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Inclusão digital

Na periferia, lan house vira até escritório

Locais de uso coletivo de computador cumprem importante papel para a democratização do acesso à informação

As vendas da promotora Silvia tiveram aumento de 50% com o uso da internet | Albari Rosa/Gazeta do Povo
As vendas da promotora Silvia tiveram aumento de 50% com o uso da internet (Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo)

Até dar o relato para esta reportagem, o comerciante Geraldo Faria da Silva Júnior, 30 anos, nunca tinha se dado conta do serviço social involuntário que sua lan house presta à comunidade. Afinal, foi no estabelecimento de Silva, a Click Lan, que boa parte dos moradores do Jardim Monza (bairro humilde de Colombo, região metropolitana de Curitiba) passou pelo batismo digital – o primeiro contato com a internet.

Dos 2,5 mil clientes cadastrados nos dois anos de funcionamento da loja, o comerciante calcula que no mínimo 800 tenham feito ali o primeiro acesso à rede de suas vidas. A maior parte instruída por ele mesmo. "A primeira coisa que eles pedem é para fazer um e-mail. Geralmente porque precisam enviar um currículo ou têm alguma outra necessidade relacionada a trabalho", relata o comerciante.

Foi exatamente o que aconteceu com a promotora de vendas Silvia Firmino de Melo, 37 anos. Cliente de Silva, ela navegou a primeira vez pela internet em janeiro, quando a empresa com que trabalha ofereceu vantagens às representantes que enviassem pedidos por e-mail. Com as revistas e amostras grátis que passou a ganhar por usar o computador ao invés do telefone, Silvia, que não tem condições de adquirir uma máquina, aumentou as vendas em 50%. "Ainda não sei mexer direito com o computador. Mas dá para dizer que a lan house hoje é meu escritório", explica Silvia, que aprendeu os primeiros passos com o filho Leonardo, de 14 anos, e que nos últimos dias vem se arriscando também com a ferramenta de conversação MSN. "Estou economizando bastante com telefone falando com outras revendedoras pelo MSN", afirma.

Casos como o de Silva ocorrem nas periferias de todo o Brasil, comprovando que as lan houses são hoje no país a principal porta da inclusão digital – a democratização das tecnologias de informação.

Levantamento do Comitê Gestor de Internet (CGI) – órgão federal que agrega universidades, empresas e ONGs – aponta que praticamente metade dos acessos à internet no Brasil em 2008 foi feita em lan houses (48%). Foram 25 milhões de usuários no ano passado, o dobro de 2007. E desse total, 59% é das classes C, D e E. "O objetivo do proprietário de lan house é, evidentemente, o lucro. Mas é ele quem leva o acesso à informação às comunidades mais carentes. Tudo involuntariamente, é claro. O que não tira em nada o mérito das lans na inclusão digital", aponta Mário Brandão, coordenador do CDI Lan, projeto do Comitê Para Democratização da Informática (CDI), que visa disseminar boas ações desses estabelecimentos em todo o país.

Estigma

Brandão afirma que, apesar deste papel social, ainda é muito forte o estigma de que lan houses são utilizadas apenas para ações ilícitas. "O poder público cria uma série de restrições às lan houses, mas, por outro lado, não percebe que esses mesmos estabelecimentos podem ser usados a favor da cidadania, com prestação de serviços, auxílio à educação, cultura, turismo, já que muitas vezes é o único ponto de internet na comunidade", relata.

Ele cita o exemplo do governo do Rio de Janeiro, que obriga os pais a fazerem as matrículas nas escolas via internet. "O governo obriga, mas não ensina e nem dá acesso à internet para as pessoas. Aí quem vai cumprir esse papel é justamente o dono da lan house", compara.

Outro exemplo citado por Brandão, agora pelo lado positivo, é o da prefeitura de Salvador. Desde o final do ano passado, a Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo do Município (Sucom) mantém uma parceria com lans para atender os moradores da periferia. Os proprietários foram treinados por técnicos da prefeitura a prestar atendimento aos usuários. "Para a prefeitura, a vantagem é desafogar o atendimento na sede. Para o comerciante, a vantagem é aumentar a clientela", comenta Brandão.

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