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Saúde

Pandemia como a de "Contágio" é possível, diz especialista da Fiocruz

Filme baseou-se em um vírus real, o Nipah, identificado originalmente em 1999, na Malásia. Vírus infectou 265 pessoas na época, 105 morreram

Blockbusters de Hollywood não são exatamente conhecidos por sua exatidão científica. Nem precisam, necessariamente, ser. Mas, em "Contágio", em cartaz desde sexta-feira, o oscarizado Steven Soderbergh resolveu contar a história de uma pandemia que dizima boa parte da população mundial não pelo ponto de vista da degradação da civilização (como "Ensaio sobre a cegueira", de Fernando Meirelles) ou da aventura de ficção científica (caso de "Eu sou a lenda", de Francis Lawrence). Optou por uma abordagem ultrarrealista. Baseou-se, inclusive, num vírus real, o Nipah, que, sob as devidas circunstâncias, poderia causar uma epidemia mundial similar à do filme, segundo especialistas.

"Claro que o filme mostra o pior cenário possível, com um vírus extremamente letal e muito contagioso, mas é bastante realista, meio didático até. Não é uma situação impossível de acontecer", afirma a virologista Marilda Mendonça Siqueira, da Fiocruz. "Várias cenas foram feitas no Centro de Controle de Doenças (dos EUA), os atores conversaram com os pesquisadores de lá e acho que, por isso, o filme ficou com um perfil bem interessante."

Identificado originalmente em 1999, num surto na Malásia, o Nipah infectou 265 pessoas, das quais 105 morreram - uma letalidade de cerca de 40%. Desde então, foram 12 surtos, todos no Sudeste Asiático. Em Bangladesh, em 2001, a letalidade chegou a alarmantes 80%. De janeiro a março do ano passado, foram registrados casos isolados da infecção. De um total de 17, 15 se revelaram fatais.

Como o MEV-1, o vírus do filme, uma das rotas de transmissão conhecida do Nipah é do morcego para o porco e, então, para o homem, tornando-se, depois, transmissível entre humanos. Trata-se de um paramixovírus (grupo que engloba a caxumba e o sarampo), altamente patogênico que, como no longa, causa encefalite grave e doença respiratória. Não há vacina contra a infecção. Mas, então, por que, até agora, não houve uma epidemia mais grave desse vírus e apenas surtos isolados?

"A diferença é que o Nipah não é um vírus altamente contagioso", explica a virologista. "Para ser transmitido é necessário um contato muito próximo, como o de uma mãe cuidando de um filho, por exemplo. Não é como o do filme, em que uma pessoa espirra no ônibus e vários ficam doentes. Por isso acabou ficando mais circunscrito."

O filme (estrelado por Gwyneth Paltrow, Jude Law, Matt Damon e Kate Winslet, entre outros) mostra como o vírus se espalha rapidamente pelo mundo, matando boa parte da população e condenando o restante ao confinamento. Mostra ainda os esforços de especialistas do CDC e da Organização Mundial de Saúde (OMS) para responder à pandemia.

Especialistas dizem, no entanto, que outros agentes poderiam causar epidemias tão terríveis como a retratada no filme.

"Em 2003 tivemos a Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars, em inglês), que por pouco não chegou ao cenário do filme", afirmou o especialista em respostas epidemiológicas John Edmunds, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, em entrevista à BBC.

A gripe, no entanto, ainda é um dos principais candidatos a causador de uma pandemia. A gripe aviária (H5N1) é o maior temor. Mas embora tenha uma letalidade bem alta, de até 65%, não é transmissível entre humanos.

"Esse tempo que o vírus precisa para (sofrer uma mutação que o torne capaz de) passar de homem para homem é o que a gente tem para ganhar corrida", diz Marilda. "Já temos uma vacina e dois antivirais muito bons."

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