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Entrevista

O guri que lia Camões

Virgílio Balestro, irmão marista, latinista, tradutor, economista, autor de Desiguais da Natureza e Desiguais Incomuns (Editora Champagnat)

O irmão marista Virgílio Balestro, 83 anos, é dono de uma sólida carreira intelectual, cultivada em parte na Sorbonne, onde estudou na década de 1960, parte com o latinista Napoleão Mendes de Almeida. Há exatos 40 anos se fixou em Curitiba, tendo como casa a comunidade religiosa do Colégio Marista. A Gazeta do Povo teve três encontros com o intelectual – um deles, a seu pedido, resultou numa entrevista por escrito. Confira.

Quem é o irmão Virgílio Balestro? Como o senhor se definiria?

O título de irmão se prende à Congregação dos Irmãos Maristas, parte componente da Sociedade de Maria, em que há Sacerdotes, Irmãos, Irmãs e Irmãs Missionárias, todos de origem francesa da primeira metade do século XIX, pouco depois das tropelias da Revolução Francesa e das guerras desbordantes de Napoleão Bonaparte. Os Irmãos Maristas foram fundados por são Marcelino Champagnat (1789-1840) em 1817, no burgo humilde de La Valla, próximo da cidade de Saint Chamond. Na fundação, Champagnat teve por referência a Congregação dos Irmãos Lassalistas. Naquele tempo, a educação primária e secundária da França dependia, em grande parte, dos Irmãos Lassalistas. Os membros da Congregação foram chamados por Champagnat "Pequenos Irmãos de Maria". Na aprovação da Congregação, a Santa Sé lhes deu o nome oficial de "Fratres Maristae a Scholis", Irmãos Maristas das Escolas, já que se dedicavam ao magistério.

Qual seu livro de cabeceira? E o que está lendo no momento?

O oculista me obriga a uma resposta direta, que descarta a leitura em tal posição. Metaforicamente, porém, importa atender ao espírito da pergunta. O livro da pergunta é o santo Evangelho, pelo próprio imperativo da religião cristã, ademais de haver nele "o Carmelo interior" da suprema sabedoria humana e divina, a um só tempo, como se comprazia em dizer e escrever o piedoso intelectual chinês John Wu.

O senhor leu Os lusíadas aos 13 anos de idade. O que lembra dessa experiência? Foi uma das leituras que modificaram sua vida?

Obviamente, a idade de 13 anos constitui estágio anômalo para a leitura dos Lusíadas. Ocorre que fazia dois anos que eu começara a falar sofrivelmente o português, na capital do Rio Grande. Divertia-me com a harmonia da escansão das sílabas fortes e fracas dos versos. Atraía-me a sonoridade bem distribuída. Entregava-me ao sonho, ao sentimento, à prazerosa acústica. Ainda assim, aquele gesto temerário da leitura estranha e o fato de o cartório me ter dado o nome do poeta clássico Publius Virgilius Maro não lograram fazer-me amigo dedicado das musas, senão mero leitor assíduo delas. Pouco ou nada restou em mim daquilo que Ezra Loomis Pound (1885-1972) enfatiza em três maviosas palavras gregas: melopeia, fanopeia e logopeia, como se ele quisesse sumariar o "espírito das literaturas" em três termos musicais, como antídoto das turbulências modernas. As longas filas e esperas dos corredores do internato de Porto Alegre, entre 1942 e 1949, em que o silêncio era obrigatório, ficavam mais aprazíveis, sem dúvida e não me foram prejudiciais. Fica a lição: a leitura dos clássicos pode madrugar sem graves inconvenientes. O professor de português nunca vai meditar demasiado o que Ludwig Wittgenstein (1889-1951) escreveu: "O limite do meu universo é determinado pelo limite da minha linguagem". Norbert Wiener (1894-1964), insigne poliglota e fundador da Cibernética, concordaria. As próprias metáforas parecem lanternas para iluminar o texto do paradigma do nosso relacionamento com o mundo.

O senhor é um religioso de alta envergadura intelectual. Teremos menos religiosos com alto desenvolvimento acadêmico e intelectual no futuro? Ou já estamos neste estágio? O que lhe parece? Essa questão o preocupa?

