Há 12 anos na Vara da Infância e Juventude de Cascavel (Oeste do Paraná), o juiz Sérgio Luiz Kreus concedeu a adoção a aproximadamente 40 mulheres solteiras. No mesmo período, foram apenas quatro homens nas mesmas condições dez vezes menos. "Não existe um padrão formal de família ideal para adoção. A Justiça tem o interesse de encontrar a melhor família possível, que atenda a todas as necessidades da criança, independentemente de ser um casal ou uma pessoa solteira", enfatiza o juiz sobre o receio de muitos homens solteiros de não serem capazes de cuidar de uma criança.
Neste Dia dos Pais, a Gazeta do Povo conta a história de dois homens sozinhos, que resolveram driblar a própria insegurança e o preconceito da sociedade que ainda vê com olhos de desconfiança um homem solteiro com filhos para darem a oportunidade de três crianças viverem em família. Para eles, o Dia dos Pais tem um gostinho um pouco mais especial.
Paternidade revelada em visita a abrigo
Vontade de ser pai o jornalista Rony Veltrini, de Maringá, sempre teve. Mas, por ser solteiro, acreditava que não teria condições de criar um filho sozinho. Visão que mudou completamente em dezembro de 2000, quando foi a um abrigo acompanhar uma amiga que pretendia adotar um casal de gêmeos.
Ele estava ali apenas para apoiar a amiga a tomar tal decisão. Mas se envolveu tanto que acabou ele mesmo convicto de que, mesmo solteiro, tinha capacidade de assumir uma criança e se tornar pai. "Eu queria alguém para cuidar e ser cuidado, tomar café da manhã junto, almoçar, jantar. Queria ter todas essas coisas que parecem pequenas, mas que enriquecem muito a vida de qualquer pessoa", relata o jornalista, hoje com 42 anos, pai de Leandro, 13 anos, estudante da sétima série e faixa verde de judô.
Veltrini considera que se tornou pai de Leandro naquele mesmo dia. Encantou-se tanto pelo menino, então com 4 anos, que conseguiu uma liberação da Justiça para que a criança passasse as festas de fim de ano em sua casa. "Ele ficou dez dias comigo e já passou e a me chamar de pai. Ter de devolvê-lo ao abrigo depois dessa convivência foi mais difícil do que quando perdi meu irmão em um acidente de trânsito", enfatiza o jornalista.
Logo depois de entregar o menino ao abrigo, Veltrini deu entrada no pedido de adoção na Vara da Infância e Juventude de Maringá. Atualmente, o jornalista tem a guarda definitiva de Leandro e aguarda a adoção plena, quando poderá colocar seu sobrenome no adolescente e garantir a ele todos os direitos de filho legítimo. "Independente disso, ele é meu filho e eu sou pai dele. O Leandro é uma extensão minha e eu sou uma extensão dele", ressalta.
Sobre a nova rotina que passou a viver com Leandro em casa, o pai diz que a adaptação de um ao outro foi lenta. "No começo, tínhamos uma relação fraternal, que com o tempo foi se transformando em paternal. E isso partiu de nós dois, porque ambos estávamos dispostos a amar e sermos amados".
No dia a dia, a mudança também foi brusca. A administração da própria agenda precisou ser readaptada para atender o filho. Para isso, o apoio da família, principalmente da mãe e da irmã, foi fundamental. "Não fui apenas eu que adotei o Leandro, mas sim minha família toda", orgulha-se.
Médico aprendeu a ser pai no voluntariado
Desde os 17 anos, o médico Gilberto Rudeck da Fonseca, hoje com 52, prestava trabalhos voluntários em abrigos, levando crianças para passear aos finais de semana. Durante os passeios, o que ele mais ouvia eram pedidos das próprias crianças para que as adotasse. Virou padrinho de quatro, hoje já adultos feitos. Mas só conseguiu vencer a barreira da insegurança e realmente tentar a adoção em 2006, quando procurou a Vara da Infância e Juventude de Curitiba para se informar sobre o processo. "Em uma viagem a trabalho, fiquei me perguntando o tempo todo por que eu não poderia adotar. E não encontrei nenhum motivo que me impedisse", recorda.
Antes de tomar a decisão, a visão de Fonseca era de que uma criança só poderia conviver dentro do conceito formal de família, com pai e mãe juntos. "Fui me dando conta de que isso era preconceito, porque a família pode ser formada de várias formas."
Para tentar acelerar a adoção, o médico também deu entrada no processo em São Paulo e Santa Catarina. E foi de Florianópolis, em julho de 2007, que veio a notícia da possibilidade de adotar um casal de irmãos justamente o que ele pretendia. "Queria irmãos porque eles já teriam um laço familiar, o que eu acho que facilita a adaptação", explica.
No fim de semana seguinte, Fonseca foi aos abrigos onde viviam Cleiton e Mayara, então com 8 e 4 anos. Na outra semana, o médico foi com o menino visitar a irmã eles não se viam havia dois anos. "Quando os visitei na primeira vez, Mayara não se lembrava do Cleiton. Mas quando se viram, ele falou oi, mana e ela já abriu os braços para ele. Nós três choramos", relembra.
Desde setembro de 2007, quando as crianças vieram morar em Curitiba, ele é pai de Cleiton e Mayara, hoje com 10 e 6 anos. "Eles chegaram na semana do aniversário do Cleiton. Foram recebidos com festa", lembra.
Com a chegada das crianças, o médico montou uma nova rotina. As manhãs são dedicadas exclusivamente aos filhos. É nesse período que Fonseca os leva à natação, balé, aulas de reforço e, quando necessário, ao médico e ao dentista. No dia a dia corrido, ele conta ainda com a ajuda de uma empregada e uma babá. "O engraçado nessa rotina é que normalmente eu me relaciono com as mães na escola. No começo elas não ficam muito à vontade comigo na hora de marcar um horário para trazer os filhos delas para brincarem com os meus. Mas com o tempo elas se acostumam com a ideia."




