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Veja que sítios e galpões estão no caminho do contrabando |
Veja que sítios e galpões estão no caminho do contrabando| Foto:

Mercado formal já sente a falta de mão de obra

Para a engrenagem do contrabando funcionar nas cidades-depósito, um exército de moradores passou a atuar como "laranjas" (transportadores de mercadorias), olheiros e batedores de carros de passeio, vans e ônibus metropolitanos usados para o transporte dos produtos. Com isso, o mercado formal já sente a falta de mão de obra.

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"Laranjas" fogem dos baixos salários

Arrumar um emprego com carteira assinada mal passou pela cabeça de Maria (nome fic­­tí­­cio), 30 anos. Moradora de Santa Terezinha de Itaipu, a 26 quilômetros de Foz do Iguaçu, há pelo menos dez anos ela ganha a vida no vaivém do comércio paraguaio.

Tudo começou após o convite de uma amiga. No início, Maria atuava na função de "laranja" (transportadora de mercadorias). Com o tempo, pegou gosto pelo negócio. Hoje, revende mercadorias em São Paulo, ganhando até três vezes mais do que o salário médio oferecido pelas cooperativas e frigoríficos. "Eu gosto do Paraguai e nunca procurei trabalho aqui", conta. Para Maria, os moradores de cidades pequenas optam pela atividade informal no Paraguai porque não há muita oferta de emprego formal, por não ter "padrinhos" e devido aos baixos salários. "Você não quer saber de carteira assinada se tem o próprio salário", afima.

Foz do Iguaçu - Na rota da ilegalidade, municípios da região Oeste do Paraná situados ao longo da BR-277 e às margens do Lago de Itaipu se tornaram cidades-depósito para o armazenamento de drogas e mercadorias contrabandeadas do Paraguai. Com o aumento da fiscalização na região da Ponte da Amizade, que liga o Brasil ao país vizinho, as quadrilhas optaram por fazer carregamentos "formiguinha" até pontos vizinhos a Foz do Iguaçu, a fim de des­­viar a atenção da polícia e furar o bloqueio da Receita Federal (RF) na fronteira.

Uma das táticas dos contrabandistas é alugar casas, depósitos e barracões em pequenas propriedades rurais da região. Depois de um curto período de armazenagem, que pode durar uma noite ou 24 horas, as mercadorias são transferidas para caminhões, carros ou ônibus e levadas para inúmeras cidades brasileiras, segundo o capitão César Kamakawa, do Nú­­cleo do Interior da Força Samurai. "Eles saem de Foz com poucas mercadorias para não chamar atenção", diz. A maior parte dos produtos cruza a fronteira em barcos clandestinos que atracam em portos ilegais espalhados pelos 170 quilômetros de extensão do Lago de Itaipu, entre Foz e Guaíra.

O delegado-chefe da Polícia Federal (PF) em Foz, José Alberto Iegas, diz que cigarros e produtos de informática são a maior parte das mercadorias estocadas nas cidades-depósito. A PF tem identificado pontos de estocagem de drogas e mercadorias na região de Foz, Cascavel e Guaíra. Em Foz, as constantes apreensões têm origem em denúncias da população pelo telefone 194.

O delegado da PF em Cascavel, Mozart Fuchs, diz que o esquema chegou a quase todas as cidades do Oeste e do Sudoeste do estado. Algumas mercadorias são deixadas a céu aberto, em meio às lavouras de propriedades rurais distantes; outras, em galpões ou barracos de lona. O transporte geralmente é feito à noite. "Muitos alugam os sítios e contam com a conivência dos proprietários, que também são responsabilizados pelo crime de contrabando", enfatiza. Fuchs diz que a maior parte dos proprietários é cooptada pelas quadrilhas, por isso não presta queixa à polícia.

Na região de Guaíra, a prática se espalhou por cidades lindeiras ao Lago de Itaipu e outras perto da divisa com o Mato Grosso do Sul, onde existe uma logística de transporte ajudada por olheiros e policiais corruptos. De acordo com o delegado-chefe da PF, Érico Sa­­conatto, os municípios mais visados pelas quadrilhas, em especial as de contrabando de cigarro, são Maria Helena, São Jorge do Patrocínio e Ivaté. Após esconder a mercadoria, os contrabandistas usam carros de passeio ou caminhões.

Lucro fácil

Os proprietários de imóveis e sítios envolvidos no contrabando ganham de acordo com o volume de mercadorias deixadas no local e pelo passe livre concedido às quadrilhas para entrar e sair das propriedades, segundo o delegado Érico Saconatto. Na região lindeira, cada caixa de cigarro armazenada rende de R$ 2 a R$ 5, conforme o tempo de estocagem. A quantidade de mercadoria depositada varia. Em Guaíra, a PF já encontrou um depósito com 80 caixas de cigarro e outro com 2,3 mil. Os proprietários envolvidos são indiciados por contrabando e podem ser enquadrados no crime de formação de quadrilha.

As prisões e apreensões na fronteira são diárias e lotam as carceragens da região. Só neste ano a PF prendeu 222 pessoas em Foz, com idade entre 20 e 30 anos, a maioria por contrabando e tráfico de drogas. Como o contrabando é afiançável, boa parte dos detidos acaba reincidindo.

A cultura do contrabando ganhou força nos municípios vizinhos a Foz após o aumento da fiscalização na Ponte da Amizade em 2007, quando uma nova estrutura aduaneira possibilitou fiscalizar um maior número de pessoas que cruzava a fronteira. Com isso, o Lago de Itaipu passou a ser mais usado para escoar as mercadorias com entrada proibida no Brasil ou que deixam Foz sem o pagamento de impostos, o que configura o crime de descaminho.

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