
Eles eram crianças há duas décadas e acompanharam os pais quando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) promoveu uma série de ocupações no Paraná. O tempo passou, os "sem-terrinha" cresceram e agora pretendem seguir os mesmos passos dos pais.
Desde o dia 1.º de maio, eles formaram um novo acampamento em Rio Bonito do Iguaçu, na região Centro-Oeste, e estão dispostos a ocupar uma nova área. Já são 1,5 mil famílias e o movimento pretende chegar a 3 mil antes de definir onde e como será ocupação.
Diferentemente do que aconteceu há 18 anos, quando o acampamento foi formado às margens da rodovia antes da invasão às terras pertencentes à empresa Araupel, desta vez a mobilização é feita dentro do assentamento Ireno Alves, em um espaço cedido por um agricultor assentado.
Apesar de o grupo estar acampado praticamente na divisa das terras da Araupel, o MST nega que tenha discutido ocupar áreas da empresa. Na semana passada o prefeito de Rio Bonito do Iguaçu, Írio Rosso (PMDB), visitou o acampamento e prometeu dar o "apoio que for necessário, dentro das possibilidades" aos acampados. A prefeitura de Rio Bonito chegou a anunciar em seu site que os sem-terra pretendem ocupar 31 mil hectares da fazenda da Araupel.
Na quinta-feira, a Gazeta do Povo esteve no acampamento, onde a equipe foi recebida por duas jovens, Mônica Macedo e Ana Paula dos Santos, ambas de 18 anos, destacadas previamente pela diretoria estadual do MST para falar em nome do movimento. Um rapaz que se identificou como Joílson acompanhou a entrevista ao lado de outra líder do movimento. O MST não permitiu imagens fechadas dos barracos, nem entrevistas com as famílias.
Mônica e Ana Paula negaram que haja definição pelas terras da Araupel. "Não foi discutido, enquanto movimento sem terra, a área que a gente vai ocupar", diz Mônica. Segundo ela, o momento é de organização e a ocupação pode ocorrer em qualquer lugar da região.
O acampamento é vigiado por todos os lados por integrantes do movimento responsáveis em fazer a segurança no local. Logo na entrada foi montada uma guarita para identificação de quem chega e, a partir dali, o acesso para estranhos é permitido apenas a pé.
A ocupação de um novo espaço no Paraná faz parte das chamadas "grandes ocupações" programadas pelo MST e foi decidida no 6.º Congresso Nacional do movimento, realizado em fevereiro. "Para isso é necessário massificar e organizar grandes acampamentos", diz Mônica.
Critério
Diariamente novas famílias da região central do Paraná chegam ao acampamento. Para ser selecionado é necessário apresentar certidões comprovando que não possui antecedentes criminais. Sem dar detalhes, Ana Paula diz que essa exigência é para evitar "erros históricos" de seleção. Ana Paula é uma das "sem-terrinha" que passou a vida em acampamentos, participou de várias ocupações, foi despejada várias vezes, e agora busca um espaço só para ela. "Eu não tenho condições de continuar vivendo no lote do meu pai e quero continuar no campo". Segundo ela, os lotes da reforma agrária possuem cinco ou seis alqueires, insuficientes para o sustento de três famílias.
"Invasão seria o caos para Quedas do Iguaçu", diz líder classista
A possível ocupação de uma área de reflorestamento da Araupel, em Rio Bonito do Iguaçu, preocupa Quedas do Iguaçu, cidade vizinha. É que a empresa está instalada na cidade, onde gera 1.050 empregos diretos e praticamente o mesmo número de indiretos. Anualmente, a Araupel injeta na economia local R$ 50 milhões com pagamentos de salários e fornecedores.
"Se houver uma invasão e inviabilizar a empresa, será o caos. Vai afetar 50% da economia da cidade", diz Reni Fernande Felipe, presidente da Associação Comercial e Industrial de Quedas do Iguaçu (Aciqi). Ele defende que os órgãos ligados à reforma agrária busquem alternativas para melhorar a qualidade de vida dos moradores de assentamentos e evitar novas ocupações.
Na última terça-feira, o senador Alvaro Dias (PSDB) disse, no Senado, que recebeu do prefeito Edson Prado, de Quedas do Iguaçu, indícios de que o MST pretende invadir áreas da Araupel. "A Araupel já contribuiu de forma expressiva com a reforma agrária formando o maior assentamento da América Latina", disse o senador, citando os mais de 50 mil hectares desapropriados para a criação dos assentamentos em Rio Bonito do Iguaçu.



