
Brasília - Após sete meses de discussões que geraram mais desconfianças que consensos, a Câmara dos Deputados será palco hoje de um ato em defesa da reforma política. A estrela do evento deveria ser o ex-presidente Lula, que declinou do convite ontem. Pelo menos três governadores prometem comparecer ao ato: Sérgio Cabral (PMDB-RJ), Tarso Genro (PT-RS) e Eduardo Campos (PSB-PE). A mobilização também vai reunir entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a União Nacional dos Estudantes (UNE).
A intenção do evento é dar um voto de confiança ao trabalho da comissão especial que trata o tema na Câmara. O relatório final do deputado federal Henrique Fontana (PT-RS) sobre a reforma será apreciado amanhã pelo órgão, em formato de projeto de lei. Na tentativa de diminuir as resistências das lideranças partidárias a mudanças, o petista construiu um texto "híbrido", que mistura conceitos nas duas questões mais sensíveis em debate financiamento de campanha e sistema de voto.
"O pior dos mundos é o Brasil sair desse processo com as mesmas regras que temos hoje", sinalizou Fontana na semana passada. Apesar de o PT defender historicamente o financiamento público exclusivo, o deputado sugere a criação de um fundo específico para bancar as campanhas com recursos do orçamento da União, de empresas públicas e privadas e de pessoas físicas. A proposta veda, no entanto, qualquer doação direta a partidos e candidatos.
O relatório também propõe a criação de um sistema proporcional misto nas eleições para vereador, deputado estadual e federal. Segundo ele, o eleitor votaria duas vezes. Na primeira, escolheria um partido e, na segunda, um candidato.
Metade das vagas obtidas pela legenda seria preenchida por candidatos de uma lista partidária preordenada e os outros 50% pela ordem de votação nominal dos candidatos. Não há vinculação entre as escolhas. Quem decidir votar no PSDB como partido, por exemplo, poderá dar o segundo voto a um candidato do PT.
As duas sugestões não são consenso entre os partidos nem entre as entidades convidadas para os atos de hoje. "Estamos fechados a favor das listas fechadas e do financiamento público exclusivo, sem participação privada", diz Carlos Moura, da Comissão Brasileira de Justiça e Paz, organismo de discussão política vinculado à CNBB. Já o presidente do PMDB, senador Valdir Raupp, declarou que a sigla vai votar contra qualquer formato de lista fechada.
Para o deputado paranaense Sandro Alex (PPS), que integra a comissão na Câmara, a reforma começa a ganhar corpo mesmo com as divergências. "Quanto maior a participação da sociedade, mais chance de as mudanças saírem. No começo do ano, ninguém sabia do que estávamos tratando, agora há um interesse bem mais nítido", diz ele.
A expectativa é que a proposta seja aprovada sem sobressaltos na comissão, mas que enfrente bem mais dificuldades quando chegar ao plenário. Outra barreira será a tramitação no Senado, que está mais adiantado na discussão do tema. Por último, está em debate a sugestão do PSD de realizar uma Constituinte exclusiva para votar as reformas previdenciária, tributária e política.
O cientista político Joviniano Neto, da Universidade Federal da Bahia, avalia que nenhuma das propostas têm grandes chances de prosperar. "O que for contra a cultura do povo e contra o interesse dos políticos não passa." Segundo ele, o Congresso tem desperdiçado a chance de fazer uma reforma política "de fato" debatendo apenas temas eleitorais.
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