Não por mera modéstia, devo liminarmente discordar da "envergadura" atribuída. Houve, sim, algum esforço, infelizmente entrecortado, e sem plano ou planta progressiva digna do nome. O próprio Rui considerava que "fora apenas estudante"; e acrescentava logo: "Não sei se bom estudante". Entre as grandes ordens e congregações religiosas houve e há muitos homens e mulheres de envergadura nas letras, na educação, na filosofia e no saber teológico e, algo menos, em outras ciências. Nem falta alguma enérgica e mui erudita Falange de apóstolos leigos, com generoso influxo midiático entre nós. O sacerdote Antônio Vieira, por inefável decreto de Fernando Pessoa, foi declarado "Imperador da língua portuguesa"; mas quase nunca se sublinha que o essencial preparo de Vieira foi feito na escola colonial baiana, incluindo o "decênio decisivo", dos quinze aos vinte e cinco anos. Cumpre dar a cada qual o seu merecimento: suum cuique tribuere.

O senhor é pessimista quanto aos rumos da educação no Brasil? Qual sua maior crítica ao modelo aplicado no país?

Do ponto de vista humano e brasileiro, esta pergunta contempla o desafio dos desafios, pela decisiva importância que o repto aponta e comporta. Entremos de pancada no tema. A Finlândia e a Coreia do Sul, por exemplo, só entregam os corações, as almas e as inteligências das suas crianças e jovens àqueles candidatos que, quando alunos, foram dedicados e brilhantes, na privilegiada faixa de 2% dos melhores estudantes, ademais de outras qualidades de liderança e moralidade. Claro, no Brasil temos de incluir logo, ou mesmo antes disso, a seleta diretoria do colégio, pelo peso estratégico da administração da escola. Depois dessas prévias opções, não vai ser necessário despender muito na educação, já que o bom diretor e o bom professor vão assegurar a proficiência do investimento.

Tanto a Coreia do Sul como a Finlândia investem um pouco menos que 4% do seu PIB. Quociente intelectual, QI, entre nós, na prática e na chalaça, se realiza e se lê seletivamente como quem indica. Zeferino Vaz, que ceifou o canavial para plantar a Unicamp, talvez a menos indigna das nossas universidades de levar o nome, reiterava: "Quando a política entra pela porta, a ciência sai pela janela". Em termos educacionais, mais que no resto, o nosso ator político, com as poucas exceções de praxe, age e opera nas areias movediças da esperteza e da parca responsabilidade.

O professor Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos, não economiza munição: fala da nossa terra como de "República destroçada". Oliveiros S. Ferreira, em capa de livro de 128 páginas, de 1983, que o leitor pode puxar do seu computador, se vale do termo máfia ou "coisa nossa". Assim, o meu otimismo existe; mas é tanto de realismo como de protesto, porque a solução está à vista de todos e não é demasiado cara; não iguala cifrão e competência; não preconiza 10% do PIB de dispêndio-desperdício, porque tal desembolso, na sua maior parcela, não dá autoridade ao diretor, não atinge o ator da sala de aula, ou aquele que varre a sala e limpa o banheiro.

Em educação também, o realismo é o funeral das ilusões. Haja vista e colírio para os atuais longos e vastos meses de greve professoral desaçaimada das mui caras universidades federais. Nem falta o absurdo: em sociedade pobre, a entidade estatal dá gratuitamente a educação superior aos mais ricos, concentrando-lhes ainda mais a renda. Eles não assumem nem o estacionamento do carro de luxo com que se dirigem ao almoço: tudo é saldado pelo pagador de impostos.

Se o senhor tivesse de dizer onde o país errou, o que responderia? No seu ponto de vista, em que ponto do passado se esconde o capítulo mais dramático de nossa história, aquele que poderia ter feito tudo ficar diferente?

