
O Brasil não é um país preparado para prevenir catástrofes. A constatação se baseia em um levantamento do governo federal que descobriu haver 735 municípios, em nove estados, com pelo menos cinco áreas de risco de deslizamento. Destas cidades, apenas 25 dispõem de cartas geotécnicas de morros e encostas. Também conhecida como carta de risco, trata-se de uma análise técnica do solo e das rochas que determina se um lugar é seguro ou não.Das 735 listadas, 39 são paranaenses. Antonina, Paranaguá e Morretes, cidades do litoral paranaense que sofreram com desastres naturais em março deste ano, estão nessa lista. Ao todo, os deslizamentos e inundações mataram quatro pessoas, deixaram 10 mil desalojadas, 3 mil desabrigadas e causaram um prejuízo de pelo menos R$ 90 milhões. Estradas foram destruídas e faltou água, comida e luz para a população.
O diretor técnico da Mineração do Paraná S/A (Mineropar), Rogério da Silva Felipe, explica que no estado muito pouco foi feito em relação aos mapeamentos geológicos. Segundo ele, apenas dez cidades paranaenses têm carta de risco. Responsável pelo mapeamento geológico dos municípios litorâneos atingidos, Felipe afirma que a situação deve mudar com a mudança de governo. "Daqui para frente será uma premissa da Mineropar fazer estes levantamentos", diz.
A professora do Núcleo de Pesquisas sobre Desastres da Universidade Estadual Paulista, Iara Regina Nocentini André, explica que uma lei, aprovada no ano passado, obriga que todas as cidades tenham uma carta geotécnica. "Mas não são cartas de simples elaboração. Elas demandam tempo e pessoas especializadas", explica.
Para o geólogo Renato Eugênio de Lima, diretor do Centro de Apoio Científico em Desastres da Universidade Federal do Paraná, o levantamento do governo é parcial e o número é, provavelmente, muito maior que o apresentado. "O Brasil não tem um levantamento completo, sistemático, permanente. E os estudos de risco geológico são essenciais, são o principal instrumento de segurança", diz.
A coordenadora de riscos de deslizamentos do Centro de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais do Ministério da Ciência e Tecnologia, Noris Costa Diniz, afirma que é possível prever deslizamentos, mas para isso são necessários estudos, equipamentos e a criação de fórmulas de cálculo que considerem o provável volume de águas das chuvas, as condições topográficas do terreno e as características do solo. "Só assim poderemos prever os acontecimentos", diz.
60% das mortes ocorrem em deslizamentos
Soterramentos são a maior causa de morte por desastres naturais no país. De acordo com informações do Ministério da Ciência e Tecnologia, seis em cada dez óbitos são por deslizamento de terra. No Brasil, de 2008 a 2011, cerca de 2,5 mil pessoas morreram soterradas.
A falta de estudos geológicos e do mapeamento das áreas de risco não são os únicos problemas. Segundo o levantamento do governo federal, os municípios não dispõem de equipamentos, como o piezômetro (que mede o aumento do volume de água no solo), que pode ajudar a prevenir desastres, como o que aconteceu no início deste ano na região serrana do Rio de Janeiro, quando 900 pessoas morreram soterradas.
Para evitar que as estatísticas de óbitos aumentem até o fim do ano, o Sistema de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais deverá estar funcionando. Segundo o ministério, 20 cidades brasileiras vão receber equipamentos que poderão enviar informações sobre catástrofes com horas de antecedência. Atualmente, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) é responsável por enviar alertas para a Defesa Civil Nacional.
De acordo com o ministério, os primeiros testes acontecerão no Nordeste. A previsão é que o sistema esteja em pleno funcionamento até 2014. O Centro Nacional de Prevenção, responsável por gerir todas as informações coletadas por radares, satélites, pluviômetros, entre outros equipamentos, será implantado em Cachoeira Paulista (SP).
Segundo Noris Costa Diniz, que irá coordenar o novo Centro de Prevenção, o monitoramento vai alertar as autoridades com antecedência de quando e onde poderá acontecer uma catástrofe. "A ideia é prever a ocorrência de chuvas intensas que possam provocar enxurradas, inundações e desabamentos", diz. Ela conta que o trabalho será feito em conjunto com vários órgãos, como a Secretaria Nacional de Defesa Civil.
Na opinião da professora Iara Regina Nocentini, a formação de um sistema de prevenção é importante. "É claro que o sistema sofrerá ajustes ao longo do tempo, mas é um começo que pode evitar mortes no futuro", diz.




