
Andorinha, sabiá, tatu, porca e gambá. Pode parecer o elenco de um zoológico, mas esses são os nomes de algumas coreografias as chamadas marcas do fandango. Dança típica do Litoral do Paraná, o fandango chegou à região com os colonos açorianos nos primeiros séculos após o descobrimento do Brasil e recebeu características próprias da população caiçara.
Para dar os primeiros passos desta dança, nada melhor do que ir a um baile legítimo na companhia dos membros do Pés de Ouro, um dos grupos mais ativos do Litoral. Quando não estão se apresentando fora de Paranaguá, eles que são originais da Ilha de Valadares tocam e dançam em bailes no Laiza 2, estabelecimento que fica no centro histórico da cidade.
Antes de engatar uma conversa com o par, vão algumas informações básicas. São duas as formas de dançar o fandango: a batida, em que as marcas são executadas, e o bailado, ou valsado. "O bailado é simples, com passos que o casal faz como numa valsa tradicional, seguindo o ritmo da música e girando pelo salão", explica o mestre fandangueiro Nemésio Costa, líder do Pés no Chão e guardião da tradição e do código de conduta do fandango. Ele recomenda, para começo de conversa, que a contradança seja embalada por uma dose de mãe-com-a-filha (meia parte de pinga para meia parte de melado de cana) ou de cataia, pinga curtida com a planta de mesmo nome.
"Os homens dançam com tamancos de madeira, fazendo passos fortes como num sapateado", conta. Enquanto isso, as mulheres acompanham a roda, fazendo, vez ou outra, alguns passos com os homens, numa espécie de quadrilha. "A batida é uma dança mais dos homens, que batem os tamancos, usados só por eles, de acordo com a música", explica Costa.
No fandango também há um código de conduta. De acordo com o mestre fandangueiro, a tradição diz que a mulher não pode recusar uma dança. "A mulher que faz uma desfeita dessas nos bailes não pode dançar com mais ninguém. Antigamente, o sujeito ia falar com o pai da moça e dava até briga", conta ele. As mulheres, por sua vez, não devem tirar os homens para dançar. Só resta esperar. Outra norma seguida pelos fandangueiros é que, depois da batida, a mulher espere que o homem que estava atrás dela na roda a tire paradançar o bailado. "Não pode dançar o bailado com outro antes de dançar com o parceiro da batida", ensina.
O fandango clássico é dançado em ambientes fechados e, de preferência, com chão de madeira, para que as batidas dos tamancos ressoem pelo salão. No Laiza 2, onde o Pés de Ouro se apresenta regularmente, um tablado de madeira é montado às pressas a cada baile, já que o salão é revestido com outro tipo de piso. O barulho do sapateado no tablado abafa quase que completamente a música do grupo, que é tocada com duas violas, uma rabeca e um adufo espécie de pandeiro. "Nós demos uma incrementada no fandango original, acrescentando a tabaca, o afoxé e o triângulo, que deixam a música ainda mais animada", conta o mestre.
Apesar dos versos simples, não é tão fácil compreender a letra, uma vez que os versos são cantados de forma rápida, sem contar o som instrumentos que se sobrepõem à voz. "As letras falam de natureza, sol, mar, as nuvens. E também de amor, das moças bonitas", diz o mestre, enquanto recita algumas delas como exemplo.
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Sereno da madrugada / Caiu na folha da rama/ Ô lá-lá-lalá-ri-lai-lá/ Caiu na folha da rama/ (Andorinha)
Primeiro peço licença,/ Se não houver diferença/ Sentado nesse lugar/ Canto noite, canto dia/ Porém com toda alegria/ Ai, meu amorzinho,/ Sem nenhum diferenciar/ (Anu)
Trecho de canção do fandango