Os nossos erros são enormes. Bastariam os quatro séculos escravistas de índios e negros. A expulsão do jesuíta constitui erro de pesadas consequências. A ausência da universidade, mesmo no Brasil colonial, foi grave erro. A pergunta é complexa, múltipla e de atendimento assaz imperfeito, porque a correta resposta exigiria muito cálculo, pesquisa e confronto. Ainda assim, martelemos a bigorna da relatividade de Einstein. Ocorre que há erros relativos. Por exemplo, a expulsão dos inacianos auxiliou o domínio da língua portuguesa. No século XVIII, ainda era predominante o tupi geral, que era preconizado e aperfeiçoado pelas necessidades culturais dos Jesuítas.

O constructo escravista, em tese, não constitui culpa nem dolo da imensa porcentagem não ibérica dos patrícios que aqui chegaram depois da abolição. Eles, por certo, não contam nenhum avoengo imerso em tal constructo servil de quatro séculos. Bem pensando, não todos os erros são absolutos. O imperador da Muralha chinesa manteve sob a mesma constituição, a ferro e fogo, uma centena de milhões de chineses.

Tal bruteza edificou um Império pelo menos duas vezes maior, em civilização e cultura, do que logrou, no Ocidente, o imperador Trajano, no começo do segundo século da era vulgar. Tal império, dito, em chinês, "Império do Meio", por mais de dois mil anos tem sido a primeira potência do mundo. Hoje é a segunda, mas tão ascensional, que pode lograr retomar a primazia do PIB, em poucos decênios. De modo singular, a pobreza e a desbordante progressão demográfica do povo brasileiro podem considerar-se erros. Ainda assim, a pouca instrução, a ignorância e o descontraído liberalismo moral da nossa história obviaram a que fôssemos, hoje, um Canadá equatorial mais opulento, mas vazio, à mercê do predador distante ou próximo.

O continente brasileiro necessita de centenas de milhões, para a singela mantença da sua posse integral. O capítulo mais dramático e, simultaneamente, sortudo foi o fruto do sonho de Antônio Vieira. Ele aconselhava, no meio do século XVII, uma aparente loucura: preconizava que a Coroa deixasse à deriva o Reino e se transferisse para o Brasil, onde se poderia erguer o Quinto Império. Em si, para o comum dos mortais, era sonho adoidado. Em 1808, porém, na invasão da metrópole lusa por Napoleão, ocorreu o portento. A interesseira e pérfida Álbion, então primeira potência mundial e rainha dos oceanos, assoprou nos ouvidos de João VI que levasse a cabo o sonho de Vieira. Sob a proteção da potência britânica, Lisboa e a nobreza, às pressas e atabalhoadamente, encheram a marinha mercante e a marinha combatente de pessoas e de coisas e se transferiram ao Brasil.

Os três monarcas sucessivos João VI, Pedro I e Pedro II levaram a cabo tão seriamente o projeto quimérico de Vieira, que hoje a extensão de meio continente ainda está sob a mesma bandeira e falando a mesma língua. Erro, drama e sorte se deram as mãos e puseram o nome de Brasil no Quinto Império. Cumpre-nos hoje tomar posse da herança com maior juízo e atender ao destino, que nos percebe como potência que já não cabe fora da grandeza.

Quando e como se sentiu chamado à vida marista? O senhor poderia nos contar como nasceu sua vocação?

A vocação religiosa, nos termos evangélicos, tem que ver sobremodo com a graça de Deus. A piedade e a prática da religião na família, por certo, hão de ter sido o meio especial da graça divina. Depois, no meu caso, outros influxos devem ter pesado. O mano mais velho, de nome João, interno do Colégio Imaculada Conceição de Guaporé, RS, muito contribuiu. Aliás, por longos anos, ele tem exercido o diaconato em Criciúma. Fui interno com ele por alguns meses; descontei um pouco o custeio por meio de certos serviços ao meu alcance de menino: servir à mesa, auxiliar na cozinha, em recados diversos. Daí por diante, a piedade e a dedicação dos Irmãos Maristas, professores e administradores, muito me ajudaram nas horas amenas e, mais e melhor, nas decisões menos aprazíveis. O influxo e a bênção do bom Deus foram decisivos.

A experiência de ter atuado diretamente na UNE, na juventude, ocupa que lugar em sua biografia. Houve uma decepção com o discurso da esquerda? O que lhe parece hoje aquele tempo?

