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  • Hoje ele foi transformado em local de recolhimento
  • A capela ocupa parte do que foi o salão de jogos: sai a mesa de roleta, entra o altar
  • A fonte que se pensava ser de água mineral ganhou os índios após uma reforma
  • Confira a trajetória da área que abrigou o Cassino Ahú

Freiras não frequentam cassinos, é verdade. E foi exatamente este o espanto que tiveram as religiosas da Divina Providência ao receber o convite do padre Valério Alberton para conhecer o Cassino Ahú, em 1957. O propósito do sacerdote, porém, estava longe de vê-las apostando algum dinheiro. O objetivo era saber da possibilidade de comprar o local para transformá-lo em convento. Uma ideia aparentemente mirabolante deu certo e sobrevive até hoje. O salão de jogos, onde funcionavam as roletas, foi dividido e transformado em capela, salas de visita e oração. O cassino literalmente se converteu em local de sossego e reza. O palco, entretanto, que recebeu diversas personalidades nacionais e internacionais, ainda está lá, intacto, junto ao salão principal. O silêncio que ecoa das paredes maciças parece esconder ainda os segredos do auge da antiga sociedade curitibana.

Mulheres desacompanhadas e estudantes tinham o acesso restrito ao cassino, que funcionou de 1939 a 1946. Elas não podiam entrar solteiras porque o local era familiar e devia-se, por isso, evitar a todo custo a prostituição. Eles eram barrados porque não davam lucro algum à jogatina. Como lembra o professor Alceu Schwab, no livro A música no Cassino Ahú, estudante que se prezava, na época, vivia de bolso vazio. Já as crianças só poderiam entrar durante os matinês de domingo, acompanhadas dos pais.

Enquanto cerca de 18 pessoas se sentavam à mesa para fazer as apostas no salão de jogos, diversos outros curiosos (e, por que não, torcedores) se amontoavam no ambiente para ver o espetáculo do jogo de azar: era uma diversão para a sociedade daquela época. Schwab lembra que a atração pelo jogo era tão grande que "os maiores jogadores eram vigiados por olheiros dos banqueiros de Curitiba": o objetivo era evitar o mau uso do dinheiro aplicado pela população nos estabelecimentos de crédito. O custo das fichas variava entre 5 mil e 500 mil réis – já os jogos mais populares e a própria roleta tinham o preço inicial de 1 mil réis.

No lado oposto da sala de azar, ficava o salão grill-room, uma espécie de local para jantar, dançar, ouvir músicas e ver apresentações. "Entre os dois salões estava o ambiente destinado aos fumantes", lembra Nelly Hellender Macedo – ela era casada com o filho de um dos antigos proprietários do local. Nelly era criança quando o cassino começou a funcionar, o que não a impede de se lembrar das personalidades que passaram pelo salão grill-room – o nome se refere a um lugar para jantar (com grill). "O comentário da época era o Cassino Ahú. Por lá passaram famosos como Orlando Silva, Carlos Galhardo, Dalva de Oliveira e Francisco Alves", diz. O irmão mais novo de um dos frequentadores do cassino, Airton Ferreira do Amaral, conta que sentava para ouvir as histórias que o primogênito tinha para contar. "Havia um convênio com o Cassino da Urca, do Rio de Janeiro. Eles mandavam para Curitiba os artistas que se apresentavam lá. Era uma festa tão elegante, por sinal, que a entrada aos homens só era permitida para aqueles que estavam com traje social completo", afirma. Já as mulheres, conforme lembra Nelly, portavam chapéus, peles e joias.

A última apresentação do cassino ocorreu em 30 de abril de 1946, uma terça-feira, por causa da proibição dos jogos de azar, decretada pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra. Depois disso, o cassino nunca mais abriu. Estiveram presentes, nesta última noite, Nelly Ferri, cantora internacional de Buenos Aires; o Garoto, homem que era o maior solista de instrumentos de cordas da América do Sul; e "Betty and Newton", a dupla de bailarinos mais jovem do Brasil. Depois daquele dia, o destino da antiga casa de jogo seria se tornar casa de oração.

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