
Um projeto de lei que tramita no Congresso Nacional coloca em xeque a autoridade de uma agência reguladora. A Proposta n.º 2.431/11, do deputado federal Felipe Bornier (PSD-RJ), permite que medicamentos emagrecedores à base de anfetamina voltem a ser comercializados no país mesmo após terem sido banidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2011. O projeto já foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara, mas ainda precisa ser apreciado em plenário pelos deputados e depois remetido ao Senado.
Na época da proibição, a Anvisa decidiu pelo banimento dos inibidores de apetite femproporex, anfepramona e mazindol por considerar que seus riscos eram maiores que seus benefícios. A decisão foi contrária à opinião de boa parte das comunidades médica e farmacêutica, que utilizavam os medicamentos para tratar casos severos de obesidade. A Câmara dos Deputados, que não tem corpo técnico como o da Anvisa para analisar os prós e contras dos medicamentos, não leva em consideração os argumentos da agência para sua proibição, como o fato de que os remédios causam dependência.
Segundo o relator do projeto na CCJ, o deputado Sergio Zveiter (PSD-RJ), o projeto é constitucional e, em sua opinião, válido. "A obesidade é um problema muito grave no Brasil e esses remédios, segundo pareceres da comunidade médica, são eficazes no combate a esse mal", atesta.
Atualmente, apenas um inibidor de apetite não é proibido pela Anvisa: a sibutramina, que não é um medicamento anfetamínico e que causa menos riscos aos pacientes. Apesar disso, o emagrecedor é proibido pela União Europeia, que questiona a sua eficácia. Uma pesquisa da Agência Europeia de Medicamentos concluiu que 70% dos pacientes medicados com a sibutramina não perderam peso.
Em 2011, quando os anfetamínicos foram proibidos, Curitiba era a maior consumidora de inibidores de apetite do sul do Brasil, e a terceira do país, segundo pesquisa da própria Anvisa com dados do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados.
Polêmica, proibição divide opiniões
O banimento dos anfetamínicos no país é um assunto que ainda hoje divide a opinião de médicos e farmacêuticos. Para a presidente do Conselho Regional de Farmácia do Paraná, Marisol Domingues Muro, a decisão da Anvisa é acertada. "Temos estudos que mostram o risco de dependência química, além de inúmeras complicações cardíacas, vasculares e psicológicas. Embora algumas pessoas possam se beneficiar de seu uso, a falta de comprovação de eficácia e os riscos dos medicamentos já são suficientes para apoiarmos a decisão da Anvisa", afirma.
Já Mário Kedhi Carra, presidente do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), critica a proibição dos medicamentos. "A sibutramina é a única opção hoje para combater um mal que atinge 51% dos brasileiros e é um medicamento relativamente caro se comparado com os outros, que foram proibidos. Isso impede pessoas de menor poder aquisitivo de adquirir um tratamento de qualidade", explica.
Ele concorda que as drogas trazem riscos e reitera a necessidade de um acompanhamento médico adequado. "Todo medicamento tem efeitos colaterais e exatamente por isso os pacientes devem ser monitorados. Temos remédios para diabete que causam pancreatite, remédios para pressão que causam arritmia e antidepressivos que causam dependência, todos liberados pela Anvisa. Por que só as pessoas obesas precisam pagar o pato", questiona.
Procurada pela reportagem, a Anvisa informou, via assessoria de imprensa, que não se manifestaria sobre o projeto da Câmara dos Deputados. Uma nota oficial emitida declara apenas que a agência se valeu de pareceres técnicos rigorosos para decidir pela proibição em 2011 e que nada mudou na avaliação do órgão.



