
Uma audiência pública em Adrianópolis marcou ontem o início do projeto Ministério Público Social no lado paranaense do Vale do Ribeira. Cerca de 250 moradores de Adrianópolis, Tunas do Paraná e Bocaiúva se reuniram para fazer reivindicações. Na pauta entraram temas como falta de transporte, acesso à comunicação, contaminação do solo e da água pelo chumbo e comunidades quilombolas. Muitos municípios do estado com baixo índice de desenvolvimento humano (IDH) não conseguem cumprir as exigências mínimas para pleitear verbas estaduais e federais e ficam fora de programas sociais. O Ministério Público do Paraná promete ajudar os prefeitos a "pôr a casa em ordem".
Faltaram bancos e cadeiras para acomodar os interessados. Até alunos de uma escola próxima foram ter aula na audiência. O Conselho Tutelar reivindicou mais estrutura para atender crianças em situação de risco e os produtores rurais protestaram contra a falta de estradas para transportar sua produção. Muitos têm que recorrer ao carrinho de mão ou ao lombo do jegue.
Mas o tema que dominou a audiência foi a questão ambiental. Os moradores reclamam dos prejuízos deixados pela empresa Plumbum, mineradora que contaminou o solo da região com chumbo. O resultado é uma água com gosto de gasolina e pastos, vacas, leite e derivados contaminados. O professor da Universidade Federal do Paraná Guilherme Albuquerque desenvolve um trabalho de extensão com as comunidades e diz que, além dos problemas de saúde, a população se sente estigmatizada. A falta de saneamento é um dos problemas que precisam ser resolvidos. A aposentada Aparecida Batista dos Santos, de 63 anos, conta que quase ninguém na cidade toma água da torneira. "Tem gente que prefere pegar água direto do Rio Ribeira, mas a maioria tem de comprar água mineral para beber", conta. "Outro grave problema é a falta de perspectiva para o jovem. Quando termina o ensino médio não há mais opções."
O procurador-geral de Justiça, Olympio de Sá Sotto Maior, afirma que o Ministério Público faz uma opção preferencial em favor dos que mais precisam de políticas públicas. "Ouvimos as reivindicações da população e vamos conversar com os prefeitos eleitos", afirma. "Mas, se for preciso, vamos cobrar judicialmente a responsabilidade dos municípios e dos governos estadual e federal." A iniciativa é inédita. O procurador diz acreditar que muitas vezes a comunidade tem medo da Justiça justamente porque ela é falha. "O MP será uma espaço de luta para implantar os direitos sociais garantidos na Constituição Federal", promete.
Os remanescentes quilombolas do Vale do Ribeira também participaram em peso da reunião. Muitos locais ficam mais próximos do estado de São Paulo do que da área urbana de Adrianópolis. A falta de estradas e a distância resultam em um tempo médio de 5 horas e meia até o perímetro urbano. Qualquer pendência na cidade se torna um problema para os quilombolas. Nilton Morata dos Santos, da comunidade Córrego do Frango, saiu às 4 horas da madrugada para chegar na audiência às 10 horas.
O médico visita o local apenas a cada duas semanas e atende 30 pessoas em duas horas. Quando há uma emergência, ou eles chamam a ambulância de Barra do Turvo (SP), ou pagam um táxi. "Só que, quando não encontramos nenhum dos dois, o jeito é ir a pé e tentar pegar carona", diz o quilombola. Não há estradas que ligam o Córrego do Frango a Adrianópolis. Para chegar lá de carro é necessário fazer um desvio pelo lado paulista.



