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Segurança pública

PPPs – Presídios Públicos ou Privados?

Parceria com iniciativa privada pode ser a saída para tirar sistema penitenciário do caos

Apesar de o número de vagas do sistema penitenciário do Paraná ter mais que dobrado, cadeias permanecem lotadas | Maurício Borges/Gazeta do Povo
Apesar de o número de vagas do sistema penitenciário do Paraná ter mais que dobrado, cadeias permanecem lotadas (Foto: Maurício Borges/Gazeta do Povo)

A rebelião de 15 de janeiro na Pe­­nitenciária Central do Estado (PCE) e a consequente prisão de dois agentes penitenciários no início do mês criaram dúvidas em torno da capacidade do poder público de administrar presídios. Cadeias lotadas e dificuldades de infraestrutura física e de pessoal fazem parte da realidade das cadeias brasileiras. No Paraná, apesar de o governo ter mais do que dobrado o número de vagas do sistema penitenciário – de 6,5 mil, em 2003, para 14,5 mil, em 2009 –, as cadeias permanecem inchadas. A fim de evitar novos motins e superlotações, outros estados apostam na gestão compartilhada com a iniciativa privada ou na terceirização via Parceria Público-Privada (PPPs). As PPPs, aliás, são consideradas interessantes pelos governos pois evitam gastos extremos com a construção de presídios. Em geral, a iniciativa privada tem a incum­bên­cia de concluir as penitenciárias e equipá-las e o estado ressarce às empresas quando o presídio começa a operar. "Todo o investimento empregado para construir um complexo penitenciário pode ser aplicado em outras áreas nesse período de obras", explica Carlos Eduardo de Resen­de e Souza, diretor da Unidade Se­­torial PPP Peni­tenciária, da Se­­cretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais. Os contratos mineiros duram 27 anos, e a em­­presa responsável tem 30 meses para concluir as unidades que estão em obras. Até 2011, o Com­plexo Peni­ten­­ciário – com 5 ca­­deias – deve estar funcionando.

A gestão compartilhada, por ou­­tro lado, apresenta outros benefícios. Nesse caso, a iniciativa privada atua em setores administrativos (limpeza, manutenção e hotelaria), en­­quanto o estado já construiu e responde pe­­las questões de segurança. O modelo é usado no estado do Espírito Santo e nas penitenciárias federais de Catanduvas (PR) e de Campo Grande (MS). De acordo com o diretor-geral do Departamento Penitenciário Na­­cional (Depen), Airton Aloisio Mi­­chels, o estado deve ser responsável pela segurança, em qualquer caso. "Os presídios têm regras prevendo a progressão de regime. Só que, para o juiz autorizar, é preciso um laudo assinado por alguém do estado", explica Michels.

Minas Gerais, Espírito Santo e o governo federal não são necessariamente inovadores. No Para­ná, seis cadeias eram administradas pela iniciativa privada, mas foram retomadas pelo governo em 2006 por questões ideológicas. "O governador (Roberto Requião, do PMDB) resolveu, simplesmente, que o Paraná não deveria ter nada terceirizado", afirmou o secretário de Estado da Justiça e da Cidadania (Seju), Jair Ramos Braga, à Revista Veja, em fevereiro do ano passado. No Ceará, irregularidades em contrato também acabaram com a gestão privada. Nos dois casos, as instituições nem sequer lembravam a realidade brasileira. Procurada pela reportagem, a Seju não se manifestou sobre o assunto.

Opiniões

As prisões brasileiras, dizem os especialistas, precisam de mudanças. A gestão compartilhada e as PPPs podem dar início a essa transformação. A Penitenciária In­­dus­trial de Guara­puava recebeu uma das melhores avaliações pelo Minis­tério da Justiça quando terceirizada. Doutor em Direito do Estado pela Universidade Federal do Para­ná (UFPR) e professor do Centro Uni­versitário Curitiba (Uni­­Curi­tiba), Fernando Vernalha Guima­rães é entusiasta das PPPs por três fatores: "É mais econômico; o estado pode se reservar na função de regulador e fiscalizador, o que não consegue fazer atualmente; e a população pode ter acesso ao financiamento do sistema penitenciário", diz.

Professor do UniCuritiba e ex-diretor do Depen, Mauricio Kuehne esclarece que todas as experiências feitas com esses modelos de administração tendem a funcionar. O professor, entretanto, impõe ressalvas. "Não se pode entregar a segurança do estabelecimento à empresa particular", diz. "É, inclusive, uma questão de ordem constitucional, pois a segurança é um dever do estado. Por isso, é preciso existir estrutura do governo dentro de qualquer presídio", acrescenta.

Atualmente, os problemas relacionados às questões penitenciárias afetam praticamente todos os estados. Por isso, Michels afirma que cada unidade deve pensar em soluções criativas para dar conta da demanda de presos e da manutenção das boas condições dos presídios. "Como resolver é uma decisão do governo estadual, mas não vejo qualquer problema nesses modelos de gestão, desde que a segurança seja mantida em poder do estado", avalia.

Terceirização evita a superlotação

Cadeias em convênio com a iniciativa privada nunca estarão superlotadas. Essa é uma das condições impostas em contrato pelas empresas ou pelo governo. O processo diminui a incidência de rebeliões. "Em comparação com o modelo estatal, só oferece vantagens. Além de desonerar o contribuinte, favorece toda a sociedade. Também consegue atender melhor os direitos do próprio preso", avalia Fernando Vernalha Guimarães, doutor em Direito do Estado pela Univer­sidade Federal do Paraná e professor do Centro Universitário Curitiba.

Airton Aloisio Michels, diretor-geral do Depen, afirma que a iniciativa privada tem mais facilidade para oferecer vagas mais adequadas. "Como em muitos dos presídios terceirizados, o número de detentos é até mais baixo do que a capacidade. Por esse motivo, as condições materiais são melhores", diz.

Reincidência era baixa no Paraná

As experiências com a terceirização do serviço no Paraná podem ser positivas. As cadeias poderiam deixar de ser "escolas do crime". Quando terceirizada, o índice de reincidência dos egressos da Penitenciária In­­dustrial de Guara­puava era de 6%, enquanto a média nacional chegava aos 70%. Os dados são de um artigo do dou­tor em Direito Administrativo Fábio Medina Osório e do especialista em Direito Internacional Vinicius Diniz Vizzotto, publicado no site Jus Navigandi.

Os números confrontam argumentos de que as terceirizações ou gestões compartilhadas encarecem o custo do preso. "Os valores são muito relativos. Existem estados em que a diferença da iniciativa e do estado é um pouco maior. Em outros, contudo, os valores são praticamente os mesmos", explica Mauricio Kuehne, professor do UniCuritiba e ex-diretor do Depen. Muitas vezes, os valores maiores compensam, se o índice de reincidência for mais baixo.

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