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Surpreendidos pela repercussão negativa nas ruas, na Igreja e nos movimentos sociais, deputados e senadores tentaram evitar o desgaste de votar, em plenário, novo percentual de reajuste para seus subsídios nesta legislatura. Envergonhados e pedindo desculpas à sociedade, e sem uma proposta de consenso que pudesse melhorar a imagem do Congresso Nacional, líderes e o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), desistiram, na noite desta quarta-feira, depois de muito bate-boca, da decisão de elevar os subsídios para o teto de R$ 24.500 - vetado na véspera pelo Supremo Tribunal Federal - ou mesmo aprovar um reposição inflacionária, que elevaria os atuais R$ 12.720 para R$ 16.475.

Um requerimento do líder do PTB, José Múcio Monteiro (PE), representando seis partidos contrários ao aumento, pediu a retirada da matéria da pauta, congelando os subsídios até a próxima legislatura. Às 22h30m, os deputados decidiram em plenário que toda a discussão sobre o reajuste ficará para o ano que vem.

À tarde, sem conseguir consenso entre os líderes, Aldo anunciou a decisão de votar primeiro o fim da verba indenizatória de R$ 15mil e do 14º e 15º salários e, em seguida, a proposta de reajuste com base na inflação. Foi uma condição imposta pelo líder do PDT, Miro Teixeira (RJ). Mas líderes de vários partidos entenderam que poderia ser mais uma armadilha, que garantiria o fim de verbas, mas abriria espaço para a aprovação dos R$ 24,5 mil.

Segundo participantes do encontro, a reunião foi tensa, por isso Aldo teria decidido levar todas as propostas ao plenário.

- A decisão reflete a análise ideal sobre um momento de crise. Você não pode lamentar a crise. Tem que olhar e ver como é possível avançar. A forma como a imprensa colocou (a questão) e o Supemo decidiu, foi importante porque permitiu uma discussão do Legislativo - disse Miro Teixeira (RJ), líder do PDT na Câmara.

Para o líder do PFL na Casa, Rodrigo Maia (RJ), um aumento salarial junto com a manutenção da verba indenizatória não faz sentido:

- Em 2001, todos nós fazíamos o nosso trabalho parlamentar só com o subsídio (salário). Aí, o então presidente da Câmara (Aécio Neves), para não ter o desgaste de aumentar o salário, criou a verba indenizatória. Hoje não tem sentido discutir um aumento com a manutenção da verba - disse, para em seguida concluir:

- Quando a sociedade se manifesta, temos que ouvir.

O deputado Paulo Delgado (PT-MG), que não se reelegeu, confirmou a falta de consenso da reunião e também se posicionou contrariamente ao aumento junto com a verba indenizatória:

- As máfias não se entendem. Como pode dobrar o salário e manter a verba indenizatória? Isso é entesouramento privado com dinheiro público.

No encontro, o PSOL, que já havia se manifestado nesse sentido, defendeu que não houvesse aumento algum, o que teria causado uma grande reação entre os demais participantes.

Antes mesmo da reunião, Aldo Rebelo já admitia, após a missa do final do ano legislativo, que o mais provável seria a aprovação da proposta que reajusta o salário dos parlamentares de acordo com a inflação dos últimos quatro anos. O aumento de 90,7% (R$ 24,6 mil), aprovado na semana passada e derrubado nesta terça-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF) , é "improvável", segundo Aldo.

Aldo chegou a reconhecer o erro de ter aprovado a quase duplicação dos vencimentos dos deputados e senadores sem que a decisão fosse corroborada pelo voto do plenário da Câmara e do Senado.

- Não vejo problema nenhum em reconhecer erros. O problema é quando se erra e se persiste no erro. Se a Mesa da Câmara e do Senado apresentaram uma proposta e ela tem que ser corrigida, não vejo problema em que haja essa correção. Eu vejo problema quando as pessoas não aprendem com seus erros, principalmente quem tem a incumbência de representar o povo.

Já o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), defendeu que a decisão sobre o aumento salarial dos parlamentares seja tomada o mais rapidamente possível, mas deixou claro que a iniciativa de decidir o valor é da Câmara.

- Todo mundo acha que devemos virar a página. A iniciativa é da Câmara, mas o desejo é de resolver isso logo - disse o presidente do Senado.

Desde terça à noite, Renan já havia descartado a participação na reunião convocada por Aldo Rebelo, para decisão conjunta do valor a ser votado. Ao saber da decisão de Renan de não participar da reunião, Aldo chegou a pensar em suspender o encontro e deixar a decisão para o plenário.

Renan defendeu a fixação do teto do funcionalismo e descartou que esteja em curso um movimento de retaliação ao Supremo Tribunal Federal (STF), boicotando a votação do aumento de R$ 24,5 mil para R$ 25,7 mil dos salários dos ministros, que aguarda inclusão na pauta do Senado:

- Não há clima de retaliação. O Brasil cobra que tenhamos bom senso, equilíbrio. Fizemos a opção pela democracia representativa. Se tiver erros, distorção, vamos corrigir, mas não pode agredir, afetar a instituição, porque isso afeta a democracia.

Arcebispo critica aumento durante missa na Câmara

Durante a missa realizada no final da manhã desta quarta, no Salão Negro da Câmara, para celebrar o final do ano legislativo, o arcebispo de Brasília, Dom João Brás de Avis, criticou, em plena homilia, o Congresso pelo aumento salarial de 90,7%. O arcebispo, que também condenou o alto salário recebido pelos membros do Judiciário, disse que isso desgasta a imagem do Parlamento:

- Como aceitar que um parlamentar ganhe R$ 800 por dia, quando boa parte das pessoas que representam é obrigada a viver com R$ 12 (por dia)? Como aceitar que o Judiciário legisle em alguns casos em seu favor, sem demonstrar sensibilidade para com o povo para o qual as leis são feitas? Atitudes como as que temos visto nestes dias matam o espírito de Natal.

Ao comentar a crítica feita por Dom João Brás de Avis, o presidente da Câmara disse que aqueles que têm "sentimento de justiça" não podem discordar das palavras do arcebispo.

- A palavra do arcebispo deve ser recebida com respeito, principalmente por quem tem sentimento de justiça. Elas devem servir de reflexão para todo mundo. As palavras refletem o sentimento de justiça da igreja e aqueles que têm sentimento de justiça não podem discordar do que ele disse - afirmou Aldo, que sentou na primeira fileira, mas não comungou.

O deputado Inocêncio Oliveira (PL-PE) disse que a declaração do arcebispo, feita durante a homilia, foi uma orientação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Ele também disse que isso servirá para reflexão, mas ressaltou que a crítica não foi feita em tom agressivo e que Dom João estava apenas cumprindo o seu papel.

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