Realmente, o meu colega de Direito, Paulo Gouveia da Costa, inspirado e assistido pelos colegas, era ótimo líder de palavra e de prudente silêncio. Ele assumiu a responsabilidade de concorrer ao comando da UNE de 1965. Foi eleito com folga por todo o universo dos acadêmicos do Brasil, contrariamente ao que ocorre hoje, em que a UNE virou monopólio sectário de sigla partidária, visceralmente pertença da Presidência da República. Assim, a UNE tem parco poder real e diminuta influência, porque a Entidade se demudou em servilismo áulico.

Havia para a UNE dois problemas maiores em 1965: éramos mais democráticos que o Presidente da República, porque legitimados pelo bendito olho d'água da eleição direta, austeramente sancionados pela minijustiça eleitoral estudantil de urnas honestas e incontrastáveis, ao passo que o honrado general Castelo Branco era o imposto do Movimento de 31 de março do ano anterior. O segundo problema, menos espinhoso, era que sucedíamos a um candidato confessamente marxista. No órgão midiático da UNE, os marxistas recebiam material e auxílio do mundo comunista, sobretudo do poder da União Soviética. O nosso órgão Impressão não queria ser áulico, servil, submisso, porque o povo estudantil brasileiro, em folgada maioria de eleição direta, nos havia passado generoso substabelecimento, que queríamos honrar em plenitude.

Na sua vez, o líder Paulo Gouveia da Costa me pediu que assumisse a responsabilidade da Secretaria do órgão Impressão. Causou estranheza nos meios estudantis marxistas o enorme artigo Contrabando: eis a receita, que levava a minha assinatura. Eles achavam que poderiam assinar o artigo, mas não reputavam prudente. Da minha parte, insistia em que cumpria lavrar o nosso modesto protesto. Como o autor se entendia bem com o assessor do comandante do Terceiro Exército, Justino Alves Bastos, não houve maiores cobranças. No dia seguinte, o sol nasceu de novo, nada ameaçador nem tormentório.

Os tempos de Sorbonne e do Collège de France – quais as memórias das aulas com Perroux, Braudel e Aron? Algum episódio pitoresco? Por qual dos três nutriu particular admiração?

No decênio de 1970, na França e no mundo, o professor François Perroux (1903-1987) era considerado como um dos melhores economistas. Na Europa, especialmente, ele era visitado e consultado por colegas e mesmo por estudiosos das nações do "socialismo real". Vinham a ele, no Collège de France homens de diversos países, por vezes em equipe de políticos e administradores. A algumas dessas caravanas intelectuais tive a oportunidade de assistir, como no caso das Jounées rouméno-françaises.

O impacto está por merecer registro sumário. Em certo momento, um deputado da Romênia saiu-se com temerária provocação: "M. François Perroux, il ne vous manque que vous faire marxiste". Senhor François Perroux, nada vos falta afora vos fazerdes marxista. De parte e outra, a emoção e certo calafrio subiram de ponto. Atalhou, sem demora, o mestre: Eh bien, chez vous une certaine truculence n'est pas inconnue".

Estimados senhores, o vosso país não desconhece boa dose de truculência. Passemos a Fernand Braudel (1902-1986), historiador dos "grandes espaços e da longa duração", como o Mediterrâneo de Filipe II. Liga o fato histórico à geografia e à economia, como na obra "Civilisation matérielle". Raymond Aron (1905-1983) foi professor de ciência política, setor em que escreveu diversos livros. Era profundo conhecedor das nações ocidentais e do jogo internacional das Superpotências Soviética e Americana, bem como da grande tragédia alemã. Em geral, a aula de Aron era lida inteiramente, de fio a pavio de bem calculados sessenta minutos. Tal aula seriada soía transformar-se posteriormente em capítulo de livro. Retrospectivamente, percebi bem isso no caso do livro "Les Etats-Unis, une République Impériale", talvez o mais difundido de Raymond Aron.

De acordo com a conversa que tivemos, foram milhares as páginas traduzidas, e de muitos milhares as páginas corrigidas. A tradução mais comum foi a francesa; depois vêm o inglês e o castelhano; menos vezes o italiano e o latim. O que faz de alguém um bom tradutor? Que conselho daria a alguém que esteja se iniciando nas lides da tradução?

