
Cerca de três meses após a Gazeta do Povo revelar o drama de pescadores que desconheciam ter direito a indenizações pagas pela Petrobras, parte dos trabalhadores foi chamada para receber o dinheiro da compensação por dois desastres ambientais ocorridos em 2001 no Litoral paranaense: o vazamento de óleo do poliduto Olapa e o vazamento de nafta do navio Norma. Por causa dos dois desastres, ao menos 6 mil pescadores, catadores de caranguejo e marisqueiros tiveram suas atividades interrompidas por quase oito meses.
Em abril deste ano, a reportagem encontrou ao menos 18 pescadores que ignoravam a existência de indenizações parciais liberadas pela Justiça e sacadas pelo escritório da advogada Cristiane Uliana, que os representa. Após a repercussão do caso, ao menos seis receberam o recurso e quatro continuam à espera da compensação. A reportagem tentou, por diversas vezes nos últimos meses, entrar em contato com Cristiane e com o advogado dela, mas ninguém quis comentar o caso.
Barco
Joel Belo é um dos trabalhadores que conseguiu receber a indenização. Atualmente, ele tem um pequeno comércio na Vila Guarani, em Paranaguá, e com o dinheiro recebido comprou um barco e reformou o teto do estabelecimento. "Eu e meus filhos fomos procurar nossos direitos. A advogada reconheceu que o dinheiro havia saído e nos pagou. A nossa tristeza de tantos anos e descrença na Justiça se transformou em alegria e em um barco que vai beneficiar toda a nossa família", afirma. Os pescadores Odair do Nascimento e Osvaldo Moreira também receberam suas devidas indenizações.
Reginaldo Modesto Soares custou a acreditar que a Justiça havia liberado, em 2012, o dinheiro da indenização. Ele denunciou a advogada à Polícia Civil de Paranaguá e à Ordem dos Advogados do Brasil, mas antes foi ao escritório da profissional com uma câmera escondida, quando foi informado de que não havia nada a receber. Após a publicação da reportagem, de acordo com o pescador, ele recebeu o valor, descontados os honorários da advogada. "Fiquei feliz em receber o dinheiro porque estava com duas contas de luz atrasadas. Consegui pagá-las e ainda investir em produtos para a bicicletaria que eu tenho", conta.
Um dos casos mais dramáticos foi o da pescadora Ozília do Rosário, que desmaiou quando foi informada pela reportagem sobre a existência de um saque de R$ 37,2 mil feito por sua advogada no dia 26 de outubro de 2012. Sem recursos e sem ter o que comer na época, ela chegou a sair de casa, na Ilha de Medeiros, às duas da manhã para ir à Caixa Econômica em Paranaguá verificar se o dinheiro havia realmente saído. Mesmo de forma tardia, a pescadora recebeu a indenização e vai investir em um novo barco para a família.
MP recebeu mais de cem denúncias nos últimos meses
É raro passar um dia sem que novas denúncias cheguem ao Ministério Público e à delegacia de Paranaguá. Os prejudicados pelos desastres ambientais afirmam ter sido lesados por seus advogados. Passam de cem as denúncias ao MP. Na delegacia de Paranaguá, cerca 80 pescadores registraram BOs.
A pescadora Suzana Xavier da Silva procurou a reportagem porque acreditava que poderia ser mais uma vítima. Ela foi até a Caixa Econômica e constatou um saque de R$ 5.333 de sua conta judicial. Sem conter as lágrimas, disse que, na época da liberação dos recursos, havia perdido o emprego e passava por dificuldades para sustentar os quatro filhos. "Bem nessa época eu fiquei desempregada e procurei a advogada. Disse que precisava do dinheiro mais do que nunca e ela me disse que não havia saído. Fui enganada. Até quando essa situação vai continuar impune?", questiona. Suzana procurou a delegacia e registrou boletim de ocorrência contra a advogada. Também encaminhou o caso ao Ministério Público.
A assessoria do MP informou que o órgão está recebendo novas denúncias, mas devido ao grande número de pescadores que se dirigem ao Fórum, o procurador está apenas recolhendo a documentação e agendando os depoimentos para datas posteriores. O delegado da 1.ª Subdivisão Policial de Paranaguá, Ítalo César Sega, disse que, devido ao grande número de boletins de ocorrência, o inquérito ainda não foi concluído.



