
Uma promessa do governo do Paraná, não cumprida, foi a responsável por gerar um grave conflito de terras no interior do estado, no final da década de 40 e início de 50. O episódio ficou conhecido como a guerrilha de Porecatu. De um lado posseiros de terra e o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e, do outro, fazendeiros, as polícias do governo do Paraná e de São Paulo. Intermediando o conflito: o governo estadual. O assunto não consta em livros didáticos de escolas, mas Porecatu virou tabu e até hoje não se sabe, com certeza, qual o saldo da guerrilha nos cemitérios.
A história começa com uma política estadual de ocupação territorial do Oeste do Paraná, região formada, então, essencialmente por florestas. O interventor Manoel Ribas se inspirou numa política norte-americana do ex-presidente Abraham Lincoln, o Homestead Act, que incentivava a ocupação territorial norte-americana. A regra era que as famílias que cumprissem com o trato de desenvolver o oeste americano, receberiam, após seis anos, o título de propriedade de terra.
Ribas aplicou as mesmas regras ao povo do Paraná, já que as terras a Oeste pertenciam ao estado e estavam improdutivas. Sabendo da notícia, diversas famílias paranaenses e outras de São Paulo e Minas Gerais marcharam para o Oeste rumo a uma nova vida. O problema é que Ribas saiu do poder, e no lugar dele entrou Moisés Lupion, que decidiou não dar continuidade à política.
As famílias que acreditaram em Ribas, haviam derrubado floresta, construído chiqueiros, feito plantações, mas nunca viram o prometido título da propriedade. No início eram cerca de 300 pessoas, mas por volta de 1950 já chegavam a 3 mil. Para complicar ainda mais, o novo governador Lupion decidiu doar e vender as terras para conhecidos fazendeiros de São Paulo. "Os posseiros entraram com diversos pedidos de posse de terra e nunca receberam uma resposta do governo", explica o jornalista Marcelo Oikawa, que acaba de lançar o livro Porecatu: a guerrilha que os comunistas esqueceram.
A política de Ribas morreu e os ânimos se acirraram. Um dos primeiros cafeicultores a comprar terras onde estavam os posseiros foi Ricardo Lunardelli. Ele adquiriu uma grande gleba, fez o loteamento e vendeu a terceiros com um contrato em que constava a entrega das terras "livre de intrusos." "O problema é que estes proprietários descobriram que os lotes estavam ocupados e começaram a perseguir esta gente, usando até a polícia", explica Oikawa. A situação fica tão grave que, em 1944, as famílias fundam as primeiras duas associações de lavradores do Brasil. Os posseiros se armam e a guerrilha de Porecatu começa, durando cerca de sete anos.
Guerrilha tinha envolvimento do PCB
Durante a guerrilha de Porecatu, as famílias de posseiros, enquanto resistiam às novas ocupações dos fazendeiros, contatavam o governo e advogados para tentar conseguir o título de propriedade. Sem sucesso, resolveram apelar ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), que decidiu ajudar.
O próprio PCB indicou dirigentes, com experiência em guerrilhas, para ensinar os camponeses a lutar e se defender. O partido, na época, porém, havia caído na ilegalidade. "O partido tentou voltar ao poder por via eleitoral e não conseguiu. Não havia outro meio, senão a revolução armada", opina o jornalista Marcelo Oikawa, que pesquisou o tema. Para ele, a Guerrilha de Porecatu seria uma experiência do PCB para tentar uma luta armada brasileira.
Quando o governador Moisés Lupion saiu do poder e no lugar dele entrou Bento Munhoz, em 1951, Porecatu estava no auge do conflito. Munhoz tentou uma negociação pacífica com os posseiros. Uma das alternativas propostas era o reassentamento. "Os posseiros estavam cansados e querendo ir embora, por isso muitos tenderam a aceitar a negociação. O problema é que o PCB, naquela altura, não queria acordo e proibiu as famílias de concordar", explica Oikawa.
Diante do impasse, o governo decidiu organizar o Cerco de Porecatu, mobilizando a polícia do Paraná, de São Paulo e até a força aérea e o batalhão de fronteira de Foz do Iguaçu. Na madrugada do dia 17 de julho de 1951, os policiais invadiram a região controlada pelos resistentes e também a casa de alguns dirigentes do PCB em Londrina. As fronteiras de Porecatu foram cercadas. Um dos dirigentes, que acabou preso, delatou como era a organização dos camponeses.
A polícia foi atrás dos posseiros, mas eles já haviam feito uma rota de fuga sentido Maringá até então desconhecida. Os posseiros conseguiram fugir e nunca foram capturados. "Eles foram julgados à revelia e não cumpriram a pena que variava de sete a 14 anos", diz Oikawa.




