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Despedida

País perde a graça de Millôr

Escritor e cartunista morre aos 88 anos e deixa legado multicultural – no jornalismo, desenho, prosa, teatro e literatura

“O homem é o único animal que ri. E é rindo que ele mostra o animal que é.” | Ricardo Moraes/ Folhapress
“O homem é o único animal que ri. E é rindo que ele mostra o animal que é.” (Foto: Ricardo Moraes/ Folhapress)

O escritor e cartunista Millôr Fernandes morreu aos 88 anos, após sofrer um acidente vascular cerebral em sua casa, na noite de terça-feira, no Rio de Janeiro. Jornalista, escritor, ilustrador, dramaturgo, fabulista, calígrafo, tradutor, inventor do frescobol e "medalha de ouro no concurso para ele mesmo" (como uma vez se definiu), Millôr Fernandes foi, ao longo de mais de sete décadas de carreira, uma figura pública única no Brasil.

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Segundo o filho do escritor, Ivan Fernandes, Millôr teve falência múltipla dos órgãos. O velório será hoje, das 10 às 15 horas, no cemitério Memorial do Carmo, zona portuária do Rio. O corpo será cremado em cerimônia restrita à família.

Millôr deixa dois filhos, Ivan e Paula, frutos de seu relacionamento com Wanda Rubino. Dois de seus irmãos são vivos: Ruth, que mora no Equador, e Hélio, proprietário do jornal Tribuna da Imprensa.

Um frasista brilhante que via no humor "a quintessência da seriedade", como gostava de resumir, Millôr passou grande parte da vida profissional ameaçado pela censura. Com passagens marcantes por veículos como O Cruzeiro, O Pasquim e Jornal do Brasil, entre muitos outros, ele participou de algumas das principais transformações da imprensa brasileira no século 20 e se tornou um dos mais queridos cronistas do país.

Origem

Filho de Francisco Fer­nandes e de Maria Viola Fer­nandes, Millôr Fernandes nasceu no Méier, bairro da Zona Norte carioca ao qual só se referia como "Meyer", em 16 de agosto de 1923. A data de nascimento que constava de sua carteira de identidade, no entanto, era 25 de maio de 1924. Outra confusão deu o nome com que se tornou conhecido. Seus pais queriam chamá-lo de Milton, mas o nome, escrito à mão, acabou lido e registrado no cartório como Millôr. Ao descobrir o engano, já com 17 anos, resolveu adotar a nomeação acidental.

Perdeu o pai e a mãe cedo, e a orfandade, dizia, o fez chegar não só à conclusão de que Deus não existe, como lhe proporcionou o que ele chamou de "a paz da descrença". "Você nunca viu 10 mil incrédulos invadirem o país de outros 10 mil incrédulos para impor sua descrença", escreveu, muitos anos depois, para defender sua posição.

Carreira

Aos 19, Millôr foi contratado pela revista O Cruzeiro. No período em que ficou na publicação, as vendas subiram de 11 mil exemplares para 750 mil.

Millôr fez sua primeira exposição de desenhos em 1957, no Museu de Arte Moderna. Foi um dos criadores do O Pif-Paf. Apesar de ter durado apenas oito edições, o jornal é considerado o início da imprensa alternativa no Brasil. Ele foi ainda um dos colaboradores de O Pasquim, reconhecido por seu papel de oposição ao regime militar.

Millôr foi também dramaturgo, autor de peças como Pigmaleoa (1962) e Computa, Computador, Computa (1972). Seu trabalho como tradutor também foi marcante, em especial para teatro. Suas versões de peças de Shakespeare se tornaram referência no meio, assim como de outros autores, sobretudo de língua inglesa – como Edward Albee, Tennessee Williams e Beckett –, mas não só.

Entre suas principais obras publicados estão The Cow Went to the Swamp ou A Vaca Foi para o Brejo e Livro Vermelho dos Pensamentos de Millôr.

Millôr foi colaborador da revista Veja e de vários jornais, entre eles, O Globo e O Estado de São Paulo.

Nos últimos anos, Millôr repetia em entrevistas que era "indecentemente feliz". Dizia viver na melhor época da história, e admirava o desenvolvimento tecnológico – comprou seu primeiro computador em 1986, criou um site em 2000 (www.millor.com.br) e mantinha uma conta no Twitter (com mais de 335 mil seguidores) desde 2009.

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