Fiz muitas traduções, mais vezes do francês, mas também do castelhano, do inglês e do latim eclesiástico, como na versão de 605 páginas do Officium Beatae Mariae Virginis, da Abadia de Calcat, França. Em geral, eram traduções de livros. Por exemplo, "Cartas Recebidas", "Vinte anos de Brasil", "Guia das Escolas". "Cadernos Maristas", em geral cada volume com mais de 150 páginas. No decênio de 1990, por alguns anos, traduzi do inglês a correspondência e os manuais de administração dos Irmãos de língua portuguesa da África, então sob a supervisão do Provincial de língua inglesa. Do castelhano traduzi o livro "Educación moral y cívica", 156 páginas, do professor argentino da Província de Santa Fe, Salvador M. Dana Montaño, edição da PUCRS, em 1967.

Tais traduções atingem facilmente quatro mil páginas. Fiz muito mais correções: centenas e centenas de teses, idem artigos soltos de muitos autores. Corrigi originais de livros, de revistas, especialmente da RAC, Revista de Administração Contemporânea, da UFPR. Em alguns anos, no final do decênio de 1990, corrigi o Boletim da AEC e de manuais da educação a distância. Houve a extinção, em 2011, da edição portuguesa da RAC, que passou a sair apenas em inglês e na internet. O informe da RAC calculou as páginas dos treze anos em vinte e cinco mil. A soma das correções vai a diversas centenas de milhar. Também me dediquei a ajudar ex-alunos, colegas de magistério e mesmo outros a que escrevessem livros.

Entre outros, assim foram publicados: Construir e O Anjo que estava lá, do arquiteto José Luiz Schukovski: A Economia do mais e O Brasil que deu certo, de José Monir Nasser; Filosofia do gênero em face da Teologia, da professora dra. Clélia Peretti. Tive a honra e o proveito de apreciar, que não de corrigir, o livro Liberdade e Responsabilidade dos meios de Comunicação, do dr. Guilherme Döring Cunha Pereira. No decênio de 1960, pude exercer alguma eventual colaboração, como na revista Veritas, da PUCRS; em alguns diários, como Jornal do dia, Diário de notícias e Correio do Povo (no tempo de Breno Caldas). Em apreciação e muita vantagem cultural, que não de retificação, tive a honra de cooperar em diversos livros, particularmente na obra a Universidade em busca da excelência, do Reitor Magnífico da PUPR, Prof. Dr. Clemente Ivo Juliatto.

Em Desiguais da natureza... o senhor assume o gênero ensaio. É o gênero da velhice? Permite costurar o conhecimento de uma vida?

Digitei modesto e desenxabido protesto. Coloquei, porém, a lanterna na proa da esperança e não na popa do desânimo. Nas suas memórias, o François Perroux brasilieiro, Roberto Campos, na sua densa e extensa enciclopédia crítica de 1.417 páginas, perpetrou a impiedade de pendurar a lanterna na popa, "para iluminar apenas as águas que deixamos para trás"; aliás, o viés temerário é de Samuel Taylor Coleridge. Ofereci o meu atual livro aos antigos alunos, onde tento fazer um sumário, talvez um tanto palatável, das minhas muitas e imperfeitas aulas. Tomei por guia um filósofo literalmente anônimo: Epicteto. Em grego, Epicteto significa mercadejado. A história não guardou o nome deste filósofo. A obra atribuída a ele, Entretenimentos, é o registro do seu discípulo Arrieno. A sentença que permeia o livro, quiçá abusivamente, é a seguinte: "A tua convicção é que te impele, porque escolha prepara escolha".

O nosso subdesenvolvimento constitui sobremaneira a teimosa sucessão de más escolhas de muitos escolhos. Ainda assim, cumpre atendermos ao convite do destino, no sentido de tomarmos posse da herança continental com civismo, com valor e com virtude, de espírito muito desanuviado dos dois extremos que nos manietam ao pelourinho: ufanismo ingênuo e jeremismo desautorizado pela própria herança e destino manifesto, porquanto já não cabemos fora da grandeza.

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