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Sansão, o bom leitor que doou 7 mil livros

Maior doador da Biblioteca Pública do Paraná, Sansão José Loureiro ensina algumas lições sobre o que a literatura pode fazer por você

 | Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
(Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo)

É assim há mais de 30 anos: de tempos em tempos, Sansão José Loureiro, 82 anos, reúne os últimos exemplares lidos e ruma em direção à Biblioteca Pública do Paraná (BPP) para que as obras tenham o mesmo destino dos mais de sete mil livros em cujas contracapas também constam sua assinatura, fazendo dele o maior doador da instituição.

O ritual é revelador de uma relação analógica com os livros que nem mesmo as facilidades da internet, de downloads e das bibliotecas virtuais conseguiram abalar – fiel aos tradicionais, feitos de papel e tinta, o ex-professor universitário e juiz aposentado tem convicção de que o livro deve ser lido, grifado, cheirado e sentido. Ele faz isso há 75 anos.

Testemunha do surgimento de gerações ansiosas e desconcentradas, sujeitas que estão a um fluxo quase ininterrupto de informação (muitas delas inúteis, diga-se), Sansão lamenta que os mais jovens não consigam se concentrar o suficiente para – pasmem – simplesmente sentar, relaxar e ler. “Quando o livro é bom, você resiste ao sono e ao cansaço e encontra espaços na rotina para ler. Você cria as condições para ler, mas tem que querer.”

Em tempos de baixa concentração, de informação à jato e fragmentada, fica o exemplo da força de Sansão.

Sem solidão

A primeira lição desse senhor simpático com um quê de Carlos Drummond de Andrade, seu conterrâneo, é de que ninguém é solitário quando acompanhado de um bom livro.

Veja quais são os títulos preferidos dele

“O livro cria esses vínculos todos: seu com o autor; com um universo de personagens e ideias; com pessoas que compartilham o gosto por uma mesma obra. Eu gosto de marcar o livro com lápis e régua, porque assim marco a leitura que fiz daquela obra, naquele momento. O próximo leitor pode apagar se quiser, ou pode orientar a leitura pelas marcas do leitor anterior. É uma forma de diálogo. De um jeito ou de outro, quem lê não sente solidão”, explica.

Livros resolvem problemas

O apreço pelas letras pode ser atribuído ao fato de que a literatura sempre teve uma função na vida de Sansão: quis ser magistrado, dedicou-se à bibliografia especializada; quis ser economista, pôs-se a ler história e teorias econômicas; quis ser cineasta, buscou livros que lhe ensinassem tudo o que pudesse aprender sobre o ofício. Os romances, as biografias e as memórias também foram essenciais para o exercício constante de compreensão de si mesmo e empatia pelo outro.

A literatura foi, enfim, a via através da qual Sansão aprendeu, trabalhou, resolveu problemas, procurou entender o mundo e descansou dele.

“A ficção descansa, relaxa, mas também ensina a compreender melhor a natureza humana, até onde podem ir o espírito e o pensamento do homem. As biografias e memórias fornecem relatos de vidas que ajudam a compreender a sua própria, que geram identificação e proximidade. As lições de cada livro podem ser transpostas para a vida real. É como se você pudesse viver duas vezes através dos livros.”

Doar é compartilhar

O hábito de doar livros é antigo e motivado pela experiência que o próprio Sansão teve quando era estudante e quando se preparava para a magistratura – não fossem as obras doadas ao acervo da BPP por outros professores e alunos, não teria tido condição de concluir os estudos a contento.

Entende a doação de livros como uma forma de perpetuar o prazer da leitura e o conhecimento contido naquelas páginas.

“O leitor agradece aos doadores. Sei disso porque eu agradeci a muitos doadores. Guardaria tantos livros comigo para quê? A ideia é dividir, compartilhar toda a satisfação que um livro pode proporcionar e ajudar quem quer e precisa estudar.”

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