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“A carne se vai”

No embalo da folia, nos tempos da Idade Média

O carnaval existe desde quando? Segundo pesquisadores, a festividade tem origem a partir da criação do calendário gregoriano

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Há controvérsias sobre a origem do carnaval. Alguns pesquisadores defendem que essa tradição nasceu no Egito, na Grécia antiga e ainda com o povoado da Mesopotâmia. Há outros, entretanto, que dizem que a festa começou a existir a partir do momento em que a Igreja Católica fixou a data da Semana Santa e estabeleceu os 40 dias de penitência, durante a Idade Média. É fato que o carnaval não é um movimento religioso ou reconhecido pela Igreja. Por isso, qual é o fator que justifica atribuir a origem da festividade ao calendário gregoriano?

No século 11, quando os religiosos passam a cumprir com o período de penitências, que antecede à Páscoa, não é permitido comer em abundância, cantar e dançar. Para se preparar para os 40 dias de privação, então, nada melhor do que matar antes os prazeres carnais (festividades) e a vontade de comer alimentos gordurosos. Surgem, assim, as festividades que antecedem à Semana Santa. Primeiramente os dias foram chamados de "a carne se vai" ou os "dias do adeus à carne". Depois, as pessoas começaram a chamar de dias de "carne vale" e, enfim, dias do carnevale e do carnaval. "Começa em Roma (Itália) à medida que é ali que saem os preceitos da Igreja, as ideias do papa. Mas depois se espalha por toda a Europa", explica o professor do Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e coordenador do Centro de Referência do Carnaval, Felipe Ferreira. Ele é autor de diversas obras sobre o tema, entre elas, O Livro de Ouro do Carnaval Brasileiro.

A confusão da origem do carnaval estar na antiguidade, segundo Ferreira, é porque há uma distorção no conceito simbólico da palavra carnavalização. "Ela pode ser usada para se referir a qualquer coisa ou lugar bagunçado: você fala, ‘isso parece um carnaval’, mas não se refere exatamente à festa em si. Existiam festividades carnavalizadas no Egito e em qualquer outro lugar do mundo, mas o conceito dessa comemoração surge da Idade Média para cá", afirma. A professora do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro Maria Laura Cavalcanti explica que o uso de máscaras e fantasias remonta aos rituais antigos encontrados no Egito e na Babilônia. "São elementos simbólicos do carnaval, mas não quer dizer que há uma formação histórica direta", diz.

No início, o carnaval não era organizado como hoje. A população mais simples saía às ruas para comemorar sem nenhuma ordem. "Somente nos séculos 18 e 19 é que os estudiosos começaram a pesquisar esse fenômeno social e entenderam que existia um tipo de festa popular que antecedia à Páscoa", explica Ferreira. O livro Viagem à Itália, de Johann Wolfgang Von Goethe, publicado no século 18, dá uma ideia de como era a festa antigamente, na Europa. Ele faz uma descrição sobre o modo de brincar o carnaval em Roma: fala dos bailes com máscaras e das fantasias usadas pela nobreza.

Na França, logo após a Revolução Francesa, a burguesia ascende ao poder e começa a impor uma nova forma de vida e muda, entre outras coisas, a maneira de ver a festa carnavalesca. "As ruas de Paris, nesse período, eram sujas e frias. Mas, mesmo assim, a burguesia usa esse espaço para mostrar que era dona da cidade e que o carnaval deveria ser organizado, com bailes mascarados e passeios de carruagem", afirma Ferreira.

Carnaval brasileiro

Com a chegada dos portugueses ao Brasil, a população que aqui residia foi catequizada e, consequentemente, começou a seguir os preceitos da igreja e alguns costumes, como o próprio carnaval. A corte dançava em bailes com máscaras e, em casa, tinha a praxe de jogar bolinhas de cera recheadas com perfume, conhecidas como limões de cheiro. Era uma espécie de batalha para molhar todo mundo – as bolinhas eram confeccionadas pelos escravos. Havia comida farta e as brincadeiras também giravam em torno de pregar peças nos outros: tudo isso reunido levou o nome genérico de entrudo, palavra de origem portuguesa.

Fora dos lares, porém, o carnaval tomava um ar agressivo. A população mais simples jogava nas outras pessoas tudo o que tinha nas mãos, poderia ser água ou o próprio balde. "Os viajantes que saíam às ruas para passear começaram a criticar o ato de selvageria. Quando o Brasil se torna independente de Portugal, a burguesia carioca começa o movimento contra as brincadeiras desorganizadas para tentar mostrar que agora eles pertenciam ao mundo dos civilizados", explica Ferreira. Copia-se exatamente o que acontecia na França: começam os passeios de carruagem e o desfile das primeiras fantasias nas ruas – a população deveria parar a algazarra para ver a burguesia passar.

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