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Arquitetura

Salve as casas de araucária

Livro faz um registro das principais técnicas construtivas usadas para edificar residências com o pinheiro símbolo do Paraná, em Curitiba

As casas singulares, com exemplares únicos no Paraná, como a que abriga a sede do Iphan, foram realocadas do terreno original para serem conservadas | Fotos: Pedro Serápio/ Gazeta do Povo
As casas singulares, com exemplares únicos no Paraná, como a que abriga a sede do Iphan, foram realocadas do terreno original para serem conservadas (Foto: Fotos: Pedro Serápio/ Gazeta do Povo)

Timidamente, entre os prédios robustos de Curitiba, ainda sobrevive uma arquitetura que nasceu do símbolo do Paraná. As casas de madeira feitas de araucária se destacaram na paisagem urbana da capital paranaense como em ne­­nhuma outra do Sul do Brasil, prin­­­cipalmente no final do século 19 e no início do 20. Eram numerosas e com um estilo característico, ora marcado pela imigração, ora pela técnica construtiva de nível elevado.Curioso é notar que Curitiba teve mais casas com lambrequim do que a média nacional porque o código de posturas da cidade, de 1919, só permitia a construção de residências de madeira com esse adorno. "Provavelmente exigiram isso para não incentivar a construção de mais unidades de madeira e, assim, a cidade passaria a ter mais casas de alvenaria", afirma o arquiteto Key Imaguire. Ele e outros três arquitetos – Marialba Imaguire, Fábio Domingos Batista e Andréa Berriel – estão lançando um livro com três volumes estilo box, A casa de Araucária: Arquitetura da madeira em Curitiba. A ideia é registrar um estilo arquitetônico que as futuras gerações provavelmente não conhecerão.

Assim como a mata de araucária, que tem apenas 1,2% de sua cobertura original no estado, as casas de madeira que se originaram dela já são difíceis de catalogar. Se hoje há alguma em Curitiba, provavelmente no dia seguinte ela será desmontada para dar lugar a mais um prédio. "Atualmente não existe mais quem saiba fazer essas casas, o conhecimento da técnica praticamente acabou. A ideia de lançar o livro é fazer com que as pessoas se interessem novamente pelo assunto e preservem o que for possível", afirma Key.

Andréa Berriel sugere que as pessoas resgatem a madeira para a construção e dá dicas de alguns usos, como o tijolo de madeira. Já Fábio lembra que a árvore amadurece e pode ser colhida sem agressão ao meio ambiente, como em outros países. "Seria a madeira de floresta plantada, onde ela se recompõe e poderia ser usada infinitamente."

Decadência

O desmatamento da floresta de araucária contribuiu para o fim das casas de madeira. Mas não foi apenas isso. "Houve um pe­­ríodo que as pessoas começaram a construir a fachada da casa de alvenaria para esconder a casa de ma­­deira, por uma questão de status", explica Marialba. Basta lem­­brar que as casas de madeira, antigamente, eram construídas por imigrantes. Como não tinham dinheiro, levantaram a residência com o material disponível na natureza. Acabou virando símbolo de gente pobre.

E, apesar de o grupo de arquitetos ter mapeado as tipologias existentes, que são cinco, e até os recursos decorativos criados muitas vezes para so­­lucionar um problema funcional, Key comenta que os livros são apenas um início de um trabalho de preservação do patrimônio arquitetônico. "Há técnicas sobre as quais até então eu não ti­­nha ouvido falar", diz. Uma dessas técnicas foi desenvolvida por japoneses que moravam no Pará. Eles construíram casas de madeira com um encaixe tão perfeito que a edificação suportaria até terremoto.

Austríaco "maquiou" residências

As casas de madeira até hoje le­­vam a má fama de que são residências de gente pobre. Por causa disso, por volta dos anos 70, uma técnica chamada erkulite acabou mas­­­­­­­­carando essas residências, que passaram a receber uma placa e reboco por fora, para ficarem co­­mo casas de alvenaria. Era mais fácil adotar o erkulite do que construir uma nova casa com tijolos.

A ideia foi introduzida em Curi­­tiba pelo austríaco Peter Petschel. Ele trouxe uma chapa de fibra mineralizada de madeira que era usada para isolamento térmico. "Ele adaptou essas chapas para revestir as casas e depois passar o reboco", afirma o arquiteto Fábio Domingos Batista. Calcula-se que, em média, 36 casas por mês foram maquiadas. Peter contabilizou 20 mil casas que receberam a técnica.

"Quando comecei a fazer a pesquisa, saía pela rua observando quais casas poderiam ser revestidas. Percebi que havia casas idênticas, uma ao lado da outra, em que uma era de madeira e a outra parecia de alvenaria. Então descobri qual era a que tinha erkulite", afirma Batista.

Serviço:

A coleção de livros A casa de Araucária: arquitetura da madeira em Curitiba tem o segundo lançamento na próxima sexta-feira, dia 13/05, às 19 horas, no Farol do Saber Gibran Khalil Gibran, em frente ao Passeio Público.

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