Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
saúde

Proibição de tachos de cobre pode mudar doces tradicionais de Minas

Utensilio, que faz parte da cultura mineira é usado na fabricação de doces. Anvisa alega que o metal pode fazer mal a saúde

A produção de doces em tachos de cobre é uma tradição em Minas. Há no estado, além de indústrias, restaurantes e outros estabelecimentos comerciais, pessoas que fabricam doces de frutas artesanalmente e seguem tradições seculares. São costumes familiares que podem se perder por causa de uma restrição aos utensílios de cobre. A Vigilância Sanitária Estadual de Minas, baseada em uma resolução (RDC 20 - 22 de março de 2007) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), proibiu o uso de utensílios de cobre na produção alimentícia. Pois, segundo a vigilância, a absorção excessiva do metal provoca desordens neurológicas e psiquiátricas, danos no fígado, nos rins, nervos e ossos e perda de glóbulos vermelhos.

Em Araxá, no Alto Paranaíba, doceiras podem abandonar o ofício. Dona Gasparina, que produz doces de frutas cristalizadas há 32 anos, não vê outra saída. Para ela, "não tem como fazer doces de figo, abacaxi, abóbora, mamão e laranja cristalizadas sem o tacho, pois o inox muda a cor do doce." Os utensílios em aço inox são os exigidos pela Vigilância Sanitária. Para a autoridade sanitária da vigilância estadual, Joana Dalva, "não é o recipiente que vai colorar a fruta, é o método de processamento correto, a tecnologia".

A opinião de Dona Gasparina é compartilhada na capital por Dona Lucinha, 76 anos, cozinheira profissional e proprietária de quatro restaurantes, três de comidas típicas mineiras – dois em Belo Horizonte e um em São Paulo – e um de comida brasileira em São Paulo. Dona Lucinha defende a tradição da cozinha mineira. Ela acredita que o estado tem a "a melhor comida do Brasil". Para ela, a higienização do tacho é fundamental, "mas, se mesmo com essa higienização, o tacho de cobre fizer algum mal, a gente vai ter que buscar outra alternativa". Com isso, diz Dona Lucinha, "a comida mineira perde tradição e qualidade."

No Mercado Central, em Belo Horizonte, não é difícil encontrar lojas que vendem tachos de cobre. Os comerciantes afirmam que a procura é grande. São vendidos tachos para todo o Brasil e também para o exterior. Em uma das lojas, os vasilhames recebem o banho de estanho. Dessa forma, de acordo com a normatização da Anvisa, os utensílios de cobre podem ser usados.

Sobre o uso doméstico, a autoridade sanitária da vigilância estadual, Joana Dalva, diz que se o tacho não tiver o revestimento de estanho, "não é aconselhável ter uma panela para fazer o alimento". Mas Joana acredita que "quem usa sabe como tem que fazer, é uma coisa tradicional". A doceira Dona Gasparina tem tachos de três gerações – herdados da sogra – em sua cozinha. Ela usa sal e vinagre para limpar seus vasilhames. Já Dona Lucinha usa sal e limão capeta.

Indústria

Contrariando a cultura da produção caseira de doces em Minas, as fábricas precisaram se adequar as exigências da vigilância sanitária para conseguir o alvará de funcionamento. Em Araxá, a fábrica Doces Cecília não utiliza mais utensílios de cobre desde a década de 90. Segundo o proprietário, Euber Geraldo Ferreira, sem os tachos de cobre, substituídos por vasilhames de inox, "o produto final mudou". Os doces perdem na coloração, "mas o sabor fica praticamente a mesma coisa."

Para Euber, fica difícil a adequação para as doceiras que produzem de forma artesanal. O custo é alto. Segundo ele, "para estar na norma uma pequena fábrica precisa investir no mínimo de R$ 80 mil a R$ 100 mil". O proprietário explica que um único tacho de inox custa de R$ 9 a R$ 12 mil.

Dona Gasparina, de Araxá, faz os doces de frutas cristalizadas em sua própria casa e vende na porta e por encomenda. Se proibirem o cobre terá de parar de produzir e fechar sua fábrica artesanal, um trabalho de 32 anos. Como explicou o empresário, ela disse que "não tem condição de se adequar".

Limpeza do tacho de cobre

Dona Lucinha recebeu a reportagem do G1 em um de seus restaurantes. Natural do Serro, região central de Minas, ela fez uma demonstração de como são usados os tachos de cobre nas fazendas de Minas Gerais. Dona Lucinha ensinou a fazer a higienização do tacho. E preparou um doce de leite, da forma que é feito pelas cozinheiras do estado.

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.