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Legislação

Abolição do voto secreto no Congresso está fora da agenda

Votação sigilosa, que ajudou a livrar Jaqueline Roriz da cassação, está prevista na Constituição. Para especialistas, só a pressão da sociedade pode levar à mudança na lei

Jaqueline Roriz: inocentada sabe-se lá por quem. | Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr
Jaqueline Roriz: inocentada sabe-se lá por quem. (Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr)

Curitiba e São Paulo - A abolição do voto secreto no Congresso – prática que ajudou a livrar a deputada federal Jaqueline Roriz (PMN-DF) da cassação, na última quarta-feira – terá de trilhar um caminho ainda mais difícil do que o da Lei da Ficha Limpa se quiser virar realidade. O fim desse tipo de voto voltou a ser discutido após Jaqueline ter se livrado da cassação. Mas, como a votação secreta para perda de mandatos é determinada pelo artigo 55 da Constituição, a prática só seria mudado por uma emenda constitucional – que é mais difícil de ser aprovada do que um projeto de lei, como o da Ficha Limpa.

A deputada foi absolvida pelo plenário da Câmara mesmo após ter sido flagrada em vídeo recebendo, em 2006, R$ 50 mil em dinheiro do delator do esquema do mensalão do governo do Distrito Federal, Durval Barbosa, para caixa 2 de sua campanha eleitoral.

Ceticismo

Especialistas consultados pela reportagem se mostraram céticos quanto a um interesse do Congresso por iniciar o debate sobre o fim do voto secreto para a perda de mandato. Para eles, a iniciativa terá de vir da sociedade. "Qual a liderança partidária era favorável à aprovação da Lei da Ficha Limpa? Nenhuma. Com o voto secreto eu vejo o mesmo quadro", diz Affonso Ghizzo Neto, coordenador da campanha "O que você tem a ver com a corrupção?". "A Ficha Limpa só foi aprovada porque mais de 2 milhões de pessoas se mobilizaram e pressionaram."

Juiz e um dos coordenadores do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Marlon Jacinto Reis também acredita que somente uma mobilização ampla da sociedade será capaz de trazer mudanças para moralizar a atividade política. Para ele, o voto secreto, legítimo no passado, hoje está se traduzindo num "instrumento de impunidade". "O voto secreto surgiu historicamente no parlamento como forma de assegurar a independência aos parlamentares. Mas não é para isso que está sendo usado", diz ele. "O voto secreto é algo a ser abolido rapidamente por não ter tido utilidade senão para os poucos que o estão convertendo num instrumento de impunidade."

O professor de Ciência Política Luiz Domingos Costa, do grupo Uninter de Curitiba, argumenta que o voto secreto para a cassação de mandatos vem sendo usado como um instrumento de autoproteção dos políticos. "Ele foi pensado para esse fim. Há um fechamento da política dentro dela."

A doutora em Ciência Política Maria da Graça Campagnolo, professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), diz ainda que a votação secreta para decidir sobre a cassação de mandato de parlamentares pode ser inconstitucional, embora esteja na Constituição. Ela diz acreditar que princípios constitucionais são feridos pelo próprio artigo constitucional. "Eles [os parlamentares] são nossos representantes e a gente tem que saber o que eles estão votando." Por isso, Maria da Graça acredita que é possível mover uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar o voto secreto nesses casos.

Já o sociólogo Eurico Antônio Gonzalez, professor da Universi­­dade de Brasília (UnB), pede cautela no debate sobre a extinção do voto secreto em todos os tipos de votações, apesar de endossar as análises de que a absolvição de Jaqueline somente foi possível por causa da votação anônima. Para ele, o fim do instrumento parlamentar é mais um passo rumo ao enfraquecimento das instituições políticas. "Se acabar com o voto secreto, quase não se precisará mais do plenário porque será a opinião pública quem vai legislar. Temos que fazer essa reflexão."

Interatividade

Em quais situações os parlamentares deveriam ter o direito ao voto secreto nas deliberações do Congresso?

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