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Entrevista

Qual o destino de bebês abandonados?

Maria Lúcia de Paula Espíndola, juíza da 2.ª Vara da Infância e Juventude de Curitiba

 | Henry Milleo/Gazeta do Povo
(Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo)

Entre 2010 e julho deste ano, 14 recém-nascidos foram abandonados em Curitiba – oito em maternidades e seis em locais públicos –, segundo registros dos nove conselhos tutelares da cidade. São casos como o do bebê encontrado atrás de um vaso sanitário no Passeio Público, no último dia 28. Todas essas crianças, num primeiro momento, foram encaminhadas para instituições de acolhimento. Mas o que aconteceu depois disso?

O Juizado da Infância e Juventude não sabe precisar qual foi o destino de cada um dos bebês, mas a juíza Maria Lúcia de Paula Espíndola, da 2.ª Vara da Infância e Juventude, diz que dificilmente eles regressam para a família de origem, sendo mais comuns as adoções. Para o bem da criança e para evitar problemas judiciais, ela recomenda que as mães que não quiserem ficar com seus filhos procurem o Juizado.

Em contato com os conselhos tutelares, soubemos que 14 bebês foram abandonados em Curitiba desde 2010. O que aconteceu com cada uma dessas crianças? Quantas voltaram para a família biológica e quantas foram adotadas?

Primeiro, quero falar àquelas mães que entendem não reunir condições, por qualquer motivo, para cuidar de um bebê. Gostaria de dizer a elas que não abandonem seus filhos. A Vara da Infância e da Juventude está aqui para acolher essa mãe, ajudá-la a superar dificuldades e, se for esta a melhor solução, encaminhar o futuro neonato para adoção. Sem julgamentos pessoais nem recriminações. Essas mães não precisam ter medo. Não é preciso abandonar o filho. Não é errado não ter condições para cuidar de uma criança. É um ato de amor buscar ajuda.

Neste sentido, o artigo 13, parágrafo único, do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a possibilidade de gestantes ou mães manifestarem interesse em entregar seus filhos à adoção. Felizmente, os casos de abandono de neonatos são raros – mas ocorrem. Os bebês que são encontrados em abandono são encaminhados pela Vara da Infância, em um primeiro momento, para uma casa-lar, onde são acolhidos institucionalmente, recebendo todos os cuidados necessários para assegurar sua integridade física e emocional. Depois disso, será avaliada a situação pessoal dos genitores e da família e promovidas medidas para que a criança volte ao ambiente familiar.

Caso inviável este retorno, o que geralmente é o caso, os pais sofrerão uma ação de destituição do poder familiar e, se procedente a sentença, a criança será declarada em condições jurídicas de ser adotada. Por fim, é convocada uma pessoa previamente habilitada no cadastro para adotá-la. Assim, todos os neonatos que foram encontrados em situação de abandono em Curitiba tiveram o devido encaminhamento, na forma já referida. Não podemos precisar, porém, quantas crianças foram reintegradas à família biológica ou quantas foram inseridas em família substituta, à vista da ausência de registro específico neste sentido.

O que acontece quando os pais são identificados?

Antes, é preciso verificar a situação de vulnerabilidade que leva uma mãe à atitude extrema de deixar seu filho recém-nascido ao desamparo. Claro que a ninguém é dado o direito de abandonar um filho. Isso é crime previsto no Código Penal. Por isso, a importância das mães ou gestantes sempre procurarem a Vara da Infância e da Juventude caso entendam não poder cuidar de seu filho, para que não pratiquem o tipo penal de abandono de incapaz [artigo 133]. Em regra, é feito um estudo pela equipe interprofissional do juízo, onde será avaliada a capacidade dos genitores para o exercício do poder familiar.

Quais são as punições previstas aos pais que abandonam seus filhos?

O abandono é causa legal de destituição do poder familiar, nos termos do artigo 1.638, inciso II, do Código Civil, e artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Assim, sujeitam-se também a tal disposição os pais que abandonam seus filhos. Todavia, a Vara da Infância e da Juventude vai avaliar os motivos que levaram ao abandono do filho, bem como aquilatar a possibilidade da reintegração à família de origem e, de forma residual, será proposta a ação de destituição do poder familiar e encaminhada a criança para adoção.

O Brasil tem políticas eficientes de prevenção ao abandono de bebês e de crianças maiores?

Certamente, é necessária uma maior atenção para essa área. O Judiciário faz a sua parte. As Varas da Infância e da Juventude estão intervindo de forma cada vez mais eficiente, orientando, auxiliando e promovendo socialmente as mães e gestantes em tais condições. Mas é preciso muito mais. E esse dever não é só do Estado, também deve ser partilhado com a sociedade em geral, com a comunidade e com a família, como prevê o artigo 4.º do ECA.

Como estão os processos de destituição familiar? Eles ganharam agilidade com a nova lei? O número de crianças adotadas aumentou?

O Estatuto da Criança e do Adolescente foi alterado com a Lei n.º 12.010/2009 e as ações de destituição do poder familiar passaram a ter o prazo máximo de 120 dias para serem concluídas. Além disso, vale lembrar que o prazo máximo de acolhimento da criança ou adolescente passou a ser de dois anos. Apenas em casos em que haja justificativa plausível, tais prazos podem ser excedidos. O Conselho Nacional de Justiça vem fiscalizando e a Justiça da Infância tem se esforçado para que a passagem da criança ou do adolescente por uma instituição de acolhimento seja breve e transitória.

Nesse sentido, o objetivo da 2.ª Vara da Infância e da Juventude de Curitiba é promover uma prestação jurisdicional célere e segura às crianças e adolescentes. O reflexo disso é a diminuição do tempo de acolhimento da criança e o aumento gradual do número de adoções em Curitiba ao longo dos últimos anos. Em 2010, como exemplo, tivemos 78 adoções em Curitiba. Já no ano passado, foram 120.

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