Passadas mais de três semanas, os moradores do bairro Guarituba, em Piraquara, ainda sofrem os efeitos do temporal de granizo que danificou cerca de 6 mil casas no dia 28 de março. "Estou dormindo no banheiro pois o resto da casa está com buracos enormes no telhado", relata o mecânico Garcia Alves dos Santos, morador da Vila Nova. "Qualquer chuvinha que dá já molha tudo de novo", reclama a dona de casa Maria de Freitas.
O município da região metropolitana de Curitiba chegou a decretar estado de emergência na ocasião, mas a prefeitura local alega não ter mais recursos disponíveis para ajudar a todas as famílias prejudicadas pela chuva.
"Não estávamos preparados para isso e fomos até onde deu para ir. Agora buscamos formas de administrar o problema", afirma o prefeito Gabriel Samaha, cuja cidade tem 75% de seu território preservado por leis ambientais e a menor arrecadação anual da redondeza - R$ 38 milhões. Das 6 mil famílias atingidas, apenas metade recebeu doações da prefeitura. "Oferecemos 25 mil telhas e mil cestas básicas. A Defesa Civil Estadual ajudou com mais 5 mil telhas. Não foi suficiente, sabemos, mas não temos mais recursos disponíveis", diz.
Segundo Samaha, o estado de emergência não permite um grande apoio do governo estadual ou federal. "Por não estarmos em estado de calamidade pública, o acesso aos recursos está difícil", explica. "Assistentes sociais estão atendendo as famílias, analisando caso a caso e buscando formas de minimizar o problema", diz.
Dificuldades
A realidade estrutural e financeira das famílias que moram no Guarituba, do qual faz parte a Vila Nova, dificulta a rápida reorganização. Dos 100 mil habitantes de Piraquara, 46 mil vivem neste bairro, formado em sua quase totalidade por habitações irregulares. A maioria dos moradores sobrevive com trabalhos autônomos, como o recolhimento de papel e lixo reciclável.
No bairro, a iluminação não chega às casas, que funcionam na base dos famosos "rabichos" ligações clandestinas. Não há sistema de esgoto e a estrutura de tratamento de água ainda é ineficiente. "Tem um monte de valeta. Por causa da chuva e da água parada, peguei leptospirose", conta a dona de casa Silvana Marinho.
O prefeito reconhece a difícil realidade do Guarituba e justifica a falta de maiores investimentos pela questão ambiental. Por causa das áreas de conservação, Piraquara está impedida de abrir espaço para a industrialização, que nos últimos anos foi a principal responsável pelo desenvolvimento de cidades vizinhas como São José dos Pinhais, que abriga grandes montadoras de veículos e tem um dos maiores produtos internos brutos (PIBs) do estado.
De acordo com Samaha, apenas 8% da arrecadação municipal é voltada para investimentos com liberdade de movimentação o que representa cerca de R$ 250 mil ao mês. "Nosso ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) Ecológico já não dá mais respostas à cidade. Junto com o Fundo de Participação dos Municípios, o valor não ultrapassa R$ 1,6 milhão", contabiliza Samaha.
Ainda assim, a população faz um apelo à administração. "Pedimos que olhem por nós, pois todo mundo aqui é pobre e não tem condições de comprar as telhas. Tem muita gente sofrendo demais com isso", pede o armador Lourival Silva. Segundo ele, que fez novo levantamento entre os moradores, são necessárias 1.559 telhas e 36 cestas básicas para suprir as necessidades imediatas do bairro.
A situação do bairro alimenta discussões e tentativas de melhorias por parte do município. No entanto, soluções realmente práticas ainda esperam a concretização. O projeto denominado "Novo Guarituba", em parceria com o governo do estado, pretende investir na região R$ 52 milhões nos próximos quatro anos. "A licitação para o canal de drenagem da água já está em edital. Serão R$ 4 milhões destinados ao combate às enchentes", enfatiza Samaha.
O cadastro para relocação das famílias em situação irregular também já está sendo feito. "A idéia é construir conjuntos habitacionais", reforça o prefeito. De acordo com ele, o Guarituba é tido como uma das maiores ocupações irregulares do Paraná e o crescimento populacional na região é de 8,6% ao ano. "Ao lado de Fazenda Rio Grande, é o maior índice de crescimento da região metropolitana de Curitiba", afirma.



