Povo revelou em abril o caso de 18 pescadores que não receberam suas indenizações das ações contra a Petrobras, embora o dinheiro tenha sido sacado da conta judicial pela advogada Cristiane Uliana. Foi o estopim de uma investigação maior. A 1.ª Promotoria de Justiça de Paranaguá comprovaria meses depois que o número de clientes lesados é pelo menos dez vezes maior. O escritório central da organização que teria sido criada para facilitar as fraudes contra a Petrobras e os pescadores funcionava dentro da 1.ª Vara Cível de Paranaguá.

A investigação do Minis­tério Público (MP) aponta como líder da organização o escrivão Ciro Antônio Taques, chamado de "Patrão" e "Investidor 1" pelos demais membros do grupo, tendo como segundo na hierarquia o juiz Hélio Tsutomu Arabori, à época titular da 1.ª Vara Cível. A operadora do esquema seria Cristiane. Depois de publicadas as primeiras reportagens, ela foi convidada a depor na Promotoria. Foi quando as provas teriam começado a surgir. Entre elas, uma planilha da organização onde estão relacionados 181 pescadores que tiveram suas indenizações desviadas.

Os integrantes do grupo teriam combinado dividir entre si os 30% dos honorários cobrados de cada ação judicial, mas, conforme investigação do MP, eles não se contentavam em apenas receber parte dos honorários contratuais, passando a se apropriar dos valores devidos às vítimas dos acidentes ambientais. As provas constam nos relatórios contábeis da própria organização, que teriam sido elaborados por dois de seus membros, Alessandro Paulo Kinal e Marcos Gustavo Anderson.

As provas

A primeira prova está na folha 158 do relatório. "Tendo em vista alguns ‘descompassos’ na gestão financeira do escritório Cristiane Uliana Advogados Associados, alguns dos autores tiveram as suas execuções levantadas, no entanto, não tiveram o valor repassado, ocasionando um passivo que monta atualmente [novembro de 2010] R$ 2.535.467,69", diz o relatório. O valor representa 181 pescadores, cujos nomes estão anexados ao documento em posse do MP. Na contabilidade, esses pescadores são chamados de "autores a pagar".

As folhas de 227 a 229 do relatório trazem o seguinte trecho: "Decidiu-se também que, para que se evite a suspensão dos repasses dos honorários contratuais aos membros do grupo, o Investidor 1 [Ciro Antônio Taques] ficará responsável por caucionar bens imóveis no valor aproximado de R$ 700 mil, a fim de realizar o pagamento dos autores do mês de dezembro de 2010." Segundo o MP, isso indica que Taques se apropriou de valores dos pescadores e teria de caucionar bens para garantir o pagamento aos clientes do escritório de advocacia.

O relatório da organização traz a relação dos pescadores que, em sua maioria, tiveram os valores da indenização sacados da conta judicial entre outubro e dezembro de 2012 e não teriam recebido os valores da indenização. Isso, segundo o MP, corrobora a gravação telefônica interceptada com autorização judicial entre o advogado Rogério Costa e o serventuário da Justiça Arival Tramontin Junior, tratando do não repasse de dinheiro aos pescadores.

Pescadora desmaia ao descobrir saque

A pescadora Ozília do Rosário chegou a desmaiar no início de abril ao ser informada de que a Justiça havia liberado R$ 37,2 mil referentes ao processo que ela movia contra a Petrobras em decorrência do acidente do navio Norma. Acompanhada do irmão, Ozias do Rosário, ela foi à Caixa Econômica Federal, em Paranaguá. Eles saíram às 2 horas da manhã da Ilha de Medeiros e caminharam pelo meio da mata por uma hora e meia até chegar à Ilha de São Miguel, onde há embarcação para ir a Paranaguá.

Ao sair da agência com o extrato bancário, Ozília voltou a passar mal após confirmar que o dinheiro havia sido sacado pela sua procuradora no dia 26 de outubro de 2012 e não havia sido repassado a ela. Emocionada, contou à reportagem que nesse período ela e os filhos muitas vezes passaram fome.

"Eu não tenho vergonha de contar que vim para Paranaguá com apenas uma bala na bolsa. Era tudo o que eu tinha. Eu estava com muita vontade de chupar a bala porque tinha saído de casa em jejum, mas não consegui porque era a única coisa que eu tinha pra levar pro meu filho", disse.

A advogada pagou a pescadora quase um ano e meio depois. Ozília contou à reportagem que com o dinheiro vai comprar uma pequena embarcação para a família voltar a pescar e colocou o restante do valor no banco.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.