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Educação

Recursos não são garantia de bom ensino

Pesquisa mostra que investir grandes somas não eleva necessariamente a qualidade. Gestão, valorização de docentes e infraestrutura também pesam

Sala da Escola Municipal Presidente Pedrosa, a mais bem avaliada de Curitiba: principal segredo é a dedicação dos docentes | Aniele Nascimento / Gazeta do Povo
Sala da Escola Municipal Presidente Pedrosa, a mais bem avaliada de Curitiba: principal segredo é a dedicação dos docentes (Foto: Aniele Nascimento / Gazeta do Povo)
Veja o investimento anual em educação por aluno |

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Veja o investimento anual em educação por aluno

Investir um grande volume de recursos em educação não resulta necessariamente em qualidade. É o que mostra um levantamento feito pela Gazeta do Povo com base em dados do movimento Todos pela Educação. Enquanto Santa Catarina gasta R$ 2.052 anuais por aluno e tem a quarta melhor colocação no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o Amapá faz o terceiro maior investimento por estudante no país, com R$ 3.729, mas fica entre os últimos colocados no quesito qualidade. Os resultados mostram que dinheiro é condição necessária, mas não suficiente para melhor proficiência dos alunos.

No ranking do Ideb há uma faixa de estados que consegue bons resultados com investimentos medianos. É o caso da Região Sul. O Paraná, por exemplo, é o segundo colocado no indicador das séries iniciais, com 5,4, mas gasta com educação apenas R$ 2.301 anuais por aluno. A explicação para a boa classificação é que nesses locais as redes municipais e estaduais de ensino estão mais consolidadas e o índice de pobreza da população é menor. "Os dados demonstram que o Brasil precisa tanto ampliar os investimentos quanto otimizá-los e garantir qualidade na gestão", diz o conselheiro do Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos.

No fim da lista, tanto dos recursos quanto da qualidade, estão estados das regiões Norte e Nordeste. A Bahia tem a segunda pior nota no Ideb e destina a menor verba para educação. Além disso, há casos que fogem da relação entre investimento e proficiência. No Acre, por exemplo, o investimento é 42% maior do que no Paraná e a nota é de apenas 4,3. Distrito Federal e Minas Gerais têm a mesma média, 5,6, mas os mineiros gastam a metade dos brasilienses.

Para especialistas, além do volume de recursos a discussão sobre a qualidade da educação envolve a qualidade dos investimentos, boa gestão, valorização dos docentes e infraestrutura. "É inadmissível que em pleno século 21 ainda haja indicações políticas para gestão da educação. Isso acontece em função do grande volume de recursos disponíveis", argumenta Mozart Neves Ramos.

A pesquisadora Fernanda Becker, autora de uma dissertação de mestrado da Fundação Getulio Vargas (FGV) sobre o assunto, lembra que há também questões subjetivas, como participação da família na educação e relação entre alunos e professores. "Não há uma fórmula matemática."

Longo prazo

Outra questão importante é que o volume de investimentos pode ter impacto somente a médio e longo prazo. É o caso do Acre, que entre 2005 e 2009 teve um crescimento de 26% no Ideb, passando de 3,4 para 4,3. No Distrito Federal a situação é semelhante e a rede consegue garantir o melhor salário para professores do país. "Melhor remuneração docente pode atrair, no futuro, os melhores estudantes, o que causa impacto direto na qualidade", diz César Callegari, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE).

No caso das regiões Norte e Nordeste, as redes de ensino precisam lidar com questões estruturais e com o grande porcentual de pobreza. Em estados com baixa densidade populacional, como na Região Norte, a relação custo-benefício é prejudicada pelo baixo volume de matrículas e pelo custo do transporte de professores e alunos. Há também mais gastos com infraestrutura, como construção de escolas, algo que já está praticamente resolvido no Sul. "A Região Sul tem histórico de pais com mais capital cultural e educação, o que gera impacto na leitura de toda a família, por exemplo", afirma César Callegari.

Já o Amapá é o terceiro maior investidor no país, mas representa a má gestão da educação. Em 2010, a operação Mãos Limpas, da Polícia Federal, descobriu desvio de recursos e contratos super-faturados. Em um dos casos analisados, o governo do estado alugava computadores de terceiros por R$ 3 mil mensais.

A Secretária de Estado da Educação do Paraná (Seed) foi procurada para comentar os dados, mas não retornou o contato.

IDH alto tem relação com bons índices educacionais

O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) também tem relação direta com a qualidade da educação. Em geral, os estados com o maior índice têm melhores notas no Índice de Desen­volvimento da Educação Básica (Ideb). O IDH é usado em todo o mundo para medir a qualidade de vida das pessoas e abrange indicadores de expectativa de vida ao nascer, taxa de alfabetização e escolarização e renda per capita.

No Brasil o IDH é de 0,794. Quanto mais próximo de 1, mais alta a qualidade de vida do país. O distrito federal tem o melhor IDH do país, com 0,874, e é o mais bem avaliado na área educacional. Na outra ponta, Alagoas é o estado com pior avaliação nos dois quesitos. O Paraná aparece em sexto lugar nacional no ranking da qualidade de vida, mas é melhor colocado no Ideb.

Os países com as melhores colocações nessa categoria despontam em avaliações globais como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa). Lá, a relação entre qualidade e recursos investidos na educação é direta, já que são sistemas consolidados, com décadas de bons investimentos. Por isso, o que precisa ser corrigido é mais facilmente identificado e sanado.

Ideb é frágil como indicador, diz especialista

O coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, afirma que o Índice de Desenvolvimento da Edu­ca­ção Básica (Ideb) é um indicador frágil para avaliar qualidade porque só abrange as disciplinas de Português e Matemática e, além de não contemplar outras áreas, não consegue medir o aprendizado de valor, por exemplo. Outro ponto questionado pelo especialista é que há desigualdade na distribuição de re­­cursos. As capitais, como Curi­tiba, quase sempre têm maiores recursos que o interior.

Em 2007, o movimento coordenado por ele lançou uma publicação chamada Custo Qualidade Aluno Inicial (CAQi), que estabelece parâmetros mínimos para as escolas. Em maio de 2010 o Conselho Nacional de Educação aprovou uma resolução apoiando o CAQi, que deve ser implementado pelo governo federal.

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