
Em fevereiro, a dona de casa Jacira dos Santos perdeu o marido, vítima de atropelamento. Moradora do bairro Tatuquara, na periferia de Curitiba ela bateu na porta da paróquia onde mora, no Jardim da Ordem, na esperança de conseguir um local para o velório. O lugar já estava ocupado e ela não teve alternativa, a não ser fazer o velório em casa. "A gente é obrigado a velar o corpo na própria casa e depois ficar lembrando daquele momento ruim", diz.
O bairro não possui local apropriado para velar os corpos, como uma casa mortuária. As igrejas da região só aceitam velar os fiéis, e o único espaço que servia para velórios foi desativado há dois anos. "Era um barracão que nós, da associação de moradores, construímos, há cinco anos. Mas a prefeitura desativou, dizendo que o local era inapropriado. Desde então, quando morre alguém , a gente tem de se virar", conta o líder comunitário Reinaldo França.
Quem não está disposto a passar pela mesmo desconforto tem de contratar os serviços de uma capela mortuária de algum cemitério. Foi o que fez a produtora de eventos Denise Semmer. Quando o marido faleceu, ela não quis velá-lo em casa e contratou os serviços do cemitério do Boqueirão. "Embora tenha ficado caro, eu optei pelo serviço terceirizado. Minha avó, quando perdeu minha tia, fez o velório em casa, por falta de opção. Depois, ela nem conseguia ficar lá dentro e teve de vender o imóvel", afirma. Outro problema enfrentado por Denise foi na hora de receber os amigos para o último adeus. "Como o cemitério é muito longe e muita gente não tem carro, vários amigos não puderam se despedir."
Outros bairros
De acordo com o secretário da Federação Comunitária das Associações de Moradores de Curitiba e Região Metropolitana (Femoclam), João Pereira, "cada vez que morre alguém em qualquer bairro pobre da cidade, é uma novela pra conseguir velar". Em alguns casos, é preciso emprestar a sede de alguma associação para o velório. "Nem é correto fazer isso, do ponto de vista da saúde, mas não tem jeito. É uma humilhação o que a gente vive".
A presidente da Associações de Moradores da Vila Rose II, na CIC, Marlene Cardoso, diz que "quase todo dia tem coroa de flores na porta de alguma casa". De acordo com ela, a prefeitura alega que não há espaço para a construção de um local adequado. A presidente do Clube de Mães da Vila Pantanal, no Boqueirão, Deise Siqueira, conta que quando seu marido, o líder comunitário Dirceu do Pantanal, foi assassinado, em abril, ela precisou recorrer à igreja presbiteriana do local. Segundo Deise, a falta de regularização da área impede a criação de muitos serviços. A situação se repete no Uberaba. "Nem adianta reclamar muito, pois, enquanto não regularizarem os terrenos, não dá pra construir uma capela", conta Carla Cirene de Matos, presidente do Clube de Mães local.




