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Efeito estufa

Protocolo de Kyoto é renovado com ceticismo

Regras mudam pouco. China e EUA, os maiores poluidores, não seguirão metas antes de 2020, e emergentes ainda não precisam aderir

Protocolo propunha que países industrializados reduzissem em 5,2% as emissões de gases até 2012. Passados 15 anos, nenhum país cumpriu a meta | Ina Fassbender/Reuters
Protocolo propunha que países industrializados reduzissem em 5,2% as emissões de gases até 2012. Passados 15 anos, nenhum país cumpriu a meta (Foto: Ina Fassbender/Reuters)

"Histórica". Essa foi a expressão usada por enviados de mais de 190 países à Conferência do Clima da ONU (COP-17) em Durban, na África do Sul, para definir a decisão tomada pelas partes no último domingo de prorrogar o Protocolo de Kyoto até 2017. Na prática, no entanto, estender o prazo de validade do documento, de acordo com especialistas, foi uma estratégia para ganhar tempo e não admitir que o acordo não cumpriu sua função.

Quando foi finalizado, em 1997, o protocolo propunha que os países industrializados reduzissem até 2012 os níveis de emissão de gases de efeito estufa (GEE) em seus territórios, chegando a um nível 5,2% menor do que aquele emitido em 1990. Passados 15 anos, nenhum país conseguiu cumprir a meta, o que faz cientistas e ambientalistas se perguntarem de que vale a renovação de um acordo que não foi respeitado até agora.

A recusa dos EUA em ratificar o protocolo, segundo especialistas, foi o que até agora tem sepultado qualquer esperança de que o documento cumpra seu fim. Em 1997, os norte-americanos eram os maiores poluidores do planeta, responsáveis por quase 50% das emissões. Hoje, perdem para a China, mas ainda respondem por 25% do total. Em Durban, o país aceitou negociar metas de redução, mas não antes de 2020, o que causa baixas, como no caso de Canadá, Rússia e Japão, que não vão renovar o compromisso.

"Os EUA pautam a ação dos demais países. Sem eles, fica praticamente impossível cumprir o acordo", avalia a deputada federal e presidente do Partido Verde no Paraná Rosane Ferreira. Além da questão econômica – o Senado americano se recusa a ratificar o protocolo pelas restrições impostas à indústria –, grande parte dos senadores acredita que o aquecimento global é um fenômeno natural, não fruto da ação do homem.

Emergentes

Outra decepção que se esconde por trás da euforia dos delegados em Durban é o fato de que, pelo menos até 2017, os países emergentes continuam não sendo obrigados a cumprir as metas. Esse é outro passo importante para a credibilidade e eficácia do acordo, na opinião do físico e professor da Universidade de São Paulo (USP) José Goldemberg, ex-secretário nacional de Ciência e Tecnologia.

Ele afirma que os países atualmente "se refugiam" atrás de uma resolução de 20 anos que já não traduz a realidade. "Um exemplo claro [da defasagem] é a China. Em 1992 ela não emitia quase nada, e hoje é o maior país emissor do mundo." O Brasil, que não se encontrava entre os 40 maiores poluidores nos anos 90, hoje aparece em 12.º lugar no ranking de emissores de GEE.

Para Goldemberg, o Brasil não possui justificativas plausíveis para não aderir. Ele cita como exemplo o fato de São Paulo já ter dado um passo nesse sentido, com a aprovação de uma lei que determina que, até 2020, o estado precisa reduzir suas emissões a um nível 20% menor do que era emitido em 2005. O grande obstáculo é a falta de rigidez em relação ao desmatamento, responsável por 78% das emissões de gás carbônico na atmosfera do país, por meio de queimadas na mata – e alvo de crítica dos países industrializados.

Novo Código Florestal pode prejudicar esforços

A aprovação do novo Código Florestal é vista com ressalva por quem defende mais rígidez por parte do Protocolo de Kyoto. O professor da USP José Goldem­berg afirma que caso seja acatada pela presidente Dilma Rousseff, a nova lei irá impactar negativamente nos índices brasileiros de emissão de gases de efeito estufa (GEE) e até mesmo comprometer a ajuda externa para financiamento de projetos sustentáveis.

O físico lembra que o desmatamento da Floresta Amazônica é hoje o fator que mais contribui para a emissão dos GEE na atmosfera, e que um dos pontos defendidos pelo novo código, a anistia a quem desmatou até junho de 2008, fará com que a vegetação derrubada não seja recuperada. Ela também pode influenciar futuros desmates. "Se o meu vizinho desmata e nada acontece, eu vou desmatar também, acreditando que daqui a 10 anos eu irei obter o perdão", analisa.

A Floresta Amazônica é hoje um dos maiores sumidouros de CO² do planeta – as árvores, no processo de fotossíntese, retiram o gás da atmosfera e "devolvem" no ar o gás oxigênio, contribuindo para minimizar os efeitos do aquecimento global. O fato de o Brasil não avançar no combate ao desmatamento é, inclusive, motivo de críticas por parte das nações industrializadas que precisam cumprir as metas do protocolo.

A deputada pelo Partido Verde Rosane Ferreira afirma que o novo código é "o calcanhar de Aquiles" do país e pode esvaziar o discurso brasileiro na Confe­rência da ONU Rio+20 caso seja aprovado. Ela acredita, no entanto, que a presidente Dilma Rous­seff vetará a nova lei. "Acom­panhei a luta da Marina Silva (ex-ministra do Meio Ambiente no governo Lula) com a Dilma (então ministra de Minas e Energia) e tinha muitas reservas em relação a ela. Recentemente estive com ela [Dilma] e percebi que ela é uma pessoa muito sensível a essa questão. Ela está ciente da sua responsabilidade."

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